Acórdão nº 5792/15.0TBALM.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA [...]; BB, [...]; CC [...], instauraram a presente ação declarativa contra DD, [...], EE, [...], FF, S.A, pessoa coletiva n° ..., com sede na [...], GG e HH, residentes no [...], II e JJ, residentes na [...], ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Ministério Público e a MM, S.A, pessoa coletiva n° ..., com sede na ..., pedindo que: (i) se declare a nulidade da escritura de justificação celebrada em 29 de Abril de 2011 por violação das normas dos art°s 98°, n° 1, alínea b) do Código de Notariado e nos art° 4°, n° 2, alínea a), 5°, 8°, 21°, 26°, 41° a 52° do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

(ii) se declare a nulidade da mesma escritura por se fundar em declarações falsas do justificante, o 2° réu, e das suas testemunhas, bem como em documentos ardilosamente criados para o efeito.

(iii) os registos feitos com base nessa escritura sejam declarados nulos e seja ordenado o seu cancelamento junto da ... Conservatória do Registo Predial de ...

(iv) se declare que o réu EE não adquiriu por usucapião os lotes de terreno identificados na mesma escritura pública.

(v) se declare que os lotes de terreno descritos nos pontos II a XVIII dessa escritura têm a sua localização e área de implantação sobre as parcelas de terreno propriedade dos autores.

(vi) se declare a nulidade da escritura de compra e venda celebrada em 29 de Abril de 2011, entre o 2° réu e a 3a ré, com fundamento na falsidade e nulidade da escritura de justificação atrás mencionada.

(vii) se declare a nulidade da mesma escritura de compra e venda uma vez que os catorze lotes nela vendidos têm a sua localização e área de implantação sobre as parcelas de terreno propriedade dos autores.

(viii) se declarem nulos os registos de aquisição a favor da 3a ré e que seja ordenado o seu cancelamento.

(ix) se declare nula a compra e venda realizada entre a 3a ré e os 4°s réus por as escrituras de justificação notarial e de compra e venda que a antecederam serem nulas.

(x) se declare nulo o registo efetuado a favor dos 4°s réus, ordenando-se o respectivo cancelamento.

(xi) se declare nula a compra e venda realizada entre a 3ª ré e o 4° réu por serem nulas as escrituras de justificação notarial e de compra e venda que a antecederam.

(xii) se declare nulo o registo efetuado a favor do 4° réu, ordenando-se o respectivo cancelamento.

(xiii) a hipoteca voluntária constituída a favor dos 5°s réus seja declarada nula por serem nulas as escrituras de justificação notarial e de compra e venda que a antecederam.

(xiv) se declare nulo o registo de constituição dessa hipoteca, ordenando-se o seu cancelamento.

(xv) as penhoras constituídas e registadas a favor da Fazenda Nacional por dívidas fiscais do 2° réu sejam declaradas nulas, por serem nulas as escrituras de justificação notarial e de compra e venda que a antecederam.

(xvi) os registos dessas penhoras sejam declarados nulos e ordenado o seu cancelamento.

(xvii) as penhoras constituídas a favor da ré MM, S.A por dívidas do 2° réu sejam declaradas nulas, por serem nulas as escrituras de justificação notarial e de compra e venda que a antecederam.

(xviii) o registo dessas penhoras seja declarado nulo e ordenado o respectivo cancelamento.

(xix) a 1ª ré e o 2° réu sejam condenados a indemnizar os autores de todas as despesas que tiveram com a presente demanda, custas judiciais, custas de parte e honorários do seu mandatário, a liquidar em execução de sentença.

(xx) a 1ª ré e o 2° réu sejam condenados a indemnizar os autores, a título de danos não patrimoniais, em quantia não inferior a Euros 30.000,00 (trinta mil euros).

(xxi) os autores sejam reconhecidos como donos e legítimos proprietários de duas parcelas para construção, não urbanizadas, livre e alodiais, sitas em ..., com as demais características que indicaram.

Para tanto, alegaram, em síntese, que: São proprietários de duas parcelas de terreno, sitas em ..., que foram adquiridas, por compra, em 12 de Novembro de 1968, pelo marido e pai dos autores, respectivamente, tendo sempre, ao longo dos anos, atuado como donos, procedendo à limpeza desses terrenos e pagando os impostos sobre os mesmos, à vista de toda a gente e sem qualquer oposição.

Vieram, porém, a constatar que, em 29 de Abril de 2011, havia sido celebrada no Cartório Notarial da 1ª ré, pelo 2° réu, como justificante, uma escritura pública de justificação, na qual aquele último declarava ter adquirido, por usucapião, um conjunto de prédios, todos omissos no registo predial, sendo que dezassete deles estão implantados sobre as parcelas de terreno acima referidas, propriedade dos autores e ainda sobre a parcela de terreno de um terceiro.

