Acórdão nº 08B2688 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS BERNARDINO
Data da Resolução18 de Dezembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

G... - C... e G... D..., L.da intentou, em 18.11.2003, na 4ª Vara Cível de Lisboa, contra BANCO BPI, S.A.

, acção com processo ordinário, pedindo que o réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 66.323,77, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 12%, desde a citação até integral pagamento, alegando, para tanto, ter este autorizado movimentos de uma conta dela, autora, sediada no balcão da Rua ....., n.º .... -A em Lisboa, para contas de terceiros, sem que o gerente da demandante - única pessoa que podia movimentar a conta - tivesse dado ordem nesse sentido, daí resultando ter ficado desapossada da quantia peticionada.

Contestou o Banco demandado, alegando, em síntese, que fez as identificadas transferências para contas de que eram titulares o pai e avós do gerente da autora, mas fê-lo sempre com autorização, conhecimento ou aceitação do dito gerente da autora, devendo, em consequência, improceder a acção.

Cautelarmente, para o caso de perda da demanda, requereu a intervenção acessória dos beneficiários dos movimentos em questão.

Admitido o chamamento e citados os chamados - AA, BB e CC - vieram eles apresentar contestação, na qual sustentam a improcedência da acção.

Efectuado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou o banco réu a pagar à autora o montante peticionado, acrescido de juros vencidos desde 26.11.2003 até efectivo pagamento, à taxa aplicável aos créditos das sociedades comerciais em vigor desde aquela data.

Da sentença recorreram o réu e os chamados, que impugnaram a decisão de facto.

Solicitadas as "cassettes" da gravação da prova, o tribunal de 1ª instância informou a Relação que estas se encontravam inaudíveis.

Na Relação, a Ex.ma Desembargadora relatora, considerando que tal irregularidade constituía nulidade, determinante da anulação da decisão proferida sobre a matéria de facto e termos subsequentes, determinou a repetição da prova no respeitante a todos os depoimentos prestados que se achassem deficientemente gravados, anulando a decisão proferida sobre a matéria de facto e a sentença.

Retornados os autos à 1ª instância, aí se procedeu a novo julgamento, tendo, sequentemente, sido proferida sentença julgando a acção procedente e condenando o réu a pagar à autora a quantia de € 66.323,77, acrescida de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento, à taxa de 12% até 30.09.2004, e à taxa resultante da aplicação da Portaria 597/05, de 19.07, desde 01.10.2004.

Apelaram, de novo, o réu e os chamados.

Não lograram, porém, qualquer êxito, já que a Relação, em acórdão oportunamente proferido, julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.

Continuando inconformado, o banco réu recorre, agora de revista, para este Supremo Tribunal.

A sua peça alegatória termina com a enunciação das seguintes conclusões: 1ª - Com início em 02.02.2001 e fim em 03.12.2001 foram efectuadas 26 transferências, no montante global de € 66.323,77, da conta de depósitos à ordem da autora para as contas tituladas pelo pai do seu sócio-gerente (€ 30.430,28) e pelo pai e avós do mesmo (€ 35.893,49); 2ª - Essas transferências foram efectuadas durante o ano de 2001 nos meses de Fevereiro (4, no valor total de € 3.491,60), Março (1), Maio (2), Junho (2), Julho (4), Agosto (2), Setembro (6), Outubro (3), Novembro (1) e Dezembro (1); 3ª - À data das transferências, o avô do gerente da autora, titular da conta beneficiária da maioria do valor das transferências, era o sócio maioritário da mesma autora, com 60% do seu capital social, posição que manteve desde a data da constituição da autora, em 18.01.2001, até 07.10.2003; 4ª - A autora recebeu oportunamente do Banco os justificativos individuais das 26 transferências, que eram enviados de imediato à sua realização, e os extractos da conta também a elas referentes, bem como à restante movimentação da conta, e nunca efectuou quaisquer reparos aos mesmos; 5ª - A autora era uma cliente Net, ou seja, uma cliente com acesso informático directo e imediato à sua conta e respectiva movimentação; 6ª - A autora, por intermédio do seu sócio-gerente, licenciado em direito, teve conhecimento das transferências logo que foram efectuadas; 7ª - A autora nada fez junto do Banco para as impedir ao longo dos mais de 10 meses em que se processaram, e apenas depois de Fevereiro de 2003 é que as veio questionar, conforme confissão que decorre da p.i. (arts. 3º, 8º e 11º); 8ª - Segundo as várias soluções plausíveis de direito, pelo menos estes factos - o da data em que a autora reclamou da falta de autorização escrita para as transferências e o seu comportamento na relação com o Banco, durante e após as transferências - deveriam ter sido concretamente questionados, e não o foram, o que gera dúvidas e, caso estas se mantenham, fundamento para a repetição do julgamento; 9ª - O silêncio da autora e os usos e costumes bancários quanto a tal procedimento só pode ser juridicamente entendido como declaração negocial de aceitação da regularidade da movimentação da conta, em particular das transferências (art. 224º/1 do CC); 10ª - O Banco efectuou as transferências de boa fé, convicto da sua regularidade, face ao comportamento conivente e omissivo da autora; 11ª - O Banco teria cessado de imediato as transferências, caso a autora a tal se tivesse oposto; 12ª - O prejuízo para o Banco é actualmente maior do que aquele que seria se a autora tivesse reclamado das transferências logo que delas teve conhecimento, o que se verificou de imediato às mesmas; 13ª - A autora manteve a sua relação comercial com o Banco com toda a normalidade até 2003; 14ª - A autora não invoca que por causa daquelas transferências a sua relação comercial com outras empresas comerciais e, inclusive, com o Banco, tenha sido afectada; 15ª - A autora alterou conscientemente a verdade dos factos, em particular quanto ao momento do conhecimento das transferências; 16ª - O comportamento omissivo e conivente da autora criou no Banco uma situação objectiva de confiança, configurando a presente acção um comportamento contraditório de venire contra factum proprium, o que torna ilegítimo e abusivo o exercício do direito; 17ª - O exercício tardio, pela autora, do seu "direito" acarretou para o Banco uma desvantagem muito maior do que aquela que resultaria do seu exercício atempado, o que conduz à sua "neutralização", ainda que parcial, neste caso para as transferências posteriores à primeira ou, no máximo, posteriores ao primeiro mês - Fevereiro de 2001; 18ª - Ainda que razão assistisse à autora, sempre os juros devidos seriam os correspondentes à remuneração que a conta de depósitos à ordem auferia, por ser a taxa contratada para aquele tipo de depósitos, ou, no máximo, à taxa dos juros supletiva legal, actualmente de 4%; 19ª - A decisão sub judice deve ser revogada, pois fez errada apreciação da matéria de facto e aplicou mal o direito, violando as disposições dos arts. 218º, 224º/1, 236º, 334º e 405º e 406º do Cód....

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