Acórdão nº 273/16 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | Cons. Fernando Vaz Ventura |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2016 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 273/2016
Processo n.º 165/15
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Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
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Relatório
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No âmbito de processo criminal em curso no Tribunal Judicial de Cascais, em que são arguidos A. e B., o Ministério Público deduziu acusação por factos ocorridos em 10 de janeiro de 2009, imputando ao primeiro a prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelo artigo 181.º e 184.º, com referência do artigo 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, com referência ao artigo 143.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal, e de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea c), com referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea l), do Código Penal, e ao segundo a prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal e de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, com referência aos artigos 143.º, n.º 1 e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas e) e m), também do Código Penal. Por seu turno, A., na qualidade de assistente e parte civil, deduziu acusação particular, imputando a B. a prática de crime de injúria agravada e de ofensa à integridade física qualificada, e formulou pedido de indemnização civil. O Ministério Público acompanhou a acusação particular no que respeita à factualidade constante da acusação pública, dela divergindo apenas quanto ao preenchimento de circunstância agravante do crime de injúria.
O arguido B. requereu a abertura de instrução, a qual culminou com a prolação em 8 de novembro de 2012 de despacho de pronúncia quanto a ambos os arguidos, pelos factos e crimes imputados na acusação deduzida pelo Ministério Público, para cujo teor se remeteu.
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Remetida pelo Tribunal Judicial de Cascais certidão do despacho de pronúncia à Polícia de Segurança Pública (doravante PSP), e junta esta ao processo disciplinar instaurado contra B., em 2 de julho de 2013 foi lavrada a seguinte “proposta”:
(...) 3. Os crimes pelos quais o arguido se encontra acusado, são ambos punidos com pena de prisão, cujos máximos variam entre 6 meses e 4 anos, respetivamente. Tais factos, pelos quais o arguido está indiciado, consubstanciam uma falta grave, punível com uma das penas previstas nas alíneas e) e seguintes do n.º 1 do artigo 25.º do RDPSP.
4. Ora, o facto de já ter sido proferido despacho de pronúncia, com marcação de audiência [de] julgamento para o dia 07 de outubro de 2013, determina, nos termos do disposto no art.º 38.º, n.º 1, do RD/PSP, aprovado pela Lei n.º 07/90, de 20 de fevereiro, a suspensão do arguido do exercício de funções, que se manterá até à decisão final condenatória.
5. Também, por haver inconveniente na manutenção ao serviço do arguido e, face à gravidade dos factos pelos quais foi acusado, proponho a V.Exa. o seguinte:
a) Que ao Chefe M/145756 – B., seja aplicada a medida cautelar de suspensão preventiva do exercício de funções, nos termos do n.º 1 do artigo 38.º do ED/PSP, aprovado pela Lei n.º 7/90 de 20FEV, atendendo que as faltas indiciadas se enquadram nas disposições do artigo 47.º, a que correspondem uma das penas previstas nas alíneas f) e g), n.º 1, do art.º 25.º, ambos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 7/90 de 20 de fevereiro.
b) que, nos termos do artigo 74.º, n.ºs 1, alínea a), n.º 2 e n.º 3, do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 7/90 de 20 de fevereiro, ordene o desarmamento do Chefe M/145756 – B.. (...)
Nessa sequência, o Diretor Nacional da PSP proferiu em 11 de julho de 2013, no mesmo processo disciplinar, o seguinte despacho:
1 - Concordo com a proposta do Comando Metropolitano de Polícia de Lisboa.
2 - Assim, nos termos do n.º 1 do artigo 38.º do RD/PSP, determino a suspensão de funções do Chefe M/145756, B., do CM de Lisboa, que se manterá até à decisão final absolutória, ainda que não transitada em julgado, ou até à decisão final condenatória (artigo 38.º, n.º 1, do ED/PSP, aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro), devendo o Chefe fazer a sua apresentação no dia imediato a qualquer das decisões, sem necessidade de notificação para o efeito.
3 – Nos termos do n.º 1, alínea a), do artigo 74.º do RD/PSP, determino também o desarmamento do Chefe, que se deverá manter até decisão do processo disciplinar.
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Em 29 de novembro de 2013, B. interpôs contra o Ministério da Administração Interna ação administrativa especial, pedindo que seja anulado o despacho proferido pelo Diretor Nacional da PSP em 11 de julho de 2013, com fundamento em vício de violação de lei.
