Acórdão nº 413/09 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Vítor Gomes
Data da Resolução30 de Julho de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 413/09

Processo n.º 946/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. A., arguido no processo que lhe move o Ministério Público e o assistente B., interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b), g) e i) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), nos seguintes termos:

    “[ … ]

    1. Violação de Caso Julgado Constitucional – alínea i) do n.º 1 do artigo 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe é dada pela Lei 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro.

  2. O douto acórdão proferido nestes autos, pelo Tribunal Constitucional, em 26 de Janeiro de 2005, decidiu:

    “b) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 32º, nº1, da Constituição, e do artigo 29º, nº 1, conjugado com o artigo 205º, nº1 da Constituição, a norma do artigo 374º, nº 2 do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de permitir ao tribunal de recurso considerar não provados factos que foram considerados irrelevantes pela primeira instância e por isso não apreciados, relativos à exclusão da responsabilidade, nos termos do artigo 180º, nº 2 do Código Penal;

    1. Revogar a decisão recorrida que deverá ser reformulada de acordo com o presente juízo de inconstitucionalidade.” (sublinhado nosso)

  3. Isto porque a sentença de primeira instância ali referida, havia considerado “irrelevante a demais prova produzida em audiência – traduzida em numerosos depoimentos acerca das características de ambos os terrenos, dos interesses subjacentes ao negócio e vantagens de cada um, bem como das diversas atitudes discriminatórias assumidas pelo assistente, enquanto Presidente da Câmara de Vagos, por se julgar não poder constituir objecto do presente processo avaliar e decretar a idoneidade e isenção (ou o inverso) do mandato exercido pelo assistente”

    Ou seja,

  4. De forma explícita, o mencionado acórdão do Tribunal Constitucional ordenou que o Tribunal da Relação de Coimbra reformulasse o acórdão então recorrido, apreciando os factos “relativos à exclusão da responsabilidade, nos termos do artigo 180º, nº2, do Código Penal”

  5. O que significa que, aquele acórdão do Tribunal Constitucional, apenas cometeu, ao Tribunal da Relação de Coimbra, a tarefa de apurar se, relativamente àqueles factos com base nos quais condenara o arguido, se verificava, ou não, “exceptio veritatis”

  6. Manifestamente com o objectivo de salvaguardar o princípio da dupla jurisdição em matéria de facto, o Tribunal da Relação de Coimbra decidiu abster-se de apreciar a prova produzida e gravada na Primeira Instância, por esta considerada irrelevante, e mandou baixar os autos ao Tribunal de Comarca para que julgasse em conformidade com o ordenado pelo Venerando Tribunal Constitucional.

  7. Por obediência ao caso julgado constitucional, o novo julgamento só poderia ter como objectivo e como limite a indagação de factos que pudessem configurar “exceptio veritatis” relativamente àqueles outros que, nos termos do primeiro acórdão da Relação, integravam o crime de difamação e pelos quais condenou o arguido.

  8. E não relativamente a quaisquer outros conteúdos do texto do arguido a que o Tribunal da Relação (e antes dele o Tribunal de Comarca e o despacho de pronúncia) não havia atribuído relevância penal, ainda que fazendo parte do referido texto.

    Assim,

  9. Tendo o Tribunal da Relação no seu primeiro acórdão, julgado que preenchiam o tipo legal de crime de difamação as imputações das alíneas E), F) e G) dos factos ali dados como provados, só relativamente a estes factos cumpria indagar os susceptíveis de preencherem “exceptio veritatis”

  10. Sob pena de violação do acórdão do Tribunal Constitucional precedente.

    Porém,

  11. Ignorando os limites que lhe impunha o caso julgado constitucional – e também o primeiro acórdão da Relação que definira quais os excertos difamatórios do texto do arguido – o Juiz de Primeira Instância, em vez de se limitar a apreciar factos susceptíveis de integrarem “exceptio veritatis” relativamente àqueles que a Relação julgara difamatórios, voltou a apreciar todas as questões de facto suscitadas nos autos, mesmo as já definitivamente decididas.

  12. E acabou por condenar o arguido com base noutro excerto do seu texto, mais concretamente, na suposta imputação, sob a forma de suspeita, de que o ofendido teria decidido que a Câmara Municipal adquirisse um terreno, em detrimento de outro, para beneficiar um amigo seu que, com o negócio, obteria vantagem patrimonial.

  13. Sendo certo que tal imputação não constava dos factos que o Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão antecedente, julgara difamatórios.

  14. O que significa que o acórdão recorrido faz a aplicação das normas dos artigos 180º n.º 2 do Código Penal e 374º, nº 2 do Código de Processo Penal em desconformidade com o anteriormente decidido, sobre a questão, pelo Tribunal Constitucional.

