Acórdão nº 1041/18.7T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.

*ACÓRDÃO I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. M. G.

(aqui Recorrida), residente à Rua …, sem número, Lugar …, União das freguesias de …, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra A. F.

(aqui Recorrente), residente à Rua ..., sem número, em ..., pedindo que o Réu: · fosse condenado a restituir-lhe a quantia de € 50.000,00, correspondente a metade do valor de uma casa de habitação sita em ... (que melhor identificou); · fosse condenado a restituir-lhe a quantia de € 3.000,00, correspondente a metade do valor de uma viatura automóvel (que melhor identificou); · fosse condenado a restituir-lhe a quantia de € 4.500,00, correspondente à totalidade do valor depositado em conta bancária (que melhor identificou), e cujo saldo era sua propriedade exclusiva.

Alegou para o efeito, em síntese, ter vivido durante trinta e quatro anos em união de facto com o Réu, durante os quais construíram, em conjugação de esforços e meios, uma casa de habitação em terreno próprio dele, despendendo para o efeito € 100.000,00.

Mais alegou terem ainda adquirido, durante o mesmo período de tempo e de novo com conjugação de meios seus, uma viatura automóvel por € 6.000,00, registada em nome do Réu.

Alegou ainda que, tendo cessado a união de facto por iniciativa do Réu, o mesmo viria a levantar de uma conta bancária comum, mas onde apenas estavam depositadas pensões dela própria, e por isso sua propriedade exclusiva, € 4.5000,00.

Defendeu, assim, a Autora que, tendo o património do Réu ficado enriquecido à custa da sua contribuição (em parte igual à aquele), e tendo desaparecido a causa que justificava esse enriquecimento, teria direito à restituição de valores aqui impetrada, precisamente à luz do instituto do enriquecimento sem causa, que expressamente invocou.

1.1.2.

Regular e pessoalmente citados, o Réu (A. F.) contestou, pedindo que a acção fosse julgada improcedente; e deduzindo reconvenção, pedindo que: · a Autora fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 11.250,00, (correspondente ao valor global de quantias que fez suas e que lhe pertenciam), acrescida de juros de mora, calculados à taxa supletiva legal, contados desde a notificação da reconvenção até integral pagamento.

Alegou para o efeito, em síntese, serem falsos os factos relativos a eventuais contribuições da Autora para a edificação de imóvel seu, ou para aquisição de viatura sua, pertencendo-lhe ainda metade do saldo bancário de € 4.500,00 que levantou.

Mais alegou ter sido a Autora, e não ele próprio, quem beneficiou economicamente com a união de facto, nomeadamente por ter custeado obras em imóvel dela, no valor de € 51.750,00, onde construiu ainda um armazém, gastando outros € 35.000,00 seus, e por ter suportado despesas várias com a sua filha e com culturas feitas em prédio da Autora.

Já em sede de reconvenção, o Réu alegou ter-se a Autora apropriado de subsídios de exploração agrícola sua, de € 7.000,00, e do preço de produção e castanha sua, de € 6.500,00, no valor global de € 13.500,00; e dever, por isso, restituir-lhe os € 11.250,00 peticionados (isto é, a soma dos ditos subsídio e preço, subtraída da quantia de € 2.250,00, correspondente a metade do saldo bancária que ele próprio teria de devolver à Autora).

1.1.3.

A Autora replicou, pedindo que se julgasse improcedente a reconvenção.

Alegou para o efeito, sempre em síntese, serem falsos os factos alegados pelo Réu para a fundar, reiterando o seu pedido inicial.

1.1.4.

Em sede de audiência prévia, foi proferido: admitindo a reconvenção; fixando o valor da acção em € 68.750,00; despacho saneador (certificando a validade e a regularidade da instância); identificando o objecto do litigio («- O direito da Autora receber metade do valor do imóvel e do veículo identificado nos autos, e, a quantia monetária referida nos mesmos autos») e enunciando os temas da prova («1. Apurar se a habitação identificada no artigo 22.º, da petição inicial, foi construída com rendimentos, fruto do trabalho da Autora e do 1.º Réu»; «2. Apurar se tal habitação custeou cerca de € 100.000,00 (cem mil euros) e se é esse o valor que ainda hoje tem»; «3. Apurar se a Autora e o 1.º Réu adquiriram a viatura automóvel, identificada no artigo 49.º, da petição inicial, pelo valor de € 6.000,00 (seis mil euros), em conjunto e com dinheiro de ambos»; «4. Apurar se a quantia de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) que o 1.º Reu levantou da conta conjunta que tinha com a Autora, é propriedade exclusiva da Autora, proveniente da pensão de viuvez que recebe»; «5. Apurar se a Autora contribuiu, ao longo de 34 anos, para um património comum com o 1.º Réu, com dinheiro e trabalho»; «6. Apurar se os € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) referidos são dinheiro comum da Autora e do Réu»; «7. Apurar se a Autora retém na sua posse, a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros), de subsídios à exploração agrícola e € 6.500,00 (sete mil e quinhentos euros) da venda de castanhas, pertencentes ao 1.º Réu»); e admitindo os meios probatórios (nomeadamente, a realização de uma perícia de avaliação ao imóvel do Réu).

