Acórdão nº 2376/18.4T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1- Relatório S. E. instaurou acção, na forma de processo comum, contra X Insurance PLC, pedindo que:

  1. Se condenasse a R. a pagar-lhe a quantia de 200.000,00 € (duzentos mil euros) correspondente aos danos patrimoniais sofridos; b) Se condenasse a R. a pagar-lhe a quantia de 75.000,00 € (setenta e cinco mil euros) correspondente aos danos não patrimoniais sofridos; c) Se condenasse a R. a pagar-lhe a quantia que viesse a provar-se ter sido por ela despendida, desde a instauração da ação até à data da sentença, relacionada com os seus tratamentos; d) Se condenasse a R. a pagar-lhe uma quantia mensal, após trânsito em julgado da sentença, por causa da situação clínica da A., designadamente em despesas médicas, medicamentos, tratamentos, internamentos, intervenções cirúrgicas, técnicas e terapêuticas, deslocações e estadias, de acordo com a evolução da medicina e dos conhecimentos técnicos e científicos, seja em Portugal ou no estrangeiro, e que não tenha sido considerado nas alíneas anteriores; e) Se condenasse a R. a pagar-lhe indemnização correspondente a eventuais agravamentos de IPP futuros, desde que requeridos e comprovados expressamente pela A., no prazo máximo de 25 anos, após trânsito em julgado da decisão dos presentes autos; f) Se condenasse a R. a pagar-lhe juros, à taxa legal, contados da citação relativamente à quantia peticionada em a) e contados do trânsito em julgado da sentença relativamente às quantias peticionadas na alínea b).

    Como fundamento alegou, em suma, que quando iniciava a travessia da via pública, foi atropelada por um veículo automóvel, seguro na R., que a foi colherna faixa de rodagem destinada à circulação dos veículos que circulavam em sentido contrário àquele em que tal veículo seguia.

    Em consequência do sinistro, sofreu diversos danos, de natureza patrimonial e não patrimonial.

    *Contestou a R., impugnando a factualidade invocada pela A. e alegando que, o sinistro ocorreu por culpa da A., porque não atravessou na passadeira de peões situada a menos de 50 metros e porque apareceu na faixa de rodagem de forma imprevisível e inesperada, impossibilitando assim que o condutor do veículo segurado pudesse evitar o embate.

    *Foi proferido despacho saneador, onde, designadamente, se identificou o objeto do litígio e se enunciou os temas da prova, e, posteriormente, realizou-se a perícia médico-legal, e após, a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência: - Condenou a R., a pagar à A., a quantia de € 94.150,00 (noventa e quatro mil cento e cinquenta euros); - Condenou também a R., a pagar à A., juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento - no que diz respeito à quantia de € 38.500,00 (trinta e oito mil e quinhentos euros) - contados desde a citação da R., relativamente aos montantes de € 700,00 (setecentos euros) mensais que a A. deixou de auferir até ter ocorrido a citação da R. em Dezembro de 2018, e contados desde cada um dos meses seguintes, sobre a quantia de € 700,00 (setecentos euros) mensais, até Maio de 2021; - Condenou ainda a R., a pagar à A., juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação da R. até integral pagamento, sobre a quantia de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros).

    - Condenou também a R., a pagar à A., juros de mora, contados desde a data da presente decisão até integral pagamento, sobre a quantia de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros).

    - Condenou a R. a pagar à A., a quantia ilíquida correspondente às despesas que a A. tenha com medicamentos (medicação analgésica e anti-inflamatória) e com tratamentos de fisioterapia 15/20 (quinze/vinte) sessões, duas vezes por ano (incluindo hidroterapia e pressoterapia) e as inerentes deslocações; e - Absolveu a R. do demais peticionado.

    *II - Objecto do recurso A Ré não se conformando com o teor dessa decisão veio recorrer, concluindo nos seguintes termos: 1ª) – Devidamente sopesada e valorada a prova produzida nos autos, devem ser modificadas as respostas à factualidade vertida nos nºs 7, 8, 77, 78 e 82 dos factos provados, por forma a: a) – considerar-se provado que: - a A., parecendo-lhe que tal veículo circulava depressa, com receio do mesmo, não continuou a travessia da via e parou sensivelmente a meio da faixa de rodagem contrária ao sentido de marcha do TA; - quando se encontrava parada, em frente à Loja da Y, virada para poente, dentro da faixa da esquerda (atento o sentido de marcha do veículo), em zona próxima do meio de tal faixa, a fim de deixar passar o veículo, o condutor deste, já perto de se cruzar com a A., accionou os meios de travagem, o que provocou o bloqueio das rodas do BA e, consequentemente, perdeu o controlo do mesmo, que se dirigiu para a esquerda e invadiu a faixa de rodagem da esquerda, e, em contramão, foi na direção da A., atingindo-a, nessa faixa de rodagem da esquerda; - a A. não realizou, até fins de Maio de 2021, turnos na VMER, como antes do acidente fazia, por ter dificuldade em ajoelhar-se junto a vítimas para prestar suporte avançado de vida, de se movimentar com a destreza necessária, por ter dificuldade em correr e em conduzir; e - foi atestado a 03/04/2018 por parte do médico do trabalho, M. R., que “Pela sequela apresentada por acidente 10.10.2016, não está apta exercer funções na VMER Urgência”.

