Acórdão nº 838/15.4PFPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelRENATO BARROSO
Data da Resolução03 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 838/15.4PFPRT.P1 1ª Secção ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DO PORTO 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida No processo sumário nº 838/15.4PFPRT, da Comarca do Porto, Instância Local, Secção de Pequena Criminalidade, J2, foi o arguido B…, condenado pela prática de um crime de desobediência, p.p., pelos Artsº 348 nº1 al. a) e 69 nº1 al. c) ambos do C. Penal, por referência ao Artº 152 nsº1 al. a) e 3 do Código da Estrada, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), perfazendo o montante de € 385,00 (trezentos e oitenta e cinco euros) e na pena acessória de proibição de condução de veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses.

B – Recurso Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido, tendo concluído as respectivas motivações da seguinte forma (transcrição): 1. A decisão que antecede viola o disposto nos artigos l e 4 da lei l8/2007, l7 de Maio.

  1. Preceitos ao abrigo dos quais os agentes deveriam ter acolhido a solicitação do arguido em realizar o exame por colheita de sangue.

  2. Essa solicitação do arguido é juridicamente relevante e implica o afastamento do dolo, dado que evidencia a conduta de anuência e a vontade em acatar a ordem de se submeter ao teste de pesquisa de álcool.

  3. A ordem proferida, ao não respeitar o disposto nos artigos 1 e 4 da lei 18/2007, 17 de Maio, é materialmente ilegítima.

  4. O que afasta a verificação do tipo legal de desobediência.

  5. O ponto n.º 2 dos factos provados, está incorrectamente julgado.

  6. O ponto n.º 2 dos factos julgados deve ser removido do elenco dos factos provados ou substituído por "o arguido ingeriu um a dois copos de vinho, 8 horas antes do momento em que foi interceptado pelas forças policiais, no circunstancialismo de tempo e lugar descrito em 1.º".

  7. A decisão proferida padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

  8. A dialéctica normal seria a emanação da ordem e o seu acatamento. Mas se perante a emanação da ordem, é manifestada a vontade de cumprir, numa forma determinada e se perante essa solicitação, a ordem não é renovada, com o sentido de anuir ou rejeitar a solicitação apresentada, o destinatário fica necessariamente num estado expectante ou dúbio.

  9. E é nesta situação que a sentença nos deixa. Ao Tribunal competia apurar e descrever o que se passou após a solicitação do exame por colheita de sangue, designadamente, se a ordem foi renovada com a restrição ele realizar o teste por meio de ar expirado.

  10. O facto provado descrito sob o n.º 6, na parte final- "e o seu estado não o impedia de realizar o referido teste através de ar expirado" - está incorrectamente julgado, devendo ser retirado do elenco dos factos provados.

  11. Precisamente porque a prova produzida, decorrente das declarações do arguido e do médico, evidenciam a consciência da impossibilidade.

  12. O que sai reforçado pelo facto de o arguido solicitar a realização de um exame por meio de colheita de sangue.

    Termos em que e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser admitido, julgado procedente e por via dele o arguido absolvido com todas as legais consequências.

    C – Resposta ao Recurso O M. P., junto do tribunal recorrido, respondeu ao recurso, concluindo do seguinte modo (transcrição): A sentença recorrida não violou, por conseguinte, qualquer preceito legal ou constitucional, antes tendo feito uma correcta aplicação do direito aos factos, revelando-se estes correctamente apreendidos, valorados e juridicamente enquadrados, donde resulta que o recurso não merece provimento e, consequentemente, deve aquela sentença ser integralmente mantida.

    D – Tramitação subsequente Aqui recebidos, foram os autos com vista à Exmª Procuradora-Geral Adjunta, que pugnou pela manutenção da decisão recorrida.

    Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, foi apresentada resposta pelo recorrente, mantendo os seus argumentos.

    Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.

    Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

  13. FUNDAMENTAÇÃO A – Objecto do recurso De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 (neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/"www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria) o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente retira da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

    Na verdade e apesar do recorrente delimitar, com as conclusões que extrai das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito.

    As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal.

