Acórdão nº 17592/16.5T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução16 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL *** I. Relatório 1. AA, instaurou contra Mapfre Seguros Gerais, S.A, ação declarativa, com processo comum, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 42.000,00, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento, a título de indemnização do dano de perda de chance por ele sofrido em consequência da atuação ilícita e culposa do mandatário judicial que constituiu para representá-lo e defendê-lo na ação nº 12168/12.9…. .

Alegou, para tanto e em síntese, que o referido mandatário não efetuou o pagamento da taxa de justiça e multa devidas, pelo que, tendo sido ordenado o desentranhamento da contestação por ele apresentada naquela ação, ficou impossibilitado de invocar a nulidade do contrato verbal de promessa de compra e venda das duas garagens por falta de observância da forma escrita, nos termos do disposto no art. 410º, nº 2, do C. Civil e, dessa forma, evitar a sua condenação na restituição à promitente compradora da quantia de € 42.000,00, correspondente ao valor do sinal em dobro.

E porque o referido o mandatário também não interpôs recurso da sentença condenatória, ficou, de igual modo, impossibilitado de conseguir a alteração desta mesma decisão junto do tribunal superior.

  1. A ré contestou, excecionando a exclusão do sinistro da cobertura da apólice por a conduta lesiva do advogado ter tido lugar antes da entrada em vigor da apólice com ela contratada.

    Deduziu pedido de intervenção principal provocada de BB, que foi admitida, não tendo o mesmo apresentado contestação.

  2. O autor deduziu pedido de intervenção principal provocada de Seguradoras Unidas, S.A que foi admitida.

  3. Citada, Seguradoras Unidas, S.A, contestou, excecionando a sua ilegitimidade em virtude de nos anos 2014 a 2017, a responsabilidade profissional dos Advogados se encontrar transferida para a ré Mapfre Seguros Gerais, S.A.

  4. O autor e a ré responderam, pugnando pela improcedência da invocada exceção.

    6. Realizada audiência prévia, nela foi proferido despacho saneador, que apreciou e julgou improcedente a invocada exceção de ilegitimidade passiva, foram fixados o objeto do litígio e os temas da prova.

  5. Procedeu-se a julgamento, após o que foi preferida sentença que julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu os réus do pedido, considerando prejudicada a apreciação da eventual responsabilidade das rés seguradoras.

  6. Inconformado com esta decisão, dela apelou o autor para o Tribunal da Relação …, tendo o Sr. Desembargador relator, proferido decisão singular, que, considerando ser de imputar ao chamado, BB a responsabilidade pelo insucesso da causa, com fundamento na falta de cuidado dos meios conducentes a um eventual ganho da causa, julgou procedente a apelação e, revogando a sentença recorrida, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 42.000,00, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

  7. Desta decisão singular reclamou a ré Mapfre - Seguros Gerais, S.A para a conferência, ao abrigo do disposto no art. 652º, nº 3, do CPC, tendo o Tribunal da Relação proferido acórdão, em … .02.2020 e com um voto de vencido, que julgou parcialmente procedente o recurso e, revogando a sentença recorrida, condenou os réus BB e Mapfre Seguros Gerais SA a pagarem solidariamente ao autor AA a quantia de € 5.250,00 (cinco mil duzentos e cinquenta euros), acrescida de juros vencidos e vincendos desde … .09.2016 até integral pagamento, à taxa legal, e absolveu a Seguradoras Unidas SA. do pedido.

  8. Inconformado com este acórdão, o autor dele interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: « 1) O recorrente demonstrou no processo que as garagens objetos da ação contra si movida no ano de 2012 no Tribunal … foi mal decidida – pois não só as não prometeu vender verbalmente, como demonstrou que existia um contrato promessa de compra e venda entre a sociedade CC e DD.

    2) Ora, se existia um contrato de compra e venda entre a sociedade CC e a referida DD – o recorrente teria de ser absolvido da Instância, por ilegitimidade.

    3) Mas, se existisse contrato verbal – a promessa de venda é nula – por força do disposto no artigo 410º do Código Civil.

    4) A nulidade é uma exceção perentória – A mesma é de conhecimento oficioso – artigos 576º, nº3 e 579º do Código do Processo Civil.

    5) Logo, o Sr. Doutor BB não defendeu corretamente os interesses do seu constituinte.

    Não só porque – apresentou a contestação fora do prazo e não pagou a multa.

    Foi notificado várias vezes pelo Tribunal para fazer os pagamentos - e nada fez.

    Foi notificado do desentranhamento da contestação – e nada fez.

    Foi notificado da sentença – e nada fez.

    6) Do atrás exposto, nos pontos 1 a 5 destas conclusões, o Sr. Dr. BB tinha motivos mais que suficientes para impedir que o recorrente fosse condenado e nos termos em que foi.

    7) O douto Acórdão de que se recorre confirma que o Sr. Dr. BB não esteve bem, mas que o A. não demonstrou a quantificação do dano.

    Ora, salvo o devido respeito – o Tribunal não apreciou corretamente quer a prova produzida em julgamento, quer os documentos juntos aos Autos – nomeadamente a sentença junta aos Autos com a PI como doc. nº 1 e os contratos de compra e venda entre a CC e a DD.

    Pois, se o contrato de promessa de venda fosse verbal como declarou o Tribunal … na ação proposta por DD em 2012 – o recorrente apenas teria de devolver 21.000,00€ e não 42.000,00€ (logo tem prejuízo de 21.000,00€).

    Mas, está demonstrado no processo que não foi assim.

    As garagens em causa eram propriedade da CC e esta prometeu vendê-las à DD – logo o Tribunal ao condenar o recorrente na Ação de 2012 a pagar 42.000,00€ a DD, causou-lhe este prejuízo.

    Logo, os prejuízos estão demonstrados e também está demonstrado que não é preciso ser catedrático para entender o vertido no artigo 410º nº 2 do Código Civil e o disposto nos artigos 576 e 577º al. e), do Código do Processo Civil.

    8) De acordo com o Aresto proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça aos 12/04/2012, disponível na base de dados dgsi.pt, “I - No mandato forense, a prestação do mandatário insere-se nas denominadas obrigações de meios, em que o devedor apenas se obriga a praticar ou desenvolver determinada actuação, comportamento ou diligência com vista à produção do resultado pretendido pelo credor, actuação ou comportamento que, por vezes, relativamente a certas classes profissionais, se encontra regulamentado por estatutos próprios ou específicos.

    II - No exercício do patrocínio forense, o advogado não se obriga a obter ganho de causa, mas a utilizar, com diligência e cuidado, os seus conhecimentos técnico-jurídicos de forma a defender, tão bem e adequadamente quanto possível, vale dizer, utilizando os meios ajustados ao caso, segundo as leges artes, os interesses do respectivo mandante.

    Sem prejuízo do reconhecimento da margem de liberdade de actuação, inerente à autonomia profissional e independência técnica da intervenção forense, são as exigências específicas próprias dum exercício profissional, designadamente em sede de competência (saber e experiência) e diligência, que fundamentam a responsabilidade de quem presta profissionalmente serviços.

    III - Violados deveres comportamentais adequados ao caso, incumprido ou defeituosamente cumprido resulta o contrato de mandato forense, ocorrendo o ilícito gerador da obrigação de indemnizar.

    IV - Omitida a interposição de um recurso, importa averiguar e formular um juízo sobre se a omissão/opção tomada foi, em termos objectivos, desconforme ao padrão de conduta profissional que um advogado medianamente competente, prudente e sensato teria tido, quando confrontado, na ocasião, com uma sentença daquele teor.” Assim sendo, como já mencionado no corpo da petição inicial nº 17592/16.2…, a atuação do Dr. BB não foi diligente, nem muito menos foi feito com o cuidado devido ao caso e aos interesses do ora Autor.

    Uma vez que foram preteridas regras fundamentais de Direito, cujo desconhecimento por parte do advogado merece censura.

    Pois, a não contestação correta da petição inicial e em tempo útil e, consequentemente, a preterição de invocação da nulidade do contrato-promessa de compra e venda, não é ajustada à defesa dos interesses, e direitos, do mandante.

    9) E bem assim, mesmo quando a decisão admitia recurso, o advogado não o fez, sabendo que só com a interposição do mesmo, se poderia defender os interesses do ora recorrente.

    Pois o advogado nada fez, e assim, violou os mais elementares deveres comportamentais adequados ao caso; O advogado do recorrente cumpriu defeituosamente o mandato forense, e com a sua conduta violou o disposto nos artigos 88º, nº 1, 90º, nº 1, 97º, nº 2 e 98º, nº 2 da Lei nº 145/2015 de 9 de Setembro e os artigos 1157º e 1161º do Código Civil.

    Porquanto, devem os RR. indemnizar o Recorrente pelos prejuízos causados, no montante de € 42.000,00, por força do disposto nos artigos 562º, 563º, 564º, 566º, 762º, nº 1, 798º, 799º, nº 1 e 805º, nº 1, nº 2, al. b) e nº 3, todos do Código Civil.

    10) Motivo pelo qual o douto Acórdão ao decidir como decidiu violou o disposto nos artigos 362º, 364º nº 1, 410º, 1157º e 1161º, 562º, 563º, 564º, 566º, 762º nº1, 798º, 799 nº 1, 805 nº 1, nº 2 al. a) e b) e n 3, todos do Código Civil e ainda o disposto nos artigos 607º nº 5 e 615º nº 1 al. b) e c), do Código Processo Civil.

    Devendo ser revogada o douto Acórdão, por um outro que julgue a ação totalmente procedente ».

  9. A Seguradoras Unidas S.A., respondeu e ampliou o âmbito do recurso, terminando as suas alegações, com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1.ª In casu, o Recorrente não alegou, demonstrou ou provou a existência de qualquer Dano, consistente na “supressão ou diminuição duma situação jurídica favorável que estava protegida pelo Direito” (v. Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1980, Vol. II, AAFDL, p.p. 283; cfr. Gomes...

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