Por acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 10 de dezembro de 2014, foi recusada a aplicação da norma constante do artigo 38.º, n.º 1, do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (doravante abreviadamente referido como RDPSP), aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro, com fundamento em inconstitucionalidade, considerando violados os seguintes princípios com assento constitucional:
I-1) Da presunção de inocência, previsto no artigo 32-2, CRP, aplicável ao processo disciplinar do Autor, segundo o qual «todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa»;
a) na medida em que consubstancia uma sanção de tipo suspensão e perda de 1/6 do vencimento, representando a imposição de um ónus e restrição de direitos ao arguido que representam uma antecipação de condenação; e
b) na medida em que o artigo 38-1, do ED/PSP/90, penaliza os arguidos que exerçam o direito de defesa, mediante um pedido de abertura de instrução, expondo-os aos efeitos de um despacho de pronúncia a cujos efeitos nunca ficariam sujeitos se não exercessem esse direito de defesa, por não poder haver despacho de pronúncia sem pedido de instrução.
2) – Da igualdade, previsto no artigo 13-1-2, da CRP, aplicável ao processo disciplinar do A., segundo o qual «1 – Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de condição social (…)» em conjugação com o artigo 18-2, CRP, segundo o qual, «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário (…)»:
a) na medida em que, a partir da vigência do ED/FP/2008, o artigo 38-1, do ED/PSP/90, trata o agente policial de modo diverso dos agentes da função pública; isto no entendimento e pressuposto de que, anteriormente o ED/FP/84, tal como o artigo 38-1, do ED/PSP/90, considerava a situação como igual e tratava todos por igual; e
b) na medida em que, o artigo 38-1, do EP/PSP/90, trata de maneira diversa os arguidos que exerçam o direito de defesa, mediante um pedido de abertura de instrução, expondo-os aos efeitos de um despacho de pronúncia, dos que não pedindo abertura de instrução nunca ficam sujeitos a tais efeitos por não poder haver pronúncia sem pedido de abertura [de] instrução.
3) – Da proporcionalidade, aflorado no artigo 18-2, da CRP, aplicável ao processo disciplinar do A. segundo o qual, «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário (para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos)», que se reputa como componente essencial do princípio do Estado de direito democrático, previsto no artigo 2.º da mesma CRP; e designadamente no segmento que respeita ao princípio da necessidade, na medida em que se pode obter o mesmo resultado do artigo 38, em questão, mediante a aplicação do artigo 74, do ED/PSP/90 (cujo equivalente do ED/FD/2008 se encontra no seu artigo 45; e, no ED/FP/84, no artigo 54), evitando toda a sorte de limitações, constrangimentos e prejuízos para os direitos individuais dos cidadãos agentes policiais arguidos.»
4. É desta decisão que vem interposto o presente recurso, apresentado pelo Ministério Público ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (doravante LTC), através de requerimento com o seguinte teor:
2 – O douto acórdão de 10/12/2014, em apreço, recusou a aplicação da norma constante do nº. 1 do artigo 38.º do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n º. 7/90, de 20 de fevereiro, considerando que a norma em causa é ilegal, por ofender os seguintes princípios constitucionais:
- Da presunção de inocência, previsto no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
- Da igualdade, previsto no artigo 13.º, nº. 1 e 2, conjugado com o artigo 18.º, n.º 2, ambos da CRP.
- Da proporcionalidade, previsto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP.
3 – Pretende-se assim ver apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do nº. 1, do artigo 38.º do Regulamento Disciplinar da PSP, aprovado pela Lei nº. 7/90, de 20/02, a qual preceitua que “O despacho de pronúncia ou equivalente com trânsito em julgado em processo penal por infração a que corresponda pena de prisão superior a três anos determina a suspensão de funções e a perda de um sexto do vencimento base até à decisão final absolutória, ainda que não transitada em julgado, ou até à decisão final condenatória”.
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Admitido o recurso pelo tribunal a quo e notificadas as partes para apresentarem alegações, apenas o recorrente o veio fazer, pugnando pela improcedência do recurso e concluindo nestes termos:
1.ª) Vem interposto recurso, pelo Ministério Público, para si obrigatório, nos termos do disposto nos arts. 70.º, n.º 1, al. a), 72.º, n.º 1, al. a), e n.º 3 e 75.º-A, da LOFPTC, “do douto Acórdão de...
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