Acórdão nº 2065/18.0T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelANA VIEIRA
Data da Resolução05 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo nº 2065/18.0T8VIS.C1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Juízo Local Cível- Juiz 1 Relatora: Ana Vieira 1º Adjunto Desembargador Dr. António Carvalho Martins 2º Adjunto Desembargador Dr. Carlos Moreira * Sumário I- O “facto notório” serve para a determinação dos factos relevantes da acção, não se adequando à finalidade da modificação da decisão sobre a matéria de facto.

II- Nos termos do disposto no artigo 1434 do CC, a assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das suas deliberações, nomeadamente, aplicáveis ao condómino em mora no pagamento das quotas de condomínio.

III- Assiste ao condómino o direito de invocar o excesso da penalidade que lhe tenha sido aplicada, nos termos do artigo 812.º CC, apesar de se manter dentro dos limites do n.º 2 do artigo 1434, º CC, pedindo a sua redução equitativa.

* Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I- RELATÓRIO Na presente acção de processo comum instaurada por M (…) contra Condomínio do Prédio sito na Quinta (...) , (...) , em (...) , actualmente representado pela também ré V (…), Ld.ª, a primeira pede a condenação dos réus a: a) pagarem-lhe a quantia de € 615,00 relativa à factura que identificou, acrescida de € 55,35 a título de juros, b) entregarem-lhe, a título de indemnização por danos não patrimoniais, uma quantia não inferior a € 6.250,00, c) entregarem-lhe, a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de € 102,00, todas acrescidas de juros de mora desde a citação e até integral pagamento.

Alegou, em resumo, ser dona da fracção que indicou, tendo-se iniciado obras nas partes comuns do prédio, ao nível da sua cobertura, e pintura em Setembro/Outubro de 2014 as quais apenas foram concluídas em Outubro/Novembro de 2015 período durante o qual se queixou à 2ª ré dos atrasos e das constantes infiltrações que as mesmas estavam a provocar na sua fracção. Refere ainda ter solicitado à 2ª ré, mediante telefonema efectuado a (…), a resolução urgente do problema das infiltrações e que, não obstante aquela nada fez, razão pela qual contratou pessoa para arranjar o tubo de descarga que estava a provocar as infiltrações e pintar a sua cozinha, tendo-lhe pago a quantia de € 615,00. Mais alegou que as infiltrações e humidades referidas a impediram de usar plenamente a sua cozinha, situação que disse ter alterado o seu sistema nervoso, provocando-lhe depressão e tristeza e que se deslocou 3 vezes á CRSS para pedir apoio judiciário e enfrentou longas horas de espera e deslocou-se duas vezes á junta de freguesia e repartição de finanças e 3 vezes ao escritório do patrono e que continua a não usufruir da cozinha na sua plenitude devido a infiltrações. Alega que esses desgostos e tristezas e preocupações geraram ansiedade e depressão e peticiona uma indemnização. Peticiona também a condenação dos réus a pagar o valor de 102,00 euros, a título de taxa de justiça que pagou aquando da instauração da injunção para reembolso dos € 615,00, a qual foi negada por uso indevido do procedimento.

Citado o réu Condomínio contestou, deduziu reconvenção e requereu, a final, a intervenção provocada que foi indeferida por decisão transitada em julgado. Invoca em resumo que as obras a que a autora se reporta tinham o custo global de € 38.000,00, devendo cada condómino pagar a respectiva quota parte em 5 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a 1ª no último dia de Junho de 2014 e a última no último dia do mês de Outubro do mesmo ano, pagamentos que a autora não efectuou nos prazos estipulados pela assembleia de condóminos, apenas tendo liquidado a sua quota parte por conta da quota parte extraordinária aprovada para a realização das obras em 15/12/2017 e após ter sido instaurada uma execução para pagamento coercivo de tais valores. Invocou, pois, que a autora procurou atrasar a realização das obras – no atraso no pagamento da sua quota parte e ao efectuar denúncias. Negou ainda que a autora tivesse denunciado a existência de infiltrações na sua fracção, impugnando ainda não só as invocadas infiltrações bem como a sua origem. Impugnou também o seu invocado estado de saúde e o valor a este título pedido. Disse, pois, que a autora, ao instaurar a presente acção, litiga de má-fé, requerendo a sua condenação, a este título, numa indemnização nunca inferior a € 1.000,00. Reconvindo disse que, considerando o valor global das obras aprovadas - € 38.000,00 – e a permilagem da fracção de que a autora é proprietária – 52,63/1000 – cabia-lhe pagar, por conta das ditas obras, € 1.999,94, a qual atrasou o seu pagamento por período superior a dois trimestres, razão pela qual lhe foi aplicada a pena pecuniária no valor de € 2.079,75, na sequência do deliberado pela assembleia em 05/03/2014. Disse ainda que na assembleia de condóminos realizada em 29/03/2016 foi deliberado, por maioria dos presentes, aprovar novo orçamento para a realização de obras ao nível da fachada, lançando uma quota extraordinária de € 5.000,00 a dividir pelos condóminos em função da permilagem da respectiva fracção, mais tendo sido deliberado que o não pagamento da quota até ao final do prazo estabelecido – 30/07/2016 – implicaria a aplicação de pena pecuniária de valor igual ao triplo da dívida mas nunca inferior a € 1.000,00, correspondendo a quota da autora a € 263,15, da qual é devedora, à acrescer os indicados € 1.000,00 a título de pena pecuniária, dado o atraso no pagamento.

