Acórdão nº 08P295 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum colectivo nº 4/07.2ABPRT, do 2º Juízo do Tribunal da Maia, por acórdão datado de 30 de Outubro de 2007 foi a arguida AA, solteira, doméstica, filha de BB e de CC, nascida a 16 de Janeiro de 1982, em Ponte da Barca, Portugal, residente no bairro de S..... A....., bloco ...., entrada ....., ....º esquerdo, Ponte da Barca, actualmente presa preventivamente, condenada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo artigo 21º, do DL 15/93, de 22-01, na pena de 6 anos de prisão.

Inconformada, interpôs recurso a arguida, apresentando a motivação de fls. 664 a 669, que remata com as seguintes conclusões: 1. A arguida foi condenada pelo cometimento de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.° do Dec. Lei 15/93, de 22/01, na pena de seis anos de prisão.

  1. A arguida recorre do douto acórdão condenatório proferido pelo Tribunal a quo por entender que existe deficiente fixação da medida concreta da pena.

  2. A arguida sustenta haverem sido incorrectamente interpretados pelo Tribunal a quo os arts. 40°. e 71°. do Código Penal.

  3. Os critérios orientadores definidos na lei penal para a determinação da pena assentam na ideia de que o limite máximo da pena é estabelecido em função da culpa manifestada pelo agente, em íntima conexão com a prevenção geral positiva ou de integração que determina o limite mínimo da pena ainda suportável pela comunidade, fazendo incidir a ideia de ressocialização entre estas duas premissas.

  4. No caso concreto está assente que a arguida é jovem; não tem antecedentes criminais; encontra-se inserida socialmente; tem núcleo e forte apoio familiar, sendo mãe de dois menores, um deles nascido na pendência do processo e em meio prisional.

  5. Não se provou que para além do acto de tráfico, ocorrido em 9 de Janeiro de 2007, tivesse praticado quaisquer outros actos de tráfico, que a pudessem indiciar como traficante habitual.

  6. Ficou provado que o percurso de vida da arguida foi perturbado pela perda de laços significativos, pela ineficácia das práticas educativas, o que em larga medida contribuíram para a assunção de comportamento desviante pela arguida.

  7. A adopção de medidas reeducativas em larga medida supera a exigência de punição, assim favorecendo a ressocialização da arguida, cujo processo formativo ainda não está totalmente formado ou deformado, e que em grande escala depende da decisão deste processo.

  8. Estas circunstâncias, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor da recorrente levando a crer que a inserção social e a estabilidade familiar que possui, se tivessem sido devidamente ponderadas e analisadas, com o devido respeito o dizemos, tornam a recorrente apta a uma fácil recuperação, retomando uma vida normal, regendo a sua conduta por valores condizentes com a Lei.

  9. Atendendo à gravidade do crime, a personalidade da arguida, aliada ao facto de terem decorrido já dez meses sobre o delito mantendo arguida conduta conforme as regras institucionais, torna como susceptível de formar um juízo de prognose favorável a possibilidade de suspensão da execução da pena em que for condenada, impondo regras de conduta tendentes a favorecer a plena ressocialização da arguida e, em consequência, o seu afastamento da criminalidade.

  10. O critério orientador prescrito nos arts. 40°. e 71°. do CP fazem concluir que uma pena de prisão em medida não muito superior ao mínimo legal abstracto, como seja, quatro anos e seis meses de prisão, o que se revelaria justa e adequada ao caso concreto.

    Pede que o recurso seja julgado procedente e, em conformidade, seja condenada em pena de prisão não superior a quatro anos e seis meses.

    O Mº Pº junto do Tribunal recorrido respondeu conforme fls. 675/7, defendendo a manutenção do acórdão com a improcedência do recurso.

    Neste Supremo Tribunal a Exma. Procuradora-Geral Adjunta apôs visto.

    O presente recurso foi interposto, bem como a decisão recorrida proferida foi já no domínio da nova redacção dada ao CPP pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, entrada em vigor em 15-09-2007, sendo que não foi requerida audiência.

    Passou a dispor o n.º 5 do artigo 411º, do CPP: "No requerimento de interposição de recurso o recorrente pode requerer que se realize audiência, especificando os pontos da motivação que pretende ver debatidos".

    Não tendo sido requerida audiência, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 419º, n.º 3, alínea c), do CPP.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que expõe em síntese as razões do pedido (artigo 412º, nº1 do CPP), que se define e delimita o objecto do recurso.

    Questão a resolver Tendo em conta o teor das conclusões, a questão a apreciar é a medida da pena, pretendendo a recorrente a sua redução.

    A final da motivação pede a recorrente apenas a redução da pena de prisão, fixando-se a mesma em medida não superior a quatro anos e seis meses.

    Contudo, na conclusão 10ª não deixa de aflorar a possibilidade de suspensão da execução da pena.

    Não pode deixar de se anotar que na folha imediatamente anterior, após enunciar a pretensão da fixação da pena em 4 anos e 6 meses de prisão, em nota de rodapé, após referir-se à alteração do artigo 50º pela Lei 59/07, diz a recorrente: «Contudo, face ao tipo legal de crime pelo qual se acha condenada (crime pluriofensivo) não ousa a arguida pugnar pela suspensão da execução da pena, pois tem bem presente a necessidade de fazer valer a ideia de prevenção geral positiva, mas sustenta que a aplicação de pena efectiva dentro do limite que consentiria tal desiderato cumprirá todas as finalidades punitivas que subjazem à norma incriminadora» (sublinhámos).

    Seja como for, fixando-se a pena em patamar igual ou inferior a cinco anos de prisão não se deixará de equacionar a possibilidade da aplicação concreta da pena de substituição, atento o entendimento uniforme deste Supremo Tribunal no sentido de constituir um poder-dever a indagação da verificação de pressupostos no sentido de ser concedida ou denegada a pena de substituição.

    Factos Provados Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, já que da leitura do texto da decisão, por si só considerado ou em conjugação com as regras de experiência comum, não emerge a ocorrência de qualquer vício ou nulidade de conhecimento oficioso, mostrando-se o adquirido suficiente para a decisão, coerente, sem contradição, harmonioso e devidamente fundamentado.

    Seguem-se os factos dados por provados: 1. Os Arguidos DD e AA residem em Celanova, Ourense, Espanha e vivem em comunhão de habitação, cama e mesa, como se casados fossem, desde há cerca de 5 anos, tendo dessa relação nascido um filho de nome D..... e uma filha que nasceu no Estabelecimento Prisional durante a situação de prisão preventiva à ordem dos presentes autos.

  11. A arguida CC é mãe de AA, sendo com ela que reside o filho mais velho da segunda (D.....), praticamente desde que nasceu.

  12. Em data concretamente não apurada AA decidiu ir à Venezuela e solicitou a CC que a acompanhasse.

  13. Tais viagens foram pagas pelo arguido DD, o qual entregou a AA a quantia de €2.000,00 para gastos de viagem.

  14. O arguido DD transportou as Arguidas AA e CC de Ponte da Barca até ao...

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