  15. Na medida em que o Tribunal recorrido entendeu poder reformular o seu acórdão anterior excedendo manifestamente os limites estabelecidos para essa reformulação pelo acórdão do Venerando Tribunal Constitucional precedente, o que constitui manifesta violação do Caso Julgado Constitucional.

    1. Aplicação de norma já anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional – alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe é dada pela Lei 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro.

  16. O douto Tribunal da Relação de Coimbra, sustentando-se no princípio da imediação da prova, absteve-se de apreciar as questões suscitadas no recurso penal pelo arguido quanto à matéria de facto dada como provada, limitando-se a acolher de forma acrítica a decisão da 1ª Instância.

  17. O que importa, a inconstitucionalidade da norma do artigo 428º do Código de Processo Penal na citada interpretação que lhe é dada por este Tribunal da Relação, por ofensa ao disposto nos artigos 32º n.º 1 e 20º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

  18. Neste sentido se pronunciou o Tribunal Constitucional no seu douto Acórdão de 16.02.2007, proferido no processo 522/2006.

  19. Pelo que o acórdão recorrido faz a aplicação da norma do artigo 428º do Código de Processo Penal com a interpretação que determinou que tal norma tenha sido julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.

    1. Constitucionalidade das normas aplicadas e a seguir identificadas, na interpretação que lhes é dada pelo acórdão recorrido, suscitada durante o processo – alínea b), do n.º 1 do artigo 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe é dada pela Lei 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro.

    Assim,

    I – Inconstitucionalidade da norma do artigo 80º, nº2 da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe é dada pela Lei 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro, por violação das normas dos artigos 32º, nº 1, 205º, nº 1, 209º, nº 1 e 221º da Constituição da República Portuguesa.

  20. Na interpretação que lhe dão a segunda sentença proferida nestes autos pela Primeira Instância, e o acórdão da Relação que a confirma, agora recorrido, a norma do citado artigo 80º, n.º 2 tem de ser considerada inconstitucional.

    Na verdade,

  21. Interpretada no sentido de que o Tribunal Recorrido não estava obrigado a respeitar os limites definidos pelo acórdão anteriormente proferido nestes autos, pelo Tribunal Constitucional, a citada norma é inconstitucional, inconstitucionalidade que decorre da violação das normas dos artigos 32º, nº 1, 205º, nº 1, 209º, nº 1 e 221º da Constituição da República Portuguesa.

  22. Na medida em que o Tribunal recorrido entendeu poder reformular o seu acórdão anterior excedendo manifestamente os limites estabelecidos para essa reformulação pelo anterior acórdão do Venerando Tribunal Constitucional.

  23. Esta questão de constitucionalidade já foi suscitada, pelo ora recorrente, nas suas alegações de recurso, para o Tribunal da Relação, páginas 33 a 35 dessas alegações e conclusões números 1 a 5.

    II – Inconstitucionalidade das normas do artigos 358º, 379º, nº 1, alínea c), segunda parte e 431º do Código de Processo Penal na interpretação do acórdão recorrido, por violação do artigo 32º, nº 1 da Constituição de República Portuguesa.

  24. Como se disse, a última sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Judicial de Vagos e o acórdão recorrido, que a confirma, condenaram o arguido por um excerto do seu texto que o despacho de pronúncia não considera difamatório.

  25. Esquecendo, aliás, como também já se referiu, que o precedente acórdão do Tribunal Constitucional apenas determinara o apuramento de factos susceptíveis de excluírem a responsabilidade do arguido, nos termos do artigo 180º, nº 2 do Código Penal, com referencia àqueles factos pelos quais o arguido fora condenado na Relação de Coimbra.

    Assim,

  26. Na interpretação que lhes dão a segunda sentença de Primeira Instância e o acórdão da Relação de Coimbra que a confirma, as normas dos artigos 358º, 379º, nº1, alínea c), segunda parte e 431º do Código de Processo Penal, têm de ser consideradas inconstitucionais, por violação do disposto no artigo 32º, nº1 da Constituição da República Portuguesa.

  27. Na medida em que, com violação do caso julgado, o Tribunal de Primeira Instância alargou ilegal e inesperadamente o espectro da matéria de facto sobre a qual fez incidir a sua indagação,

  28. E, desse modo, ofendeu gravemente as garantias constitucionais de defesa do arguido.

    De resto,

  29. As referidas decisões nem sequer relevaram que a condenação do arguido por um excerto do seu texto que o despacho de pronúncia não considera difamatório sempre constituirá uma alteração não substancial dos factos que lhe eram imputados.

  30. O que também é limitativo das garantias constitucionais de defesa do arguido.

  31. Esta questão de constitucionalidade foi igualmente suscitada, pelo ora recorrente, nas alegações de recurso atrás citadas, páginas 35 a 38, conclusões números 6 a 19.

    III Constitucionalidade...

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