Acórdão nº 124/13.4GBOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LU
Data da Resolução10 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º124/13.4GBOAZ.P1 Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIONo processo comum (com intervenção do tribunal singular) n.º124/13.4GBOAZ da Comarca de Aveiro, Instância Local de Vale de Cambra, Secção de Competência Genérica, J1, por sentença proferida em 3/5/2016 e depositada na mesma data, o arguido B… foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência p. e p. pelo art.148.º, n.º1, do C.Penal, na pena 90 dias de multa, à taxa diária de €7,50 e absolvido da prática de uma contra ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.13.º e 38.º, n.º1, alínea d) do DL 315/2009, de 29/10, com as alterações introduzidas pela Lei 46/2013, de 4/7.

Inconformado com a decisão condenatória, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões (transcrição): I. No caso em apreço a M.ma Juiz a quo para condenar o recorrente nos referidos termos actuou no âmbito dos poderes que lhe são conferidos pelo estatuído artigo 127° do CPP.

  1. Salvo o devido respeito, que é muito, parece-nos que não existem elementos suficientes para a condenação nos moldes em que o arguido foi condenado.

  2. Encontra-se erradamente julgada a factualidade constante da douta sentença quanto aos recorrentes não devendo ser considerada como provados os pontos 6°. 19° e 20° da douta sentença e a darem-se como não provados aqueles factos.

  3. A Mma Juiz a quo alicerçou a sua convicção probatória nos diversos elementos de prova produzidos em audiência de julgamento e principalmente refere que " resultou claramente do depoimento do arguido que, no dia dos factos, o mesmo soltou o L… com o intuito de limpar a jaula, bastando-se com um olhar a distancia para o portão para se assegurar que o mesmo estava fechado".

  4. Da situação dos autos, considerando como certo que ocorreu o acidente importa aferir se o arguido exerceu devidamente o seu dever de vigilância, não tendo previsto o evento, ou tendo-o previsto, confiando que ele não se viesse a verificar, e se o podia ter previsto e evitado.

  5. Deu a M.ma Juiz como provado o ponto 6 "Seguidamente, manifestando um absoluto descuido e incúria, com plena consciência das características potencialmente perigosas do animal e que sobre si incidia a obrigação de o vigiar, o arguido pôs-se a limpar a jaula, sem se certificar previamente se o portão se encontrava fechado, perdendo de vista o animal e permitindo que o mesmo andasse a seu bel prazer pelo logradouro e pela via publica, desacompanhado, sem o açaime se recurso a trela." VII. A M.ma juiz não tinha elementos nem factos suficientes que lhe permitissem dar como provado tal facto. E que como tal como foi referido pelo próprio arguido antes de iniciar a limpeza da jaula veio verificar se o portão da entrada estava fechado. Ou seja todas as medidas que ao seu alcance estavam foram tomadas pelo arguido.

  6. Foi referido por diversas testemunhas, conhecedoras da situação, e cujo depoimento se mostrou claro, coerente e bastante razoável, que o arguido sempre teve os cuidados devidos no que se refere aos cuidados a ter com o animal em causa.

  7. Na verdade, o arguido agiu sempre com todo o cuidado devido a que estava obrigado, nas circunstâncias em que se deu o acidente, e como tal não podia, nem tinha elementos suficientes para condenar o arguido da forma que condenou, e também não tinha elementos suficientes para que se verifique a negligência, não se encontrando por isso verificados os pressupostos previstos nos artigos 15° e 148° do CP.

  8. A conduta do arguido desde a data em que o canídeo passou a estar em sua casa foi em tudo exemplar e cumpridora de todas as normas e regras de segurança que são exigidas e esperadas de alguém que é dono ou detentor de um animal com as características do animal em causa nos autos.

  9. O arguido procedeu a vedação de toda a sua propriedade desde a época em que o cão assou a estar definitivamente em sua casa, nunca saiu com o cão para a rua sem trela, vedou o terraço que dava para a via publica.

  10. O cão estava sempre na jaula, e quando saía ficava no terraço vedado, e não andava a vaguear pela propriedade, ate porque o arguido tinha produtos hortícolas, e não pretendia que o canídeo as estragasse.

  11. Foi referido pelas testemunhas que o portão estava muitas vezes fechado, e quando estava aberto não viram o cão solto.