Mais alegaram que a 1ª ré deveria ter verificado os documentos que o 2° réu apresentou para instruir a escritura e exigir a respectiva licença de loteamento, solicitar prova de que o mesmo fazia parte da lista de proprietários das parcelas que compõem a área urbana de génese ilegal (AUGI), o que a mesma não fez, tendo, assim, permitido ao 2° réu localizar e implantar lotes de terreno que não existem naquela zona, contendo esta escritura de justificação, declarações falsas, uma vez que o 2° réu nunca adquiriu os lotes de terreno objeto da mesma, não correspondendo à realidade as confrontações que esses prédios apresentam no mesmo título.

Em relação aos demais RR. alegaram que: No dia 29 de Abril de 2011 foi também celebrada escritura pública de compra e venda dos mesmos imóveis, entre o 2° réu como vendedor e a 3ª ré como compradora.

No dia 10 de Agosto de 2012, foi celebrada escritura pública de compra e venda, em que intervieram a 3ª ré, como vendedora, e os 4°s réus como compradores, tendo por objeto dois lotes de terrenos.

No dia 15 de Dezembro de 2012 foi registada a favor do 5° réu uma hipoteca voluntária sobre treze dos lotes objeto da escritura de justificação, tendo ainda sido registada em 2 de Abril de 2012, pela Fazenda Pública, uma penhora sobre dois dos referidos lotes e que em 19 de Junho de 2012 a ré MM, S.A registou penhoras também sobre vários lotes objeto da escritura de justificação.

Por último, invocaram que, devido à atuação ilícita e culposa dos 1º e 2º réus, sofreram diversos danos patrimoniais, já que se viram obrigados a fazer diligências, requisitar documentos, fazer fotocópias e plantas, participar em reuniões na Câmara Municipal de ..., despendendo muitas horas do seu tempo.

Além disso, para defender o seu direito de propriedade tiveram que suportar custas judiciais, custas de parte, bem como o pagamento dos honorários ao seu mandatário judicial, a liquidar posteriormente.

Acresce que toda a situação lhes causou revolta, angústia e nervosismos, razão pela qual pedem uma indemnização por danos não patrimoniais de montante não inferior a EUR 10.000,00, para cada um dos autores.

  1. Todos os réus contestaram.

    A 1ª ré impugnou a factualidade articulada e refutou a responsabilidade que os autores lhe imputam, tendo requerido a intervenção principal da seguradora LL, por ser a entidade que celebrou o seguro de responsabilidade profissional com a Ordem dos Notários.

    O 2° réu excecionou a ilegitimidade processual dos autores relativamente a alguns dos prédios identificados na petição inicial, por não serem os seus proprietários, e impugnou a factualidade articulada, contrapondo que em 1988 negociou com um terceiro a compra dos prédios objeto da escritura de justificação e que não obstante nunca ter sido outorgada a pertinente escritura pública, desde aquela data tem praticado atos de posse sobre esses imóveis, vindo a adquiri-los por usucapião.

    Os 4°s réus impugnaram, por desconhecimento e falsidade, os atos articulados pelos autores.

    Os 5°s réus excecionaram a ilegitimidade dos autores e impugnaram a factualidade articulada por estes.

    O Estado Português excecionou a incompetência do tribunal em razão da matéria e a verificação de erro na forma de processo e impugnou a factualidade alegada.

  2. Por despacho de 24 de Março de 2014 foi admitida a intervenção principal provocada da seguradora LL, como associada da 1ª ré, a qual apresentou contestação, reconhecendo a celebração do contrato de seguro, tendo, quanto ao mais, refutado a responsabilidade da sua segurada e impugnado a factualidade articulada.

  3. Por despacho de 10 de Julho de 2015 foi determinada a apensação a esta ação do processo com o n° 4631/13.0TBALM, atual apenso "C".

    Nesse processo, os aqui autores demandam, pelos mesmos factos e fundamentos, NN e OO, residentes na [...], pedindo: (i) Que seja declarada nula a escritura de compra e venda celebrada em 20 de Abril de 2013 entre a 3ª ré e aqueles réus.

    (ii) Que se declare nulo o registo efetuado a favor dos réus, ordenando-se o respectivo cancelamento.

    (iii) Que os autores sejam reconhecidos como donos e legítimos proprietários de duas parcelas para construção, não urbanizadas, livre e alodiais, sitas em [...], concelho de ..., com as demais características que indicaram.

    (iv) Que seja reconhecido que os prédios com as descrições prediais n's 17039, 17040 e 17041 têm a sua localização e área de implantação sobre o prédio dos autores.

  4. No processo apenso, os ali demandados contestaram, requerendo a apensação das ações e impugnando a factualidade articulada.

  5. Foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes a exceção de incompetência material e a nulidade por erro na forma de processo, tendo ainda sido declarada a ilegitimidade dos autores para os pedidos que têm como causa de pedir a falsidade da escritura de justificação, na parte em que esses pedidos versam sobre prédios diferentes dos que os demandantes se arrogam proprietários.

  6. Teve lugar audiência final, no decurso da qual foi a ré FF, S.A., substituída na ação pela generalidade dos seus acionistas, representados pelo réu EE.

  7. Após, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, tudo ponderado, decide-se: I - Julgar parcialmente procedentes os pedidos formulados, nesta ação, pelos autores...

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