Acórdão nº 6101/15.3T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelEUG
Data da Resolução20 de Setembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I.

RELATÓRIO Joaquim intentou a presente ação declarativa, sob a forma comum, contra X – Companhia de Seguros SA., Pirotécnica M., Lda. e José, pedindo: a) a condenação da 1ª Ré no pagamento ao Autor da quantia global de 75.000,00 € (setenta e cinco mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, quantia acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde a citação e até integral pagamento; b) a condenação da 1ª Ré no pagamento ao Autor da quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação de sentença, a título de danos patrimoniais sofridos pelo Autor; c) a condenação da 1ª Ré nas custas processuais; d) caso o Tribunal entenda não dever ser condenada a 1ª Ré, serem a 2ª e o 3º Réus condenados, solidariamente, no pagamento ao Autor da quantia de 75.000,00 €, a título de danos não patrimoniais e bem assim da quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação de sentença a título de danos patrimoniais, assim como de juros de mora calculados desde a citação até integral pagamento.

Alega, para tanto, os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu por, no dia seguinte a uma festa, num ato de brincadeira entre amigos, ter procedido ao lançamento de fogo-de-artifício, fornecido pela 2ª Ré, que tinha ficado guardado, pelo fogueteiro, 3º Réu, na casa paroquial a que tinham acesso, o qual não tinha estoirado na noite anterior devido a uma anomalia no fogo e que a explosão se ficou a dever ao mau acondicionamento e guarda do referido fogo-de-artifício.

A 1ª Ré, Companhia de Seguros X, contestou defendendo-se por exceção, invocando, desde logo, a sua ilegitimidade, por em causa estar um seguro facultativo, em que não é admissível a ação direta contra a seguradora, e por impugnação, negando factualidade alegada pelo autor.

Contestaram a 2ª Ré, Pirotécnica M., Lda., e o 3º Réu, José, imputando a culpa na produção do acidente ao autor e impugnando as respetivas culpas e, consequentemente, a invocada obrigação de indemnizar.

A fls 88, foi proferido despacho saneador, relegando para final o conhecimento das exceções invocadas pela 1ª Ré, Companhia de Seguros X.

A fls 126 e segs, foi proferida sentença a: - Julgar admissível a demanda direta da Ré seguradora, para quem foi transferida a responsabilidade civil emergente dos danos causados a terceiro por sinistro decorrente da atividade de comércio de produtos pirotécnicos; - Julgar ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, a: “a) Condenar a Ré X - Companhia de Seguros S.A. a pagar ao autor Joaquim a quantia de 43.500,00 € (quarenta e três mil e quinhentos euros), já deduzida da quantia de € 500,00 de franquia, quantia devida a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros, contados desde a presente data e até efetivo pagamento; b) Condenar solidariamente os réus Pirotécnica M., Lda., e José, a pagar ao autor a quantia de 500,00 € (quinhentos euros), referente ao valor da franquia contratada no contrato de seguro celebrado com a 1ª Ré, acrescida de juros, contados desde a presente data e até efetivo pagamento.

  1. Relegar para liquidação de sentença, o montante devido a título de danos patrimoniais”.

Inconformada, a Ré X apresentou recurso de apelação para este Tribunal pedindo a modificação da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

Por Acórdão de fls 180 e segs, foi proferida a seguinte decisão: “Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em: - julgar improcedentes as conclusões da recorrente quanto à alteração da decisão da matéria de facto; - julgar a apelação procedente quanto à exceção dilatória da ilegitimidade passiva da 1ª Ré, X Companhia de Seguros, Sa e, em consequência, ao abrigo dos artigos 278º, nº1, al. d), 576º, nº2 e 577º, al. e), todos do CPC, em absolver tal Ré da instância, com a inerente abstenção de conhecimento do pedido contra ela deduzido e, em consequência, condenar, solidariamente, a 2ª Ré, Pirotécnica M., Lda, e o 3º Réu, José, a: - pagarem ao Autor a quantia de 44.000,00 € (quarenta e quatro mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a presente data até efectivo pagamento; - pagarem ao Autor o montante que vier a ser liquidado de danos patrimoniais”.

Inconformados, o Autor e os Réus Pirotecnia M., Lda e José interpuseram recurso de revista pedindo que seja concedido provimento ao recurso e, em consequência, se declare ter a co-Ré X legitimidade passiva, pedindo, ainda, estes últimos, a convolação das “contra-alegações” que apresentaram, ao recurso de apelação da Ré X, em recurso subordinado da sentença.

Por Douto Acórdão de fls 300 e segs, foi decidido: “a) Revogar o segmento decisório do acórdão recorrido que julgou procedente a exceção dilatória da ilegitimidade passiva da Ré X, Companhia de Seguros, SA, com a consequente absolvição da instância, declarando-se a mesma ré parte legítima; b) Revogar o segmento decisório do acórdão recorrida que julgou parcialmente procedente o pedido subsidiário do A., deduzido contra a 2ª R., Pirotécnia M., Lda, e o 3º R. , José, a ser apreciado, também a título subsidiário, em relação ao pedido principal, deduzido contra a Ré X, Sa.; c) Mandar baixar o processo ao Tribunal da Relação para, se possível pelos mesmos Senhores Desembargadores, conhecer das questões suscitadas pela R. X, Sa em sede de recurso de apelação, que a Relação considerou terem ficado prejudicadas pela decisão da ilegitimidade passiva da mesma ré seguradora”.

