Acórdão nº 08B1644 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução16 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB, pedindo a condenação desta a: a) restituir-lhe a quantia de € 15.759,64, acrescida de juros legais contados desde 30/9/2001 até integral pagamento; b) em alternativa, caso seja declarada a nulidade do contrato de mútuo, a restituir-lhe as quantias de € 8.230,16 e de € 4.987,97, que dele recebeu, acrescidas de juros legais vencidos desde as datas das entregas (4 de Julho de 2000 e 20 de Abril de 2001) e vincendos até integral pagamento; c) subsidiariamente, e ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa, a restituir-lhe a quantia de € 13.218,13, acrescida de juros legais vencidos desde as ditas entregas e vincendos até integral pagamento.

Alegando, para tanto, e em suma: Entregou à ré, a título de empréstimo, nulo por falta de forma, e por duas vezes, os aludidos quantitativos em dinheiro, recusando-se esta a devolver-lhos.

Mesmo que não se prove a existência de qualquer mútuo, sempre recebeu a ré a dita quantia, que integrou no seu património e que não devolveu, com a mesma se locupletando.

Estando, de qualquer modo, enriquecida à sua custa, sem qualquer causa que o justifique.

Citada a ré, veio a mesma contestar, aceitando ter recebido tal quantia em dinheiro, mas a título de doação.

Nada tendo, assim, a devolver.

Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 142 consta.

Foi proferida a sentença, que julgou a acção improcedente.

Inconformado, veio o autor interpor, sem êxito, recurso de apelação.

De novo irresignado, veio pedir a presente revista, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - O acórdão agora em recurso validou inteiramente a solução jurídica oferecida ao caso concreto pelo Tribunal da Comarca de Anadia. Assim, e porque inteiramente vencido na sua motivação e conclusões de recurso, o recorrente, porque continua honestamente a acreditar na correcção da bondade jurídica dessa sua argumentação, recoloca-as agora a julgamento, em sede de revista.

  1. - O autor moveu a presente acção alegando que, a título de mútuo particular, entregou à ré as quantias especificadas em "A" e "B" dos factos assentes no despacho saneador e em iguais alíneas na sentença recorrida.

  2. - A ré contestou, aceitando que as recebeu, não a título de mútuo, mas a título de doação, liberalidade que o autor lhe concedeu - factos alegados em 1 ° 2° 6° e 9° da contestação e levados à base instrutória em 3°, 4° e 5° do douto despacho saneador.

  3. - Após julgamento da matéria de facto, nem o autor logrou provar o mútuo, nem a ré logrou provar a doação, ficando no entanto provado que o autor lhe tinha entregue as ditas quantias e que a ré as tinha recebido do autor.

  4. - Perante os factos concretos a considerar nesta lide judicial e a jurisprudência e doutrina apontadas na sentença recorrida, não seria necessário o autor alegar razões, matéria, sobre a inexistência de causa justificativa para o enriquecimento da ré.

  5. - Isto é, perante o quadro factual concreto do processo, tal como foi alegado e definido pelas partes, mesmo aplicando essa doutrina e jurisprudência, não existe falta de alegação de matéria de facto sindicada na inexistência de factos que comprovassem a inexistência de causa para o recebimento das quantias em causa.

  6. - De acordo com o disposto nos arts 654° (com a excepção aí prevista do art. 264°) e 664° do CP Civil, o Juiz conhece apenas os factos alegados pelas partes e só estes - fixando-se assim o objecto do processo, da discussão, e a delimitação cognitiva do tribunal.

  7. - Cada uma das partes trouxe a juízo a sua posição sobre aquelas entregas e recebimentos (mútuo e doação).

  8. - A causa do enriquecimento reside exactamente na falta de qualquer outra causa para que a ré detenha aquelas quantias no seu património. Existem aquelas duas causas e apenas aquelas duas, e por isso subjectivamente delimitadas pelas partes, com a preclusão de quaisquer outras que, em abstracto, se pudessem pré-configurar.

  9. - Continuando a ressalvar o respeito sempre devido, o mesmo já assim não seria se a ré se tivesse limitado a impugnar a causa de recebimento das quantias alegada pelo autor (mútuo), ainda que reconhecendo os recebimentos, mas sem adiantar qualquer explicação própria para o facto. Aqui, sim, a conclusão e aplicação da doutrina e jurisprudência faria todo o sentido.

  10. - É que, mediante os factos em causa neste processo uma só de duas soluções interessa para aquelas entregas e recebimento das preditas quantias: mútuo ou doação - nenhum outro título ou causa interessa considerar ou excluir da análise para aplicação do instituto do enriquecimento sem causa. Estas e apenas estas razões deverão ser consideradas, mais nenhuma e qualquer outra deverá ser...

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