Acórdão nº 08P1883 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelFERNANDO FRÓIS
Data da Resolução03 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No Tribunal Judicial da comarca de Aveiro no processo comum nº 637/03.6TAAVR e sob acusação do MºPº - que lhes imputava a prática, como co-autores materiais, de um crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º do Código Penal - foram submetidos a julgamento perante tribunal singular, os arguidos: AA; e José Luís Nuno Alves Martins, ambos identificados nos autos.

O assistente BB, igualmente identificado no processo, deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, por danos patrimoniais e não patrimoniais em montante nunca inferior a 5000€ (cinco mil euros).

Para além dessa indemnização, pede ainda o assistente que os arguidos sejam condenados a pagar-lhe outras despesas que apenas se poderão computar em sede de execução de sentença.

A final, foi proferida sentença em 28 de Junho de 2007 que julgando a acusação procedente, por provada, condenou cada um dos arguidos, pela prática, em co-autoria, de um crime de ofensas à integridade física simples p. e p. pelo artigo 143º nº 1 do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à razão diária de € 10 (dez euros).

E, na procedência do pedido cível, condenou os demandados AA e BB, solidariamente, a pagarem ao demandante CC a quantia de € 4500 (quatro mil e quinhentos euros) de indemnização pelos danos sofridos, quantia acrescida do montante das despesas que o demandante tenha com intervenção(ões) cirúrgica(s) que se venha(m) a revelar necessária(s), a liquidar em execução de sentença.

Inconformado com a decisão, o arguido BB interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 18 de Fevereiro de 2008, decidiu conceder provimento ao recurso e, consequentemente, absolvê-lo, bem como ao co-arguido AA, do crime por que haviam sido condenados; e - Absolver os demandados do pedido cível que contra si havia sido formulado pelo demandante CC.

Inconformado com aquele acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, o assistente CC veio interpor recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, pugnando pela revogação daquele acórdão e pela manutenção da decisão da 1ª instância, formulando as seguintes: CONCLUSÕES A.

O Douto Acórdão da Relação de Coimbra, ao julgar procedente o recurso interposto pelo arguido BB, ancora a sua fundamentação no argumento da suposta ausência de um acordo entre o arguido e o agressor; B.

A Doutrina e Jurisprudência têm entendido que esse acordo, não tem que ser necessariamente expresso. Vejamos: - "IV- Há co-autoria material, quando, embora não tenha havido acordo prévio expresso, as circunstâncias em que os arguidos actuaram indiciam um acordo tácito, assente na existência da consequência e vontade de colaboração, aferidas à luz das regras da experiência comum.( . .)" (ac. ST J de 16 de Janeiro de 1990, proc. nº 040378); - "II- Para a existência do acordo, basta a existência da consciência e vontade de várias pessoas na realização de um tipo legal.

( . .) (ac. STJ de 09 de Janeiro de 1995, proc. n° 047996); C. Na situação em apreço, não pode deixar de se aferir a existência de, pelo menos, um acordo tácito, a partir do momento em que os arguidos manietam e arrastam o assistente para uma sala anexa à sala de dança, que se encontrava vazia, onde este veio a ser agredido por um terceiro indivíduo, que os arguidos nunca quiseram identificar; D.

O assistente foi levado pelos arguidos contra a sua vontade, para a referida sala, que era um espaço isolado da discoteca e foi agredido enquanto era agarrado pelos arguidos; E.

Ainda que se entendesse que não houve sequer um acordo tácito entre os arguidos e o agressor, não deixaria nunca de haver cumplicidade na actuação deles - evidente, desde logo, pela forma esquiva como se comportou o arguido BB, ao não identificar a agressor, como era sua obrigação F. Os arguidos podem até não ter planeado previamente ou sequer de forma tácita, a agressão, mas as circunstâncias de modo, lugar e tempo em que os factos ocorreram, e que ficaram provadas nos autos, não deixam dúvidas de que os arguidos contribuíram para a realização do crime, uma vez que impediram que o assistente evitasse a agressão ou se defendesse ou até retaliasse - de tudo isso o ora recorrente foi impedido pelos arguidos; G.

Dessa forma, os arguidos não podem deixar de se considerar cúmplices do acto agressivo; H.

A colaboração dos arguidos facilitou a realização do crime e contribuiu para a diminuição dos meios de defesa do assistente.

Respondeu o Exmº Magistrado do Mº Pº junto da Relação de Coimbra, sustentado a inadmissibilidade do recurso porquanto, tendo o arguido sido absolvido, ou seja, não lhe tendo sido aplicada pena privativa da liberdade, não é admissível o recurso, nos termos das disposições conjugadas dos artigos nºs 400º-1-e) e b) a contrario, do CPP.

Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Exmº Magistrado do MºPº emitiu douto parecer no sentido da admissibilidade do recurso e reenvio do processo para que o tribunal recorrido, em novo julgamento, elimine a contradição existente entre a matéria de facto assente (parte dela) e a decisão Foi cumprido o disposto no artigo 417º-2 do CPP.

Colhidos os vistos em simultâneo, o processo veio para conferência para decisão.

Decidindo: Nos termos do artigo 399º do CPP, "É permitido recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei".

E, nos termos do estatuído no artigo 401º-1-b) do mesmo Código, tem legitimidade para recorrer o assistente, de decisões contra ele proferidas.

Porque o recorrente, in casu, é o assistente e recorre da sentença que absolveu os arguidos, tem legitimidade e interesse em agir para tanto (neste sentido, cfr. ac. STJ de 26.Maio.1999, proc. 291/98 - 3ª; SASTJ, nº 31, 90) Ora, o recurso para as Relações é o regime regra.

Por isso, os casos de recurso para o STJ estão taxativamente previstos nas várias alíneas do artigo 432º do Código de Processo Penal (ou noutros casos que a lei especialmente preveja artigo - cfr. 433º do CPP).

Fora desses casos, o recurso não é admissível.

Na verdade, o artigo 400º do Código de Processo penal, referindo-se às "decisões que não admitem recurso", na redacção vigente na data da condenação, estabelecia: 1. Não é admissível recurso: a) De despachos de mero expediente; b) De decisões que ordenam actos dependentes de livre resolução do tribunal; c) De acórdãos proferidos em recurso, pelas relações, que não ponham termo à causa; d) De acórdãos proferidos em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância; e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, em processo por crime a que seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos, mesmo em caso de concurso de infracções, ou em que o Ministério Público tenha usado da faculdade prevista no artigo 16º nº 3; f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções; g) Nos demais casos previstos na lei.

  1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 427º e 432º, o recurso da parte da sentença relativa a indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada.

    Por seu turno, o artigo 432º do mesmo código, referindo-se ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, dispunha: Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça: a) De decisões das relações proferidas em primeira instância; b) De decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400º; c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri; d) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo, visando exclusivamente o...

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