*Indicando como violados os artigos 483º, 493º e 570º, do Código Civil, formulou a Apelante X, quanto à parte que o Supremo Tribunal de Justiça ordenou seja apreciada, as seguintes CONCLUSÕES: “DA CULPA DO LESADO E DO EVENTUAL CONCURSO DE CULPAS 18. Com relevância para o que se analisará, cumpre ter presente os factos provados nºs 3, 12, 13, 14, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26.

19. No entendimento do Tribunal a quo, “Ao guardar o fogo num local onde os jovens se reuniam ficando na disponibilidade destes a chave de acesso à dependência onde estava guardado, revelou o Réu José clara imprudência. Os danos que vieram a ocorrer eram previsíveis, pois de acordo com as mais elementares regras da experiência comum, ao deixar o fogo entregue ao alcance dos jovens, a previsibilidade de ocorrência do dano era muito elevada, por elevada ser a probabilidade de uma atitude temerária e imprudente desta faixa de juventude.” 20. Ora, os “jovens”, todos maiores de idade, eram as pessoas responsáveis pela festa: celebraram e negociaram todos os contratos necessários à sua realização. O fogueteiro guardou o fogo sobrante em lugar seguro e fechado, cujo acesso estava limitado aos responsáveis pela festa, a quem este informou que o fogo teria de ser devolvido! 21. E o fogueteiro não pode, na sua actuação, ter de contar com actos “temerários”, irresponsáveis e irreflectidos de jovens que são os responsáveis pela organização da festa, que são responsáveis pela guarda de inúmeros objectos e que, ainda por cima, foram avisados do local onde havia sido guardado o fogo e do porquê da sua não deflagração.

22. O sinistro não ocorreu porque o fogueteiro deixou o fogo ao alcance dos jovens.

O sinistro ocorreu porque o sinistrado, pessoa adulta e responsável pela festa e pela guarda dos objectos, num acto de absoluta irresponsabilidade, tomou a decisão (mesmo contrariado pelos jovens colegas/amigos da mesma idade) de, sem credencial ou qualquer conhecimento da arte, queimar fogo de artifício (que por acaso tinha defeito mas que poderia nem ter)! 23. O único responsável pelo sinistro dos autos é o próprio lesado! E essa culpa do lesado exclui/afasta a responsabilidade objectiva dos demandados, nos termos do disposto no nº 2 do art. 570º do CPC.

24. O fogo não apareceu, do nada, no jardim de um adolescente de 13 anos! O sinistrado, maior de idade, resolveu abrir o local da guarda do fogo e acendê-lo, sem mais, bem sabendo da perigosidade da sua actuação! Tomou essa decisão de forma consciente, assumindo o risco e conformando-se com o eventual resultado.

25. A culpa é exclusiva do lesado, motivo pelo qual tem a demandada de ser absolvida do pedido.

SUBSIDIARIAMENTE, DO CONCURSO DA CULPA DO LESADO E DA SUA MEDIDA 26. Caso venha a entender-se que a culpa do sinistro não é exclusiva do lesado e que o comportamento do fogueteiro pode ser considerado culposo, concorrendo a sua culpa com a do sinistrado, sempre a medida dessa concorrência há-de ser muito distinta da fixada em primeira instância.

27. Isto é, caso venha a considerar-se que não foi suficiente o fogueteiro guardar o fogo a devolver na casa paroquial, a que apenas tinham acesso os responsáveis pela festa, todos maiores de idade, sempre a sua culpa há-de ser manifestamente inferior à do autor que, voluntaria e conscientemente, se expôs a uma gravíssima situação de perigo.

28. Crê a recorrente que o grau de culpa do demandante ascenderá, sempre, a valor superior a 70% e o grau de culpa dos demandos a valor igual ou inferior a 30%.

29. Assim sendo, caso venha a considerar-se que a culpa não é exclusiva do lesado, sempre o valor da condenação haverá de ser reduzido a 30% ou menos do valor total dos danos sofridos.

DA EXCLUSÃO CONTRATUAL 30. No art. 3º das condições especiais do contrato dos autos (já juntas) estão excluídos “os danos causados (…) aos membros das Comissões de Festas e outras pessoas trabalhando directa ou indirectamente para as festas.” 31. A sentença em crise justificou a não aplicação da referida cláusula por, alegadamente, a cobertura em apreço nestes autos ser a de “responsabilidade civil decorrente da exploração” e não, concretamente, a “responsabilidade civil emergente da actividade de lançamento de fogo de artifício, foguetes e morteiros”.

32. Ora, com o devido respeito, tal fundamentação só pode resultar de erro na análise/leitura do contrato dos autos. O contrato dos autos é o de...

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