  2. – ser eliminada a factualidade vertida no número 82 dos factos provados.

    1. ) – Modificando-se o julgamento da matéria de facto e introduzindo-se as alterações supra pugnadas, mais evidente é a culpa da A. na produção do sinistro au-tomóvel que a vitimou.

    2. ) – Independentemente porém, de tal modificação, é inquestionável que a A. violou com a sua conduta, ao realizar a travessia da via pública, várias normas de segurança estradais.

    3. ) – Com efeito, a A./Recorrida efectuou a travessia da faixa de rodagem em local que distava menos de 50 metros de duas passadeiras, situadas de cada um dos lados do local do embate, ou seja, em local onde estava proibida de realizar o atravessamento do eixo rodoviário.

    4. ) – Além disso, resulta com evidência da factualidade provada que a A. transitou pela faixa de rodagem sem usar da prudência devida e sem prejudicar o trânsito de veículos; iniciou a travessia da via sem se ter previamente certificado de que, tendo em conta a distância que a separava dos veículos que nela transitavam e a respectiva velocidade, o podia fazer sem perigo de acidente; e não efectuou o atravessamento da faixa de rodagem o mais rapidamente possível.

    5. ) – A circunstância de um peão proceder à travessia de uma via rodoviária, destinada preferencialmente ao trânsito de veículos automóveis, é por si só perigoso, para mais quando tal sucede fora do local destinado para o efeito.

    6. ) – No caso sub judice, as características da via e a dinâmica do acidente concorrem para que se atribua à A./Recorrida a responsabilidade exclusiva pela produção do acidente ou pelo menos uma culpa elevada na sua ocorrência.

    7. ) – Bastava que a A. tivesse cumprido qualquer uma das quatro normas estradais por si infringidas e o acidente não teria ocorrido.

    8. ) – A conduta da Recorrida revela grave negligência e uma atitude altamente temerária, perigosa, imprudente e destemida, que a A. podia e devia muito bem ter evitado.

    9. ) – Dado o quadro de perigosidade em que a A. voluntariamente se tinha colocado, a circunstância de ter parado no meio da faixa de rodagem, ao constatar que o veículo segurado da Ré se aproximava, só confirma por um lado, que iniciou a travessia da via sem que previamente se tivesse certificado de que o podia fazer em segurança e sem perigo de acidente e por outro, contribui decisivamente para a verificação do acidente, por ausência de uma manobra de rápida deslocação do peão, ou para a faixa de rodagem contrária, ou para a berma da faixa de rodagem de onde provinha.

    10. ) – O acidente de viação em discussão nos autos deve ser exclusivamente imputado à própria A., porquanto, não fosse a violação pela Recorrida das quatro normas rodoviárias por si infringidas, o acidente não teria, pura e simplesmente ocorrido.

    11. ) – Efectivamente, a A. podia ter atravessado a faixa de rodagem em outros dois pontos distintos da via, utilizando para tanto qualquer uma das passadeiras para peões situadas a menos de 50 metros; podia ter evitado prudentemente, transitar pela faixa de rodagem de modo a não prejudicar o trânsito de veículos; podia, antes de ter iniciado a travessia da via, ter-se certificado de que, tendo em conta a distância que a separava do veículo segurado da Ré, que nela transitava, e a respectiva velocidade, não podia efectuar o atravessamento da faixa de rodagem sem perigo de acidente e podia ainda assim, depois de ter iniciado a travessia, tê-la efectuado o mais rapidamente possível, correndo no mesmo sentido que levava ou correndo para trás, de regresso à berma, em vez de parar no meio de uma das faixas de rodagem, ainda que destinada ao trânsito de sentido contrário ao veículo segurado da Ré.

    12. ) – Só o facto de a A. se encontrar no meio da faixa de rodagem contrária, mas em direcção à faixa de rodagem pela qual circulava o TA impeliu o condutor deste a accionar os travões da sua viatura, o que provocou o bloqueio das rodas e a perda de controlo do mesmo, que acabou por se dirigir em direcção à A., que se encontrava parada no meio da faixa de rodagem contrária, onde foi colhida.

    13. ) – A ocorrência do acidente é portanto, exclusivamente imputável à própria A., pelo que deve ser excluída qualquer indemnização.

    14. ) – Caso assim se não entenda, deve o Tribunal ponderar pelo menos, uma concorrência de culpas, graduando a culpa da A./Recorrida sempre em maior medida que a culpa do condutor do veículo segurado da Ré e arbitrando as indemnizações que forem liquidadas na percentagem correspondente.

    15. ) – Sopesadas devida e equitativamente todas as circunstâncias relevantes, a indemnização por danos não patrimoniais que...

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