Acórdão nº 5262/05.4TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Julho de 2009

Data02 Julho 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Nas Varas Cíveis de Lisboa, com distribuição à 15.ª, AA intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra: BB - Companhia de Seguros de Crédito, S.A.

Alegou, em síntese, que: É empresário no sector do área do vestuário e mantém inúmeros contactos, nacionais e estrangeiros, com empresas e profissionais do sector têxtil e vestuário, bem como de sectores conexos; A ré veiculou - nos termos que precisa - a informação de que o seu crédito se encontrava cancelado uma vez que o seu nome se encontrava associado a riscos e incidentes de crédito, mais concretamente a incumprimento de pagamento; Tal informação não corresponde à verdade e atingiu-o no seu bom nome e reputação, causando-lhe ainda os prejuízos, na sua actividade, que detalhadamente descreve.

Pediu, em conformidade: A condenação desta a pagar-lhe: €20.000 a título de danos não patrimoniais; €2.783,02 a título de danos patrimoniais presentes e ainda danos patrimoniais futuros, relacionados com os honorários a suportar com a prossecução da presente acção, a liquidar em execução de sentença, valores acrescidos de juros, à taxa legal, a contar da data da data da citação.

Mais requereu a condenação da Ré a informar, por escrito, os seus segurados do teor essencial da sentença condenatória, por súmula; a comunicar a todas as seguradoras do grupo Euler Hermes S.A., o teor essencial da sentença condenatória, por súmula, acompanhada de tradução da mesma nas línguas inglesa e francesa, a expensas da Ré e a comprovar junto do tribunal ter procedido à divulgação da informação aos segurados e ao envio da comunicação às seguradoras do grupo Euler Hermes S.A..

Contestou a BB, impugnando grande parte dos factos carreados na petição inicial e sustentando, em resumo, que: Uma segurada sua comunicou-lhe uma alegada dívida do agora autor; Ela, ré, instou-o a pagar, o que ele não fez.

Desencadeou, então, o processo normal - que pormenoriza - não tendo, no entanto, provocado os danos que este invoca.

II - A acção prosseguiu a sua tramitação e, na altura própria, foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: "Pelo exposto, e ao abrigo das citadas disposições legais, julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e, consequentemente, condeno a Ré a pagar ao Autor a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros) acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a data da citação e até integral pagamento.

Mais a condeno a informar, por escrito, os seus segurados EE Tecidos e DD do teor da presente decisão." III - Apelaram ambas as partes (o autor subordinadamente) e o Tribunal da Relação de Lisboa: Julgou procedente o recurso principal, absolvendo a ré do pedido; Julgou, consequentemente, improcedente o recurso subordinado.

IV - Inconformado, traz o autor revista.

Conclui as alegações do seguinte modo:

  1. A questão de direito subjacente ao presente recurso de revista, circunscreve-se à qualificação da actuação da R. como lícita, como propugna o TRL ou ilícita, como defendeu o M.mo Juiz da 1.ª Instância.

  2. Secundariamente, na decorrência da qualificação da conduta como ilícita, surge a questão do valor da indemnização atribuída ao A. na decisão de 1.ª instância, erradamente revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. Por forma a facilitar a interpretação das normas jurídicas pertinentes importa recordar o essencial da matéria de facto (sem prejuízo, dos restantes factos para os quais se remete): - O A. é empresário no sector da área do vestuário há cerca de 18 anos. - O A. é uma pessoa com credibilidade e boa reputação junto de clientes e fornecedores.

    - O A. foi informado pelo vendedor que o seu crédito junto da EE se encontrava cancelado.

    - Tal informação foi transmitida ao A. perante a estilista que o acompanhava.

    - Após insistência do A., o vendedor informou o A. que tinha sido a R. que tinha transmitido tal informação.

    - o A. foi informado pelo vendedor que o seu crédito junto da EE se encontrava cancelado.

    - (A) empregada de escritório do A. contactou a R., a qual não prestou de imediato qualquer informação.

    - No contacto com a sua fornecedora DD, o A. voltou a ser informado que o seu crédito estava cortado, pelo que teria que efectuar os pagamentos a pronto.

    - O A. passou a pagar mais frequentemente a pronto.

    - O A. contactou outros fornecedores a fim de esclarecer a informação que sobre si circulava concretamente para saber se fora passada a mais fornecedores e o porquê de tal informação.