1.1.5.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) DECISÃO: Por tudo quanto exposto ficou: 1- Julgo a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente:

  1. Condeno o Réu A. F. a restituir à autora a quantia global de € 39.250 (trinta e nove mil duzentos e cinquenta euros), correspondente a metade do valor da casa de habitação, inscrita na matriz predial urbana da União das Freguesias de ... e ..., concelho de Chaves, sob o artigo ... a qual é composta de casa de rés-do-chão e primeiro andar para a habitação, com a área de construção de 248 metros quadrados e com a área total do terreno de 570 metros quadrado, bem como a metade do valor da viatura automóvel, de matricula HN.

  2. Condeno o mesmo Réu A. F. à restituição da quantia de 4.500 € (quatro mil e quinhentos euros), correspondente à totalidade do valor depositado na conta domiciliada no Balcão ... da Caixa ..., com o número .........06, o qual era propriedade em exclusivo da Autora.

  3. Absolvo o réu do mais peticionado.

    2- Julgo totalmente improcedente a reconvenção, absolvendo a autora do respetivo pedido.

    3- Custas da ação a cargo de autora e réu, na proporção do decaimento, e da reconvenção a cargo do réu.

    4- Registe e notifique.

    (…)»*1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformado com esta decisão, o Réu (A. F.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse alterada a matéria de facto dada como provada e não provada, e revogada a decisão de mérito, sendo substituída por outra determinando a improcedência da acção a decisão recorrida fosse alterada.

    Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis): 1.ª - O réu/recorrente para cumprir o ónus do artigo 640º, nº 1, al. b) do CPC transcreveu os depoimentos gravados a propósito de cada um dos pontos da matéria de facto cujo julgamento se impugna, ao longo destas alegações transcreveu as passagens concretas em que são feitas as afirmações que impunham decisão sobre os mesmos pontos da matéria de facto diversa da recorrida e, para evitar maçadoras repetições e respeitar a obrigação de síntese que se impõe nestas conclusões, aqui as considera reproduzidas.

    1. - Assim, pela ordem que ao réu/recorrente se afigura mais lógica, consideram-se incorretamente julgados os factos dados como provados em 3, 20, 35, 43, 49 e 53, no que respeita ao estabelecimento da união de facto, da sua rutura, do seu restabelecimento e o seu termo.

    2. - Em face do depoimento da autora/recorrida registado no sistema de gravação em uso no Tribunal “a quo”, na sessão de julgamento do dia 27.01.2020, com início às 10:09:12 e fim às 10:56:37, nomeadamente, por ordem de relevância para cada um dos pontos da matéria de facto impugnada, nas passagens que se iniciam aos minutos 10:50, 40:20, 12:09 e 25:23; 4.ª - O ponto 3 da matéria de facto deve ser alterado nos seguintes termos: 3. A Autora e o Réu A. F., após o decesso dos seus respetivos cônjuges e por volta do ano de 1982, passaram a viver em comunhão de leito, mesa e habitação até cerca de 1993, altura em que se separaram durante cerca de um ano e meio, até 1994 ou 1995.

    3. - O ponto 20 deve ser eliminado da matéria de facto provada, uma vez que, como resulta do depoimento da autora ao minuto 12:09, provou-se que a decisão foi apenas do réu.

    4. - Quanto ao ponto 35, resultou demonstrado que a autora e o réu só fixaram residência na casa de ... quando a mesma regressou de França, pelo que deve o mesmo ser alterado nos seguintes termos: 35. Casa para onde foram morar Autora e Réu A. F. após o regresso da autora de França, por volta dos anos de 1994 ou 1995.

    5. - O ponto 43 da matéria de facto deve ser alterado de modo a que deixe de constar que foram 34 anos de convivência entre a autora e ré, de forma ininterrupta, porque tal não sucedeu, assim como não foi expulsa da casa do réu, pelo que se defende que este ponto deve ser alterado nos seguintes termos: 43. Após cerca de 21 anos de convivência entre a autora e réu, de forma ininterrupta, e de vida em comum em condição análoga à dos cônjuges, a autora deixou a casa onde juntos coabitaram em ....

    6. - No ponto 49 deve ser alterada a expressão forçada de modo a constar o seguinte: 49. E já com 73 anos de idade, foi dito à autora para sair dessa casa, tendo retornado para ...

      .

    7. - No ponto 53, em consonância com os pontos 3 e 43, impõe-se corrigir a duração da união de facto, uma vez que não foram ininterruptos 34 anos de vida em conjunto, para a seguinte redação: 53. Nunca...

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