Citada a ré V (…)também contestou dizendo, em resumo e à semelhança do 1º réu, que a assembleia de condóminos deliberou aprovar um orçamento para a realização de obras, no valor de € 38.000,00, devendo cada condómino pagar a sua quota parte em 5 prestações mensais e sucessivas, devendo as obras ter inicio em Setembro de 2014, tendo-se no entanto a autora negado a pagar a sua quota, razão pela qual lhe foi movida, em Janeiro de 2015, uma acção executiva, tendo apenas liquidado a sua quota parte em 15 de Dezembro de 2017. Disse ainda que a autora não estabelece qualquer contacto consigo desde o início de 2014. Impugnou também o pedido efectuado a título de indemnização por danos não patrimoniais, pugnando pela inexistência de nexo de causalidade entre o seu estado de saúde e as obras. Quanto aos € 102,00 disse ter a autora confessado ter feito uso indevido do processo de injunção, não sendo a ré responsável pelo pagamento desse valor.

Foi proferida a sentença recorrida que decidiu nos seguintes termos: «..DECISÃO Pelo exposto o Tribunal decide:

  1. Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência: i. Condenam-se as rés a entregar à autora a quantia de € 582,63, acrescida de juros vencidos e vincendos contados desde a citação até integral pagamento.

    ii. Absolvem-se as rés dos demais pedidos contra si formulados.

  2. Julgar a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência: i. Condena-se a autora a entregar ao 1º réu a quantia de € 1.263,15.

    ii. Absolve-se a autora/reconvinda do remanescente peticionado pelo 1º réu.

  3. Determino que se opere a compensação de créditos entre o crédito da autora referido em a) i., no valor de € 582,63, e o crédito do 1º réu referido em b) i., no valor de € 1.263,15, pelo que a autora/reconvinda não terá direito a receber o referido valor, apenas tendo que proceder ao pagamento ao 1º réu da quantia de € 680,52.

  4. Não condenar a autora como litigante de má-fé.

    * Custas eventualmente devidas a juízo a cargo da autora e das rés, na proporção dos respectivos decaimentos e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário, na modalidade de pagamento faseado, com que a autora litiga.

    Valor da acção: o já fixado a fls. 132.

    Registe e notifique. » (SIC).

    * Inconformada com tal decisão, veio a autora interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    A autora com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «… Conclusões: (…) O réu Condomínio apresentou contra-alegações tendo elaborado as seguintes conclusões: «… CONCLUSÕES: (…) *** II- DO MÉRITO DO RECURSO 1. Definição do objecto do recurso O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].

    Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas: A-Alteração da decisão sobre a matéria de facto e (Im) Procedência do pedido de condenação a titulo de danos não patrimoniais e patrimoniais.

    B- (Im) Procedência do pedido reconvencional (determinação sobre a possibilidade de fixação de sanção pecuniária compulsória ou a sua redução).

    *** III- FUNDAMENTOS DE FACTO Visando analisar o objecto do recurso, cumpre enunciar os factos provados e não provados pelo tribunal a quo, tendo-se, no entanto, em conta que essa enunciação terá uma natureza provisória, visto que o recurso versa sobre a matéria de facto pugnando pela sua alteração.

    Nesse contexto, cumpre referir que a sentença recorrida consignou a seguinte matéria de facto (factos provados e não provados):« FUNDAMENTAÇÃO

    1. MATÉRIA DE FACTO PROVADA 1. A autora é dona e legítima proprietária da fracção autónoma designada pela letra F a que corresponde o 1º andar esquerdo do (...) , sito no (...) Norte.

    1. A 2ª ré, V (…), administra, por deliberação maioritária dos condóminos, o Condomínio do prédio sito na Quinta (...) , (...) , em (...) .

    2. Em assembleia de condóminos realizada no dia 3 de Maio de 2014 foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar um orçamento no valor de € 38.000,00, para a realização de obras do edifício, ao nível da cobertura e pintura da fachada do prédio, conforme acta da assembleia n.º 03/2014, constante de fls. 49/49 v. e cujo teor se considera reproduzido para todos os...

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