Acórdão nº 1729/12.6TBCTB-B.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelAZEVEDO RAMOS
Data da Resolução25 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Nos autos de verificação e reclamação de créditos, a correr termos por apenso à insolvência de AA – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA, que foi declarada no 3º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco, veio o respectivo Administrador de Insolvência apresentar a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos e para os efeitos do art.129, nºs 1 e 2, do CIRE.

No prazo que lhes foi concedido, impugnaram a referida lista os credores BB e mulher CC, sustentando que o seu crédito, proveniente do incumprimento do contrato promessa celebrado com a insolvente, deveria ter sido graduado como dispondo de garantia, visto beneficiar do direito de retenção sobre o imóvel prometido vender.

Respondendo, o credor BANCO DD, SA, alegou que o crédito dos impugnantes se cingia ao sinal prestado no contrato promessa que celebraram com a insolvente, e não ao dobro dessa quantia (por eles reclamado); e também que esse crédito deveria ser graduado como comum por aos seus titulares não assistir qualquer direito de retenção.

Prosseguiram os autos com a selecção da matéria assente e a organização da base instrutória, de forma que a final se prolatou sentença do seguinte teor: I. Julgam-se verificados os créditos identificados na lista de credores elaborada pelo Sr. Administrador de Insolvência; II. Reconhece-se como privilegiado, por direito de retenção, o crédito reclamado por BB e mulher CC; e III. Procede-se à graduação dos créditos reconhecidos para serem pagos pelo produto da massa insolvente da seguinte forma: (…); Relativamente ao bem imóvel identificado no auto de apreensão de bens de fls. 2 do apenso A: - Em primeiro lugar, deverá pagar-se o crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente ao IMI, no valor de € 1.475,93; - Em segundo lugar, o crédito privilegiado, por direito de retenção, de BB e mulher CC; - Em terceiro lugar, o crédito, garantido por hipoteca, do Banco DD, SA, até ao montante máximo inscrito no registo; - Em quarto lugar, pagar-se-á o crédito privilegiado da Segurança Social; - Do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos comuns reconhecidos, a solver por rateio, na proporção dos seus créditos.

  1. Por fim, depois de integralmente pagos os créditos privilegiados, garantidos e comuns, serão pagos os créditos referentes a juros vencidos após a declaração de insolvência, em conformidade com o disposto nos art.ºs 48, alínea b) e 177 do CIRE.

    * Desta sentença, apelou o credor BANCO DD. S.A.

    A Relação de Coimbra, através do seu Acórdão de 10-12-2013, concedeu provimento à apelação, revogou em parte a sentença recorrida e decidiu: 1- declarar que o crédito reclamado por BB e mulher CC tem a natureza de crédito comum; 2- determinar que relativamente ao bem imóvel identificado no auto de apreensão de fls. 2 do apenso A, aludido em B), da sentença, o pagamento obedece à seguinte ordem: - Em primeiro lugar, pagar-se-á o crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IMI, no valor de € 1.475,93; - Em segundo lugar, pagar-se-á o crédito, garantido por hipoteca, do apelante Banco DD, SA, até ao montante máximo inscrito no registo; - Em terceiro lugar, pagar-se-á o crédito da Segurança Social; - Em quarto lugar, dar-se-á pagamento aos créditos comuns reconhecidos.

    3- No mais, foi mantida a sentença recorrida.

    * Agora, são os credores BB e mulher CC que pedem revista, ao abrigo dos arts 14 e 17 do CIRE, invocando que o Acórdão recorrido está em oposição com o Acórdão da Relação de Coimbra de 15-1-2013, transitado em julgado, proferido no Proc. nº 511/10.OTBSEI-E.C1, sobre a mesma questão fundamental de direito, ao entender não ter havido tradição, para os recorrentes, do andar objecto do contrato promessa de compra e venda, por a construção ainda não se encontrar concluída e o apartamento ainda não ter porta de entrada ou fechadura, não podendo por isso, valerem-se da garantia do direito de retenção.

    Os recorrentes concluem, resumidamente, as suas alegações, nos termos seguintes: 1 – O Acórdão recorrido, ao ter entendido não ter havido tradição do andar objecto do contrato promessa, por a construção não se encontrar concluída e o apartamento ainda não ter porta de entrada ou fechadura, não podendo, por isso, os recorrentes valerem-se da garantia do direito de retenção, é violador do disposto no art. 755, nº1, f) do C:C. e arts 174 e 175 do CIRE.

    2 – A tradição a que se refere o art. 755, nº1, al. f) do C.C. pode ser efectuada por tradição material, caracterizada pela existência de uma actividade exterior que traduz actos de entregar e receber, ou por tradição simbólica, que se opera através de um acto, ou de um objecto, que simboliza a entrega da coisa cuja posse se pretende transferir (por ex. entrega das chaves).

    3 – A tradição exigida para que se constitua o direito de retenção reclama apenas a detenção material lícita da coisa, não sendo necessário, para esse efeito, a posse.

    4 – No caso de promessa de venda de um apartamento integrado num prédio a submeter ao regime de propriedade horizontal, a tradição exigida para o direito de retenção a que se reporta o art. 755, nº1, al. f) do C.C. não necessita que a construção do prédio e, assim, do apartamento se encontrem concluídas.

    5 – O que está em causa é a detenção, e não a posse, bem como a garantia do pagamento de um crédito, e não o uso da coisa.

    6 – A tradição verificou-se através da estipulação constante da cláusula 6ª do aditamento de 27-8-2010 ao contrato promessa de compra e venda, bem como pela entrega das chaves do prédio, que então foi feita pela AA aos recorrentes. 7 – Tal acordo é inteiramente válido e eficaz, devendo ser respeitado e reconhecido pelo tribunal.

    8 – A não conclusão da construção não é causa de impedimento ou impossibilidade de tradição do andar.

    9 – Em consequência, o Acórdão recorrido deve ser revogado e substituído por outro que confirme e mantenha a sentença da 1ª instância, ou seja, que reconheça o crédito reclamado pelos aqui recorrentes como privilegiado e o gradue em segundo lugar, relativamente ao bem imóvel identificado no auto de apreensão de bens de fls 2, do apenso A, logo após o crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IMI, no valor de 1.475,93 euros, nos termos conjugados dos arts 755, nº1, al. f) e 759, nº2, ambos do Cód. Civil, e arts 174 e 175 do CIRE.

    * O Banco DD, S.A., contra-alegou, suscitando a questão prévia da inadmissibilidade do recurso, por considerar que não há oposição entre o Acórdão recorrido e o invocado Acórdão da Relação de Coimbra de 15-1-2013 sobre a mesma questão fundamental da direito, na medida em que, apesar de ambos os Acórdãos se tratar da mesma questão (o direito de retenção), o certo é...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
5 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT