Acórdão nº 231/10.5TBSAT.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Maio de 2015
Magistrado Responsável | MARTINS DE SOUSA |
Data da Resolução | 26 de Maio de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: 1.
AA intentou contra BB, CC e DD (Europe), Lda., acção declarativa, de condenação, sob a forma de processo ordinário a fim deles obter o pagamento da quantia de €73.148,25, incluídos juros vencidos.
Alegou, para tanto que os réus BB e CC, no exercício das respectivas actividades de solicitador e Advogado, enquanto mandatados para o representarem em acção declarativa por si intentada e julgada improcedente, não cumpriram de forma diligente o mandato que lhes conferira; o Réu BB, solicitador, violou o art.109º, al. h) e i) do Estatuto da Câmara dos Solicitadores, enquanto o Réu CC, Advogado, violou os art.s 92º e 95º do Estatuto da Ordem dos Advogados; a actuação culposa dos réus, que se presume, impediu o A. de ver ressarcidos os prejuízos que reclamava na ação supra referida, no montante de 9.780.000$00 correspondente ao sinal prestado em dobro, a que devem acrescer juros, desde a data de entrada da providência cautelar, 26.04.2000 até efetivo e integral pagamento, os quais calculados até à presente data ascendem, afirma, a €24.365,82, perfazendo um total de €73.148,25; a 3.ª R. celebrou com a Ordem dos Advogados um Seguro de Responsabilidade Civil Profissional em 2010, com retroactividade ilimitada, e cujo limite engloba o presente pedido.
Contestaram os réus.
A Ré seguradora impugnou o alegado pelo autor e por excepção, invocou o limite de cobertura do seguro até ao capital de €50.000, bem como a exclusão da cobertura da apólice pelo facto da reclamação dos danos, efectivada pela citação para a presente acção, não ter ocorrido durante a respectiva vigência e a exclusão da cobertura da apólice pelo conhecimento que o R. CC tinha dos factos, em que se funda a pretensa responsabilidade civil profissional, no inicio de vigência do seguro, sem os comunicar à seguradora num prazo razoável -art.3º, al. a) e art.8º das Condições Especiais da Apólice.
Os réus BB e CC impugnaram e excepcionaram a prescrição da responsabilidade civil extracontratual em que se funda a pretensão. E, em reconvenção, pediram: a) a condenação do Autor no pagamento da quantia de €5.000, acrescida de IVA, a título de honorários e despesas, com o exercício do mandato no arresto, acção ordinária e registo que invoca; b) a condenação do Autor no pagamento da quantia de €1.500, a título de indemnização, e multa como litigante de má fé.
Mais requereram a intervenção principal provocada da EE - Companhia Portuguesa de Seguros, S.A., para a qual o Réu BB tinha transferido a respectiva responsabilidade civil profissional. Replicou o Autor e quanto à contestação da Ré seguradora, DD, alegou que a cláusula de exclusão ínsita nas Condições Especiais da Apólice que jamais foi explicada ao R. CC, nem o seu conteúdo publicitado convenientemente junto dos beneficiários do Contrato de Seguro; ademais trata-se de condições não negociadas e ínsitas num contrato com clausulado pré conformado pela 3.ª R., nos termos do Dec Lei 446/85 de 25 de Outubro, devendo tal cláusula ser considerada excluída do citado contrato de seguro nos termos do art.8.º do citado Decreto Lei; tal limitação de responsabilidade é contraditória com a cláusula de retroactividade ilimitada negociada com a Ordem dos Advogados e sempre seria nula nos termos combinados da alínea b) do art.18º Dec Lei 446/85 e art.12.º e 15.º do referido diploma, isto porque o A. é terceiro em relação ao contrato de seguro celebrado entre os 2.º e 3.ª RR. e a responsabilidade que dai pode advir é extracontratual em relação ao contrato de seguro; quanto à mencionada falta de comunicação por parte do seu segurado num prazo razoável, são situações a que o A. é alheio e quando muito os danos que a 3.ª R. tenha poderão vir a ser efectivados em sede de direito de regresso, sendo de qualquer forma inoponível ao Autor.
Quanto à contestação dos RR. BB e CC impugnou a matéria da prescrição e reconvenção e conclui, requerendo: a) a condenação dos 1º e 2º RR. como litigantes de má fé em multa e indemnização condigna; b) em ampliação do pedido, a condenação dos RR. em juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento sobre a quantia peticionada.
Foi admitida a intervenção principal provocada da EE que contestou, defendendo-se por impugnação e excepcionando a existência de uma franquia, a exclusão do âmbito temporal e pessoal da garantia contratada (solicitador de execução), embora a responsabilidade civil profissional invocada pelo A. se funde exclusivamente na actuação do Réu CC, enquanto Advogado, ao prescindir das testemunhas em julgamento; por fim, excepcionou a sua ilegitimidade passiva, mais alegando que os factos em apreço jamais foram participados à chamada EE.
