Acórdão nº 226/09.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução28 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

A foi julgado pela 3ª Vara Criminal do Porto, pronunciado pela prática de um crime de abuso de confiança p. e p. pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, al. b), com referência à al. b) do artigo 202º, ambos do C. Penal.

A assistente B, a fls. 340 a 342, com os demais sinais nos autos, havia formulado pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo que fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 120.540,80, correspondente a metade do valor dos bens comuns do casal de que se apropriou, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, até integral e efectivo pagamento.

Por acórdão de 15 de Fevereiro de 2007, aquele tribunal condenou o arguido na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, com a condição de, no prazo de 30 (trinta) dias, contados do trânsito em julgado deste acórdão, comprovar nos autos ter efectuado o pagamento integral da indemnização em que também foi condenado a pagar à assistente, incluindo os respectivos juros; condenou-o ainda a pagar à assistente a quantia de 120 540,80€ (cento e vinte mil e quinhentos e quarenta euros e oitenta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados sobre as quantias 102 439,03 € (cento e dois mil e quatrocentos e trinta e nove euros e três cêntimos), 10 000,00 € (dez mil euros) e 8 101,77€ (oito mil e cento e um euros e setenta e sete cêntimos), desde, respectivamente, 02.12.2002,07.02.2003 e 20.02.2003, às taxas legais sucessivas de 7% e 4%, estas nos termos do disposto nas Portarias nºs 263/99, de 12.04 e 291/2003, de 8.04, até integral e efectivo pagamento.

  1. O arguido recorreu dessa decisão para o Tribunal da Relação do Porto, mas limitou-se a pedir a sua absolvição na parte penal.

    O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 12/09/2007, concedeu provimento ao recurso e revogou a decisão recorrida, absolvendo o arguido do crime que lhe havia sido imputado.

    Do acórdão da Relação do Porto recorreu uma primeira vez a Assistente para o STJ, alegando, entre outras coisas, que o arguido não impugnara a condenação cível e acabando por pedir a revogação do acórdão recorrido, com a manutenção, no todo ou em parte, do acórdão proferido pela 1ª instância.

    O STJ, por acórdão de 28 de Maio de 2008 (proc. n.º 131/08-3), considerou que, nos termos do artigo 403°, n° 3, do CPP, «A limitação do recurso a uma parte da decisão não prejudica o dever de retirar da procedência daquele as consequências legalmente impostas relativamente a toda a decisão recorrida». O acórdão recorrido limitou-se a revogar a decisão recorrida absolvendo o arguido do crime de abuso de confiança pelo qual havia sido condenado, nada dizendo sobre o pedido cível. Os factos imputados ao arguido, mesmo que na óptica de simples demandado, configuram ilícito civil, violador de direitos da demandante e causador de prejuízos à mesma, estando-se manifestamente fora do campo da responsabilidade contratual. O acórdão recorrido não cumpriu a injunção legal, pois tinha o dever de retirar da procedência do recurso, ou seja, da absolvição criminal, as consequências que daí adviriam para a parte cível. O acórdão recorrido omitiu por completo qualquer alusão, referência ou consideração sobre a questão, que devia conhecer. E, assim, declarou nulo o acórdão da Relação e ordenou que este Tribunal se pronunciasse sobre a questão cível.

    O Tribunal da Relação do Porto, por novo acórdão, agora de 22/10/2008, considerou que "no caso concreto dos autos entendeu-se a fls. 577 que sendo o arguido «propríetárío» ainda de tais bens podia dar-lhe o destino que bem entedesse e assim concluiu-se que o recorrente não cometeu o crime de abuso de confiança porque aqueles bens móveis referidos não lhe tinham sido entregues por título não translatívo de propriedade, antes eram dele. Poder-se-á dizer que não estando verificados os elementos constitutivos do crime de abuso de confiança e ínverífícado este, também o arguido não está obrigado a reparar os prejuízos ou danos que causou à assistente. Quer isto dizer que o pedido civil formulado pela mesma é obviamente improcedente". E, assim, decidiu, no suprimento da nulidade apontada, absolver também, para além do mais, o arguido do pedido de índemnízação civil formulado pela assistente.

  2. Do acórdão de 22/10/2008 recorre agora a Assistente para o STJ e, da sua motivação, extrai as seguintes conclusões: 1ª- Os factos provados nos autos mostram que esta não é uma situação normal de administração de bens comuns do casal; 2ª- Deles resulta uma actuação por parte do arguido perfeitamente dirigida à apropriação do que não lhe pertencia, e disso tendo perfeita consciência; 3ª- A conduta do arguido é penalmente relevante; 4ª- Os factos provados, em nosso entender, mostram que com a conduta do arguido se está perante a acção típica, ilícita, culposa e punível, conforme a previsão do art. 205°, do Cód. Penal, a que é subsumível; 5ª- Verificados estão, pois, os elementos objectivos e subjectivos de imputação ao arguido como agente da prática do crime por que foi condenado em 1ª Instãncia; 6ª Acresce que o arguido, como requerido, não impugnou a decisão sobre o pedido de indemnização civil, que o condenou a pagar à assistente, como requerente, a quantia de 120.540,80 € acrescida dos juros legais até efectivo e integral pagamento; 7ª- E não o tendo feito, sobre tal decisão formou-se caso julgado; 8ª- Tanto mais que tal condenação pode ter lugar, mesmo em caso de absolvição; 9ª- De todo o modo, sempre estão verificados os pressupostos para que deva ter lugar a condenação do arguido na indemnização peticionada.

    1. - Conforme resulta de toda a matéria dada como provada e dos fundamentos do douto acórdão da 1ª Instância, que, assim, deverá ser mantido.

    2. - Consideram-se violadas as disposições dos art.s 205°, n° 1, e n° 4, al. b), com referência ao disposto no art. 202°, al. b) ambos do Cód. Penal; art.s 377°, n° 1, 84°, do Cód. Proc. Penal; 684°, n°s 2 e 3, do Cód. Proc. Civil.

    Termos em que, e nos mais de direito, requer a V. Exas. seja dado provimento ao presente recurso, e, revogando-se o douto acórdão recorrido, manter-se o douto acórdão proferido pela 1ª Instância, no todo ou em parte, conforme conclusões supra - com as legais e inerentes consequências.

  3. O M.º P.º, quer no Tribunal da Relação, quer no STJ, defendeu que o recurso, na parte criminal, não merecia provimento.

    O arguido apresentou extemporaneamente a sua resposta ao recurso, mas depois pronunciou-se nos termos do art.º 417.º, n.º 2, do CPP, dizendo que os bens em causa já não existiam à data do decretamento do divórcio, pelo que não cometeu o crime de abuso de confiança. Por outro lado, indicou que a questão cível (reportando-se aqui ao inventário para separação de meações por...

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