    In casu, o objecto do recurso cinge-se às conclusões do recorrente, nas quais pretende dirimir as seguintes questões : 1) Erro de julgamento ; 2) Preenchimento do crime; B – Apreciação Definidas as questões a tratar, importa considerar o que se mostra fixado, em termos factuais, pela instância recorrida.

    Aí, foi dado como provado e não provado, o seguinte (transcrição): II – FUNDAMENTAÇÃO: FACTOS PROVADOS: Com interesse directo e relevante para a decisão da causa, o tribunal tem por provada a factualidade que se segue: 1 – No dia 20 de Novembro de 2015, cerca das 5:05 horas, o arguido B… conduzia o automóvel de matrícula ..-AV-.., pela Rua …, no Porto, onde veio a parar e ser fiscalizado por agentes da PSP.

    2 – Momentos antes de iniciar a condução do referido veículo, o arguido ingeriu álcool.

    3 – Intimado pelo agente fiscalizador para se submeter ao teste de despistagem de álcool no sangue, através de ar expirado recusou-se a fazê-lo.

    4 – Advertido e informado, por várias vezes, de que se persistisse em tal recusa incorreria na prática do crime de desobediência, o arguido manteve aquele seu propósito de não efectuar o exame de pesquisa de álcool no sangue.

    5 – Foi de seguida o arguido conduzido à Divisão de Trânsito, aí o mesmo manteve o propósito de não efectuar o exame de pesquisa de álcool no sangue através de ar expirado, pedindo já depois de decorridos mais de 30 minutos após o início da fiscalização que fosse submetido a análise ao sangue.

    6 – O arguido não invocou qualquer impedimento válido, designadamente, motivos de saúde e o seu estado não o impedia de realizar o referido teste através do ar expirado.

    7 – Na sequência do pedido formulado pelo arguido em 5), foi informado pela autoridade policial de que primeiro teria de se submeter a teste através de ar expirado e de sopro e só em caso de sopro insuficiente ou em caso de contraprova poderia ser submetido a análise sanguínea.

    8 – O arguido agiu de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que na qualidade de condutor estava obrigado a efectuar o exame de pesquisa de álcool e que ao ser-lhe ordenada a sua realização, agiam os agentes de autoridade no exercício das funções que lhes competiam e, não obstante, desobedeceu à referida ordem que sabia ser legítima.

    9 – Mais sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    10 – O arguido fuma 1 (um) maço de tabaco por dia.

    11 - O arguido é empresário e declara como vencimento o salário mínimo nacional.

    12 - O arguido vive com dois filhos de 6 e 10 anos em casa arrendada cuja renda é de €450,00.

    13 – Os filhos do arguido recebem a título de alimentos por parte da mãe o montante mensal de €400,00.

    14 – O arguido tem o 12º ano de escolaridade.

    15 - Do certificado de registo criminal do arguido nada consta.

    FACTOS NÃO PROVADOS: De relevante para a decisão da causa, o tribunal não deu como provada a seguinte factualidade.

    1 – O arguido não estava a conduzir o referido veículo nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 1) da factualidade provada.

    2 – O arguido não estava em condições físicas que lhe permitissem efectuar o exame de pesquisa de álcool no sangue através de ar expirado, decorrente de uma infecção respiratória.

    3 – Desde o início da fiscalização que o arguido solicitou à autoridade policial a realização de análise ao sangue.

    4 - O arguido nunca agiu com o fito de esquivar-se ao exame de pesquisa de álcool no sangue.

    5 – O arguido tinha a consciência e certeza de que se submetido a exame, o mesmo reportaria um valor nulo.

    Estabelecida a base factual pela sentença em análise, importa apreciar da bondade do peticionado pelo recorrente, tendo em conta as questões que por este são suscitadas: B.1.

    Erro de julgamento : Impugna o recorrente a matéria de facto constante da decisão recorrida, no que respeita, fundamentalmente aos seus Artsº 2 e 6 in fine, por entender que o tribunal a quo errou na apreciação probatória da mesma.

    No que respeita ao Artº 2, entende o recorrente que o facto ali assumido - Momentos antes de iniciar a condução do referido veículo, o arguido ingeriu álcool – não corresponde à prova produzida em Audiência, na medida em que sobre essa matéria, apenas o arguido prestou declarações, e o mesmo afirmou ter bebido um ou dois copos de vinho cerca de oito horas antes de...

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