Prosseguiu o processo os seus termos, tendo, a final, sido proferida sentença na qual se decidiu: «I) julgar parcialmente procedente, por provada, a presente acção e consequentemente: a) condenar o Réu CC a pagar ao Autor a quantia de €33.313,56 (trinta e três mil, trezentos e treze euros e cinquenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da presente sentença até integral e efectivo pagamento; b) absolver o Réu CC do mais contra si peticionado; c) absolver os Réus BB, DD (Europe), Lda, e a chamada EE - Companhia Portuguesa de Seguros, S.A., totalmente do pedido contra si deduzido; II) julgar improcedente, por não provado, o incidente de litigância de má fé e em consequência absolver Autor e RR. dos respectivos pedidos.» Inconformados, recorreram o réu CC, e, subordinadamente, o autor, e, por acórdão, a Relação de Coimbra concedeu parcial provimento aos recursos e, consequentemente condenar também a ré DD (Europe) nos termos decididos para o réu CC.
E no mais confirmou a sentença recorrida.
Ora, foi a vez de a R. DD interpor recurso de revista, concluindo sua alegação nos termos seguintes: 1.° Os princípios e normativos subjacentes ao contrato de seguro obrigatório "não se aplicam (...) ao seguro facultativo (no qual) está essencialmente em causa a liberdade contratual das partes (que) poderão no mesmo fazer incluir as cláusulas que lhes aprouver" (v. Ac. RC de 2011.10.25, Proc. 770/07.5TBGRD.Cl, in www.dgsi.pt; cfr. arts. 12°, 13°,100° e 101° da Lei de Contrato de Seguro - DL 72/2008) - Cfr. texto nOs 1 a 4; 2.° O "contrato de seguro sub judice (da Ordem dos Advogados) integra o regime comum do seguro de responsabilidade civil obrigatório, apresentando-se, por isso, como facultativo e inteiramente submetido à total liberdade das partes (pelo que) a exclusão de cobertura do presente sinistro previsto na apólice de seguro ora em análise por falta de participação é absolutamente válida, eficaz e oponível, não lhe sendo minimamente aplicáveis os princípios contidos nos arts. 13° e 101°/4 da Lei de Contrato de Seguro" (V. Ac. RE de 2012.03.22, Apelação n° 2827/09.9TBSTR-A, da 2ª Secção Cível; cfr. exactamente no mesmo sentido Ac. RE de 2010.07.08, Proc. 1190/08.0TBSTC.El, in www.dgsi.pt; cfr, art. 99°/1 do EOA e art, 9° do C. Civil) - Cfr. texto nºs 1 a 4; 3.° ln casu, o tomador de seguro (Ordem dos Advogados) e os segurados RR., após conhecimento dos factos em causa nos autos e consciencialização de que os mesmos eram susceptíveis de poderem vir a gerar responsabilidade nos termos da apólice contratada não participaram os factos em causa à ora Recorrente, que apenas teve conhecimento dos mesmos através do acto de citação do Tribunal "a quo" (v. Arts. 1 e 3° das Condições Especiais da Apólice), pelo que o douto acórdão recorrido violou frontalmente os arts. cfr, arts. 12°, 13°, 100° e 101° da Lei de Contrato de Seguro - DL 72/2008 e artº. 483° e segs. e 798° e segs. do c. Civil) - Cfr. texto nºs 1 a 4; 4.° A A. não alegou, demonstrou ou provou a existência de qualquer Dano, consistente na "supressão ou diminuição duma situação jurídica favorável que estava protegida pelo Direito" (v. Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1980, Vol. II, AAFDL, p.p. 283; dr. Gomes da Silva, O Dever de Prestar e o Dever de Indemnizar, 1944, 80), consubstanciado em perda de oportunidade ou de "chance" que fundamente a pretensão indemnizatória peticionada e que foi sufragada pelo Tribunal "a quo" e condenado o R. (v. arts. 483º e segs. e 798º e segs. do C. Civil; art. 342º do C. Civil) - cfr. texto nºs. 5 e 6; 5.° A A. não invocou ou demonstrou - como lhe competia (v. artº. 342° do C. Civil) -, nem se verificam in casu os pressupostos de que dependeria a responsabilidade dos RR. pelos pretensos prejuízos invocados e pelos quais foram condenados, pelo que o douto acórdão recorrido enferma de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o disposto nos arfs. 9°, 342°, 496°, 483° e segs., 562º a 566°, 798º e segs., do C. Civil - cfr. texto nºs. 5 e 6; NESTES TERMOS, Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o douto acórdão recorrido, na parte impugnada, com as legais consequências.
Respondeu o A., fundamentando, longamente, seu ponto de vista e concluindo pela confirmação do acórdão.
Suscita, todavia, questão prévia no que concerne à matéria da responsabilidade civil contratual do R. Advogado cuja reapreciação, segundo ele, não é permitida, ora, à Recorrente, em sede de revista uma vez que foi objecto de confirmação pela Relação, verificando-se, em consequência a dupla conforme.
Ora, corridos os vistos, cumpre apreciar.
Preliminarmente, impõe-se pronúncia sobre a questão prévia a que se fez referência.
Na verdade, questiona a...
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