    - O facto de não saber a quem tinha sido concretamente prestada, designadamente por a R. não ter esclarecido prontamente tal questão, causou ao A. vergonha, desconforto e irritação.

    - O facto de o crédito do A. estar cancelado foi conhecido pelas empresas EE Tecidos e DD bem como o sistema informático da R. emite um alerta, a fim de se proceder a anulação de todas as garantias.

    - Anteriormente a 2004 ao A. era permitido que o pagamento das mercadorias por si adquiridas fosse efectuado no prazo de 30, 60 e 90 dias.

  4. O Tribunal de 1.ª Instância, considerando preenchidos todos os pressupostos do art.º 383° e 384° do Código Civil, numa decisão bem estruturada e fundamentada, condenou a R., BB - Companhia de Seguros de Crédito, a: a) pagar ao A. uma indemnização no valor de 50000€ (cinco mil euros), acrescida de juros; b) informar os segurados que identifica do teor da decisão condenatória.

  5. Já o Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão de que ora se recorre, veio surpreendentemente dizer não encontrar na "factualidade fundamento bastante para assacar à R. a violação ilícita de algum direito do A. ou a violação de alguma norma destinada a proteger os seus interesses".

  6. Enquanto em 1.ª Instância se refere a i1icitude da conduta, entre outros: "(...) se é certo que a Ré veio a repor as garantias que relativamente a todos os clientes, no que se referia ao A., a verdade é que o fez logo que recebeu a comunicação do A. esclarecendo a situação da El lnternacional, aguardando mais de um ano até decidir adoptar tal conduta, período durante o qual os procedimentos relacionados com o processamento do sinistro não foram suspensos, vindo a culminar no cancelamento das garantias e respectiva comunicação aos tomadores de seguros em Lisboa, também eles fornecedores do Autor. ( ...) com este comportamento, a Ré contribuiu, deforma directa, para que fosse colocado em causa o crédito pessoal do Autor, entendido no sentido (...) de "projecção social das aptidões e capacidades económicas desenvolvidas por cada homem ", situação que se reputa ilícita.

  7. Em 2.ª Instância, é sublinhada a licitude da mesma conduta (anteriormente considerada ilícita), nomeadamente em argumentos como: a) a liberdade contratual "(. . .) não pode ser limitada com a imposição às seguradoras de determinados comportamentos só porque, no entender dos interessados, podem sair prejudicados no exercício da sua actividade quando pretendam contratar com terceiros. "; b) "é mais realista encarar a situação com que o A. de defrontou com uma das vicissitudes inerentes ao (acto de exercer uma actividade comercial que naturalmente implica o relacionamento com uma diversidade de supostos cujos actos obedecem a uma diversidade de motivações objectivas ou subjectivas"; c) "(. . .) as seguradoras devem adoptar as providências que se mostrem pertinentes no sentido de evitar que os riscos assumidos ponham em causa a sua subsistência, a qual depende da obtenção de receitas que permitam cobrir as despesas inerentes à actividade, garantir a existência de regras relativamente a riscos potenciais inerentes a outros contratos de seguro, suportar responsabilidades reclamadas no âmbito de sinistros e proporcionar ainda uma margem de lucro que remunere os detentores do respectivo capital social".

  8. O que o A., na qualidade (que também tem) de agente económico, reivindica para si é o direito ao bom nome, crédito e reputação, direito esse, subjectivo, que não interfere nem esmorece com a liberdade contratual da R., não aceitando que circular informação negativa sobre si seja uma vicissitude do negócio legitimada pela legal actividade da R.

  9. Assim, ao qualificar a actuação da R. como lícita, o Acórdão recorrido viola clamorosamente o direito subjectivo do A. ao bom nome, crédito e reputação que lhe são conferidos pelos artigos 70.º n.º 1 e art. 484° do Código Civil mas também, pelos artigos 25° e 26° da Constituição da República Portuguesa, o art. 12° da Declaração Universal dos Direitos do Homem e o art. 8° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, normas estas citadas e interpretadas na decisão condenatória de 1.ª instância que foi revogada.

  10. O art. 70° do Código Civil tutela a personalidade, como direito absoluto, de exclusão, na perspectiva do direito à saúde, à integridade física, ao bem-estar, à liberdade, ao bom nome, e à honra, que são os aspectos...

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