Acórdão nº 831/15.7YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA Terapie-System AG e BB - Produtos Farmacêuticos, SA requereram arbitragem necessária, ao abrigo da Lei n.º 62/2011, de 11 de dezembro, contra CC Farmacêutica, SA tendo por objeto o exercício dos direitos que, nos termos do artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial, lhes assistem e emergem da Patente Europeia 104709B1 e da Patente Europeia n.º 2292219B1 (doravante designada EP 219), relativamente a medicamentos genéricos, designadamente os indicados na base de dados da Infomed constante da página eletrónica da Infarmed - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP (Infarmed) relativos às AIM's concedidas a 9 de outubro de 2013 a Rivastigmina Generis, sistema transdérmico,4,6mg/24 h e Rivastigmina Generis, sistema transdérmico,9,5mg/24h.

  1. Foi constituído tribunal arbitral composto por 3 árbitros de acordo com o disposto nos artigos 8.º/2 e 10.º/3 da Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro, Lei da Arbitragem Voluntária, doravante LAV, tendo as requerentes e requerida indicado, cada uma, o respetivo árbitro e estes, por acordo, o árbitro presidente.

  2. No despacho saneador de 28-7-2014 (ver fls. 1425) julgou-se, com voto de vencido do árbitro da demandada, o Tribunal Arbitral (TA) incompetente para conhecer e decidir as exceções deduzidas pela demandada no tocante à invalidade da EP 219 e rejeitou-se o pedido de suspensão da instância até julgamento dessa invalidade por outro tribunal enquanto questão prejudicial e rejeitou-se que se aguardasse decisão sobre as oposições à concessão da patente EP 219 pendentes perante o Instituto Europeu de Patentes.

  3. A demandada interpôs recurso de apelação (ver fls. 1650 e segs do Vol. IV) para o Tribunal da Relação das decisões referidas em 3 supra, recurso que não foi admitido por este Tribunal no âmbito de reclamação deduzida (ver fls. 1886/1893 do Vol.5) por se ter considerado que, não sendo admissível o recurso como recurso autónomo, seria impugnável diferidamente no âmbito do recurso a interpor da decisão final da ação arbitral, pois o tribunal arbitral não afirmou a sua competência mas declarou-se incompetente para conhecer a exceção perentória de nulidade da patente.

  4. A demandada veio no dia 2-9-2014 (fls. 1492 dos autos, Vol. IV) tendo em vista o disposto no artigo 13.º/2 da LAV solicitar ao co-árbitro designado pelas demandantes a lista das arbitragens em que intervinha ou tivesse intervindo, como árbitro ou noutra qualidade em que figure como parte qualquer das partes no presente processo, designadamente as demandantes ou sociedades com estas coligadas, em relação de domínio ou de grupo, nos últimos 3 anos ou em que interviesse ou tivesse intervindo, como árbitro ou noutra qualidade, nomeado por parte representada pela demandante ou por sócios ou advogados que com esta colaborassem nos últimos 3 anos (fls. 1493 a 1499).

  5. No dia 16-9-2014 (ver fls. 1763 do Vol. 5) a demandada, alegando ter sido notificada no dia 11-9-2014 dos esclarecimentos prestados pelo árbitro designado pela demandante e considerando que estava pendente o prazo para dedução do processo de recusa do árbitro (artigo 14.º/2 da LAV), informou que iria no dia 19-9-2014 apresentar pedido de recusa de árbitro e requerer a final a sua destituição - o que sucedeu conforme fls. 1796 e segs - e declarou que se lhe afigurava fortemente desaconselhável manter as datas agendadas e iniciar o julgamento da causa antes de ponderar e decidir o incidente de recusa.

  6. Na pendência do pedido que a demandada deduziu junto do Tribunal da Relação, pedido contraditado em 28-1-2015 pelas demandantes conforme fls. 3775/3829 do Vol. 8, tendo em vista obter decisão que revogasse a decisão do tribunal arbitral que rejeitou a recusa do árbitro designado pela demandante (artigo 14.º/3 da LAV; ver decisão do TA de 6-10-2014 de fls. 3610/3633 do Vol. 8) procedeu-se à audiência de julgamento (ver Vol. 6) e foi lavrado no dia 11-2-2015 acórdão pelo tribunal arbitral (ver fls. 3068 a 3125 do Vol. 7) com voto de vencido do árbitro indicado pela demandada, decidindo-se, por maioria, condenar-se a demandada em parte dos pedidos, designadamente o de se abster de comercializar em território português os identificados medicamentos genéricos, retirando-os do mercado e ainda no pagamento de sanção pecuniária compulsória e indemnização, tudo nos termos constantes da decisão lavrada a fls. 3124 /3125.