  12. Os vizinhos sabiam que o arguido tinha o cão em sua casa, mas não porque o vissem a vaguear na propriedade ou na rua, mas porque alguém lhe tinha falado daquele cão, e depois do acidente! Ou seja, o arguido não teve qualquer conduta omissiva que permita formular um juízo de reprovação pela sua atitude, XV. O que esperar mais do arguido? Além de tudo aquilo que fazia e fez no dia do acidente? Não parece espectável que ao arguido fosse exigida outra atitude.

  13. O próprio tribunal a quo considerou " No mais o Tribunal teve em conta os testemunhos de C…, genro do arguido, D…, proprietária do cão, E… que abordou o arguido apos o incidente, F…, militar da GNR que acompanhou G…, vizinho do arguido, H…, mulher do arguido, I…, filha do arguido, e J… Filho de um vizinho do arguido. Do depoimento das testemunhas foram possível concluir que a detenção do cão por parte do arguido se pautou sempre e abstractamente por um comportamento pelo cumprimento das regras inerentes a guarda de um cão de raça potencialmente perigosa.

  14. Não podia o Tribunal a quo proferir outra decisão de não a de absolver o arguido, uma vez que ficou claramente demonstrado que ao arguido não lhe era exigida outra conduta.

  15. O ora recorrente cumpriu o seu especial de dever de vigilância previsto no artigo 6o do Decreto lei 312/2003 de 17/02 alterado pelo Dec 315/2009, no sentido de evitar que o cão pusesse em risco a vida ou integridade física de outras pessoas ao contrário do que foi dado como provado na decisão ora em apreço.

  16. Inexiste, pois qualquer tipo de negligencia do ora recorrente e arguido, que tomou todos os cuidado para que o animal não saísse dos limites da propriedade, nomeadamente no dia do acidente certificar-se se o portão se encontrava fechado e ao afirmar que " lhe pareceu que sim" XX. Importa também aferir se dos factos provados em sede de audiência de julgamento são de molde a considerar-se na pratica de um crime ou contra ordenação XXI.De acordo com a legislação em vigor não resulta dúvidas para o ora recorrente, que o " L…" era considerado um animal perigoso de acordo com a lista existente que classifica as raças potencialmente perigosas.

  17. Assim como não poe em causa o arguido, que há data do acidente era o arguido o detentor do animal e a propriedade do cão era da D….

    XXIII Não resulta dúvidas para o recorrente que a assistente sofreu lesões, no entanto da matéria dada como provada tais lesões não se integram no âmbito de aplicação do artigo 144° do CP que regula as ofensas a integridade física graves.

  18. Também foi essa a conclusão da Mma Juiz: "Resulta da matéria provada que as lesões sofridas pela assistente não integram as previstas no artigo 144°do Código Penal" XXV. Assim excluída tal lesão da qualificação com graves, se não existisse o conceito da negligencia, e as lesões sofridas integrariam o conceito de ofensa a integridade física simples nos termos do disposto no artigo 143° do CP.

  19. Em 1 /1/2010 entrou em vigor o DL 31/2009 de 29/10 que aprovou o regime jurídico da detenção de animais perigosos, o qual de acordo com o artigo 44° revogou o DL 312/2003 de 17/12 alterado pela Lei 49/2007 de 31/08.XXVII Não tendo sido ainda aprovada a regulamentação prevista, mantem-se em vigor a portaria 422/2004 que determina as raças de cães e cruzamentos potencialmente perigosos, E não restam duvidas que o L… se integra nesse elenco, Determina as raças de cães e cruzamentos potencialmente perigosos, E não restam duvidas que o L… se integra nesse elenco.

  20. Nos termos do disposto no artigo 38° do DL 315/2009 " constituem contra ordenações puníveis, pelo Director geral de veterinária, com coima cujo montante mínimo é de 500€ e máximo de €3.740 ou €44.890, consoante de trate de pessoas singulares ou colectivas (...) A não observância de deveres de cuidado ou vigilância que der azo a que um animal ofenda o corpo ou saúde de outra pessoa causando-lhe ofensa a integridade física que não sejam consideradas graves.

  21. Considerando tudo o exposto os factos provados em sede de audiência de julgamento não podem integrar qualquer tipo de crime e, por mera hipótese de raciocínio se admite, integrariam uma contra-ordenação.

    O Ministério Público e a assistente K… responderam ao recurso, pugnando pela sua improcedência (fls.449 a 456 e 457 a 461).

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