Acórdão nº 976/12.5TBBCL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução29 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e BB instauraram acção declarativa contra CC Seguros, S.A., pedindo a condenação desta no pagamento de: "

  1. Ao 1.º A. e à 2.ª A. pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima DD a quantia de 125 000,00 € e pela perda do direito à vida de 75 000,00 €, num total de 200 000,00 €, acrescidos dos juros de mora legais desde a citação até integral e efectivo pagamento; b) Ao 1.º A. a título de danos não patrimoniais a quantia de 35 000,00 €, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento; c) À 2.ª A. a título de danos patrimoniais decorrentes de perda de alimentos a quantia de 78 400,00 €, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento; d) À 2.ª A. a título de danos não patrimoniais a quantia de 35 000,00 €, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento".

    Alegam, em síntese, que, no dia 8 de Abril de 2009, DD seguia, como passageira, no veículo automóvel matrícula ...-...-BU e que, quando este circulava na Rua …, freguesia de …, concelho de B…, o seu condutor, por culpa sua, perdeu o controlo da viatura, a qual acabou por sair da via e embateu numas árvores. Em consequência do embate, DD sofreu diversas lesões e, a 15 de Agosto de 2010, por causa de complicações infecciosas decorrentes do seu estado clínico, faleceu.

    O autor AA era casado com DD e a autora BB era mãe dela.

    Mais alegaram que a responsabilidade civil decorrente de danos causados a terceiros pela circulação do veículo ...-...-BU estava transferida para a ré, por contrato de seguro titulado pela apólice n.º 90….

    A ré contestou dizendo, em suma, que assumia a responsabilidade pelos danos causados pelo acidente, impugnando, na restante parte, o que de essencial foi alegado pelos autores.

    Foi admitida intervenção principal da EE (Sucursal em Portugal), que afirmou, fundamentalmente, que a entidade patronal de DD tinha a sua responsabilidade civil decorrente de acidentes de trabalho dos seus trabalhadores transferida para si, através do contrato de seguro titulado pela Apólice n.º 23…, e que o despiste ocorreu quando esta se deslocava da sua residência para o local de trabalho - pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: "a. O montante de € 84.633,10, que a Autora já desembolsou; b. Os juros vincendos à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

  2. Deve, ainda, ao abrigo do disposto do artigo 472.º do Código do Processo Civil, a Ré ser condenada a ver declarada a sua responsabilidade nas prestações que a Autora satisfizer ao AA e, consequentemente, ser condenada a pagar à Autora, logo que por esta interpelada, os montantes que esta vier a pagar ao AA ou a terceiros e na exacta medida desse cumprimento quer: i. por força do contrato de seguro titulado pela Apólice n.º 23…3 (…), quer ii. no cumprimento da decisão homologada pelo Ministério Público em 06/04/2011." Admitiu-se, igualmente, a intervenção principal de FF, pai de DD, o qual, no entanto, não apresentou articulado.

    Os autores, dizendo que só tiveram conhecimento através da notificação do relatório pericial de novos danos de natureza não patrimonial sofridos pela sinistrada, apresentaram articulado superveniente onde ampliaram o pedido relativo aos danos não patrimoniais para mais € 300 000,00.

    Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "a) condenar a Ré a pagar aos Autores as seguintes quantias, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4% ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a citação até integral pagamento: - € 205.000,00 ao 1.º Autor AA; e - € 33.600,00, para a 2.ª. Autora BB.

  3. condenar a Ré a pagar à interveniente "EE Plc - Sucursal em Portugal" a quantia global de € 115.059,60, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a notificação para contestar o pedido formulado no articulado de intervenção espontânea até integral pagamento, sobre € 84.503,90.

  4. absolver a Ré do restante pedido." 2. Inconformados com esta decisão, apelaram o autor AA e a ré, tendo a Relação começado por fixar a matéria de facto, nos seguintes termos: 1. No dia 8 de Abril de 2009, pelas 8 horas, na Rua …, freguesia de …, concelho de B…, ocorreu um despiste do veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de serviço particular com matrícula ...-...-BU, propriedade de DD e conduzido por GG, com o conhecimento e autorização daquela.

    1. A Rua …, no local do despiste, era composta por uma curva com boa visibilidade, avistando-se a faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de, pelo menos, 50 m.

    2. O piso estava seco e era betuminoso, em bom estado e a faixa de rodagem tinha a largura de 8 m, existindo no eixo da via uma linha longitudinal descontínua a separar ambos os sentidos de trânsito.

    3. O BU circulava na Rua …, no sentido Vila do Monte  Abade do Neiva, a uma velocidade superior a 80 km/h e, após a curva, o seu condutor perdeu o controlo do veículo, invadindo a metade esquerda da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha e acabando por sair da mesma e embater nas árvores do terreno contíguo à via, do lado esquerdo, deixando um rasto de travagem em todo o trajecto pela hemifaixa de rodagem no sentido Abade do Neiva-Vilar do Monte.

    4. DD seguia no BU como passageira, tendo ficado encarcerada nesta viatura pelos membros inferiores, inconsciente, a respirar, sem pupila dilatada, mas contraída, com pulso e hemorragias.