  7. Do acórdão arbitral foi interposto pela demandada em 16-3-2015 (ver fls. 3150/3324 do Vol. 7) recurso para o Tribunal da Relação pedindo (a) que o acórdão final seja anulado nos termos dos artigos 9.º/3, 13.º/1, 14.º/2 e 46.º/3, alínea iv) da LAV por falta independência e imparcialidade do referenciado árbitro; subsidiariamente (b) que o acórdão seja anulado nos termos do artigo 46.º/3, alínea a), subalínea ii) da LAV por violação do artigo 30.º/1 da LAV e dos artigos 209.º/2 e 20.º/4 da Constituição da República Portuguesa, devendo, em consequência, o processo baixar ao Tribunal Arbitral para apreciação da exceção perentória de invalidade da patente, para reformulação do guião da prova, para repetição da audiência de discussão e para prolação de novo acórdão final; subsidiariamente (c), que o acórdão final seja anulado, nos termos do artigo 46.º/3, alínea a), subalínea v), 3ª parte, da LAV e do artigo 615.º/1, alínea d) in fine do CPC por não se ter pronunciado sobre questões que devia apreciar; subsidiariamente (d) que o acórdão final seja anulado, nos termos do artigo 662.º/2, alínea c) in fine e n.º 3, alínea c) do CPC; em consequência, deve o processo baixar ao Tribunal Arbitral para ampliação da matéria de facto, modificação do acórdão saneador, realização de novo julgamento e, em conformidade, prolação de novo acórdão final; subsidiariamente (e), deve a decisão sobre a matéria de facto e de direito ser alterada no sentido indicado no presente recurso, e parcialmente anulado, nos termos do artigo 46.º/3, alínea a), subalínea ii), 30.º/1 da LAV por violar os princípios da igualdade das partes e do contraditório, através da admissão, como meio de prova, do relatório pericial produzido noutra ação arbitral; (f) devem ser indeferidos todos os pedidos das demandantes aqui recorridas; (g) cumulativamente devem as recorridas ser condenadas a suportar todos os custos e encargos decorrentes da presente ação arbitral, e ainda reembolsar a recorrente das provisões por honorários dos árbitros e secretário e despesas administrativas, pagas pelas demandantes em seu nome ou em suprimento da sua falta pela demandada, bem como os honorários dos mandatários da recorrente e outras despesas que estas tenham tido com o processo, nos termos do n.º1 e 2 do artigo 533.º do CPC.

  8. O Tribunal da Relação de Lisboa lavrou no dia 24-3-2015 acórdão incidente sobre o pedido que a demandada suscitou junto desse Tribunal no sentido de se revogar a decisão do TA que rejeitou a recusa do árbitro designado pelas demandantes; tal acórdão foi posterior à sentença arbitral de 11-2-2015.

  9. O acórdão da Relação de Lisboa de 24-3-2015 (ver fls. 3904/3937) revogou a deliberação arbitral de 6-10-2014 considerando que, no caso em apreciação, e face aos elementos que constam dos autos, existem fundadas dúvidas sobre a independência e imparcialidade do árbitro nomeado pelas demandantes, ora requeridas, e julgou, assim sendo, procedente o incidente de recusa do referido árbitro suscitado pela demandada CC Farmacêutica, SA.

  10. Desse acórdão foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, admitido com efeito suspensivo, que não foi objeto de conhecimento conforme acórdão do TC de 9-7-2015.

  11. No dia 18-9-2015, transitada a decisão de recusa do árbitro designado pelas demandantes, a demandada CC requereu (ver fls. 3952/3954 do Vol. 10) no Tribunal da Relação que, "esgotado o poder jurisdicional do Tribunal Arbitral nos termos do artigo 44.º da LAV, deve ser dada também procedência imediata nos presentes autos ao pedido do recurso (cf. o capítulo 2,1, das alegações), anulando o Acórdão Arbitral nos termos dos artigos 9.º/3, 13.º/1, 14.º/2, 46.º/3, alínea iv) e 5.º/3 da LAV".

  12. O Tribunal da Relação de Lisboa por acórdão em conferência de 9-6-2016 (fls. 4327/4338 do Vol. 11) confirmou a decisão sumária do relator que decidiu dar sem efeito o acórdão arbitral proferido nos autos, devendo encerrar-se o processo arbitral.

  13. Deste acórdão interpuseram as demandantes recurso com fundamento no disposto no artigo 644.º/1, alínea a) - decisão proferida em 1ª instância que ponha termo à causa ou incidente processado autonomamente - recurso que foi admitido como revista, considerando-se que está aqui em causa uma questão de competência, saber se o tribunal arbitral deixou de ser in totum competente, impondo-se, por isso, a constituição de um novo tribunal arbitral e não a substituição por outro árbitro daquele que tem de cessar funções por fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência.

  14. Sustentam as recorrentes, nas conclusões da minuta de recurso, que a pretensão formulada a título principal - anulação do acórdão do tribunal arbitral por falta de independência e imparcialidade do árbitro - não cabe no âmbito estrito de um recurso, antes se compaginando com a pretensão típica de uma ação de anulação do tipo previsto no artigo 46.º da LAV. O objeto da peça processual, tal como proposta e configurada pela recorrida em função da causa de pedir e do consequente pedido, é a própria decisão arbitral, sendo evidente que com ela a CC pretende desencadear os efeitos cassatórios típicos da ação de anulação, não sendo, pois, de admitir a posição que sustente que esta ação de anulação possa integrar um presumível recurso.

  15. O pedido de anulação previsto no artigo 46.º da LAV é uma ação que segue a forma de processo especial, dirigida e apresentada no Tribunal da Relação ou no TC Administrativo, que conhece do processo em 1ª instância; trata-se de uma ação nova pelo que é de seguir as regras do processo comum de...

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