    5. Foi socorrida no local do acidente pelos Bombeiros Voluntários de B…, os quais a desencarceraram e retiraram do BU cerca de 40 minutos depois, após o que a transportaram para o Hospital de B….

    6. Na sala de emergência apresentou-se assim: não abria os olhos, entubada, membros inferiores em extensão, após estímulo álgico esboçava flexão bilateral dos membros inferiores, O1VTM3, realizava movimentos espontâneos dos membros superiores, desvio conjugado do olhar para a esquerda e pupilas isocóricas, médias, não reactivas à luz.

    7. Na TAC crânio-encefálica identificaram-se focos de contusão bifrontais e pequena quantidade de sangue subaracnoideu frontal direito, cisternas da base patentes, sem desvios de linha média.

    8. Internada na UCIP após a colocação de sensor da PIC tipo Skullbolt para medidas de neurointensivismo, onde permaneceu até ao dia 26/04/2009.

    9. Por PICs alta e mantidas com edema cerebral, apesar de medidas de neurointensivismo, foi submetida a craniectomia descompressiva bilateral (frontoparietotemporal) e colocação de novo sensor da PIC em 15/04/2009.

    10. A DD foi sujeita a cirurgia e pós-operatório sem intercorrências, com PIC em valores dentro da normalidade, tendo-se iniciado levante da sedação em 21/04/2009.

    11. Foi realizada traqueostomia percutânea na UCIP em 25/04/2009.

    12. Submetida a duroplastia com Tissudura, implantação de drenagem ventricular externa (DVE) frontal esquerda e reposição dos retalhos ósseos com craniofix em 07/05/2009.

    13. Por ITU por Cândida parapsilosis (08/05/2009) cumpriu 5 dias de fluconazol e foi retirada DVE em 12/05/2009.

    14. Por ventriculomegalia tetraventricular foi submetida a trepanação parietal direita e implantado shunt ventrículo-peritoneal de baixa pressão em 29/05/2009.

    15. Por febre persistente fez estudo séptico em 20/05/2009 (sedimento urinário, hemoculturas, microbiológico LCR + urina + expectoração, Rx tórax), tendo sido isolado Staph aureus no microbiológico da expectoração, Klebsiella pneumoniae no microbiológico da urina e Hemoculturas e microbiológico da LCR negativos.

    16. Iniciou em 20/05/2009 antibioterapia (ATB) empírica com ciprofloxacina (5 dias) que foi ajustada para tobramicina e amoxacilia/ác, clav (12 dias), após resultados de isolamento dos agentes e respectivo antibiograma.

    17. A lesada teve fraca evolução neurológica, sofreu enfartes frontais bilaterais, sem hidrocefalia, sem outras complicações e foi colocada PEG em 09/06/2009.

    18. Apresentava hipersinal acentuado de ambos os frontais com sinais de contusões hemorrágicas a nível bifrontal e corona radiata de predomínio direito sequelares, hipersinal a nível do fornix e corpo caloso que se encontrava atrofiado, dilaceração tetraventricular, sulcus convexidae presente, cateter ventricular adequadamente colocado.

    19. Iniciou antibioterapia com Augmentin em 13 de Junho e depois foi introduzida Vancomicina a 19 de Junho atendendo ao antibiograma de material purulento pela ferida da PEG.

    20. Manteve alimentação entérica por PEG.

    21. Esteve medicada para além dos antibióticos com Motilium 2 id, Amantadina 100 mg id que deveria aumentar lentamente até 3 comprimidos por dia, Lioresal 25+15+15 dia, Enoxeparina 40 id sc, Dulcolax sup dias pares e Sene 2 comprimidos impares, Lactulose e Paracetamol SOS.

    22. A terapêutica do ambulatório foi de Baclofeno 25+15+15 mg, Enoxapanna 40 mg, SC, dia, Fenitoína, 100 mg, PO, 8/8 horas, Omeprazol, 20 mg, PO, dia, Furosemida, 20 mg, PO, dia, Paracetamol, 1000 mg, PO, SOS, Sene 2 cp, PO, dias ímpares, Dulcotax, 1 sup. Rectal, dias pares, Motilium, 1 cp, 878 horas, PO.

    23. A DD de 8 de Abril de 2009 a 13 de Junho de 2009 foi sujeita a penso diário ao estoma por drenagem purulenta, fez mitrison a 100 m/h, por vezes apresentando resíduo gástrico e durante o internamento fez numerosas infecções urinárias, assim como respiratórias.

    24. Foi transferida para o Hospital de S…, …, V…, onde deu entrada em 23 de Junho de 2009.

    25. Em Outubro de 2009, a sinistrada não apresentava melhorias significativas na recuperação clínica, tanto a nível neurológico como funcional, manteve quadro de desorientação no espaço e no tempo, não cumprindo ordens, respondendo no entanto por gemidos na presença da dor.

    26. Manteve espasticidade acentuada dos membros, encontrando-se acamada, necessitando de ajuda de terceiros para a realização das tarefas diárias e de cuidados diários de enfermagem, assim como de fisioterapia.

    27. Em 15 de Junho de 2009, a sinistrada mantinha hidrocefalia com...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
15 temas prácticos
9 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT