Acórdão nº 1080/10.6TXCBR-H.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução25 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1. Nos Autos de Liberdade Condicional registados sob o nº 1080/10.6TXCBR-A, a correr termos no Tribunal de Execução de Penas de Coimbra, em que é arguido A…, pelo Mmo Juiz foi proferida decisão em 13/05/2013 (certificada a fls. 16 a 22 destes autos de recurso em separado), que não concedeu a liberdade condicional referido condenado.

  1. Inconformado com tal decisão, e pugnando pela revogação da mesma e a sua substituição por outra que lhe conceda a liberdade condicional, recorreu o arguido retirando da motivação do recurso as seguintes (transcritas) conclusões: “1ª Ao decidir como decidiu, não fundamentando, como não fundamentou, a douta decisão que nega a concessão da liberdade condicional ao ora aqui recorrente, o Meritíssimo Senhor Juiz a quo interpretou de forma manifestamente errada a norma do artº 374º, n. ° 2, do CPP; 2ª Posto que estava, por essa norma, obrigado a justificar as razões de facto e de direito da douta decisão, nos termos do disposto no artº. 379.°, n.° 1, al. a) do CPP; 3ª Já que não detinha o Meritíssimo Senhor Juiz a quo quaisquer elementos que o levassem a proferir a decisão que proferiu, e, assim, impunha-se necessariamente decisão diversa; 4ª Ao decidir como decidiu, o Meritíssimo Senhor juiz a quo interpretou de forma manifestamente errada a norma do art.º 61, n.º 2; 5ª Já que, também aqui, não detinha o Meritíssimo Senhor Juiz a quo quaisquer elementos que o levassem a proferir a decisão que proferiu, e, assim, impunha-se necessariamente decisão diversa.

    1. Ao decidir como decidiu, o Meritíssimo Senhor Juiz a quo interpretou de forma manifestamente errada as normas constitucionais dos princípios de adequação, da proporcionalidade e da necessidade, que, manifestamente, se acham violados.

    2. Tal e tanto implicam a revogação da douta decisão e a sua substituição por outra que conceda a liberdade condicional ao ora aqui recorrente.

    Fazendo-se, assim, a habitual e necessária JUSTIÇA!” * 3. O Ministério Público, junto do tribunal recorrido, respondeu ao recurso, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso e concluindo do seguinte modo (transcrição): “1 - A decisão de recusa de liberdade condicional impugnada não é uma sentença, desde logo porque não coloca termo ao processo.

    2 - Trata-se, porém de um acto decisório do Juiz do Tribunal de Execução de Penas que, conforme o disposto no artigo 146°, n.º 1, do CEPMPL e contrariamente ao alegado pelo recluso recorrente, se mostra devidamente fundamentado, permitindo perceber as razões de facto e de direito que conduziram ao sentido tomado nessa decisão que, além disso, obedece aos requisitos formais de uma sentença.

    3 - No se mostra, por isso, aplicável a tais actos decisórios o reclamado no disposto no artigo 374°, n.º 2, do Código de Processo Civil, que, no entanto, no caso em apreciação pela fundamentação da decisão proferida e pelas razões que ficam supra expostas na presente resposta, até se mostrarias plenamente satisfeito - inexistindo assim motivo para arguir qualquer vício processual e, nomeadamente, a nulidade cominada no artigo 379°, desse mesmo Código.

    4 - Também diversamente do que o recorrente pretende e como nos termos desenvolvidos nesta resposta melhor se sustenta, a decisão recorrida, recusando a concessão de liberdade condicional ao recluso, aqui recorrente, fez correcta e fundamentada apreciação dos pressupostos desse instituto, considerando no verificados os seus requisitos materiais.

    5 - No caso presente, foi considerado que o recluso não reunia os pressupostos materiais cumulativamente exigidos para concessão de liberdade condicional nem o juízo de prognose favorável à Iibertação, atentas tão elevadas exigências de prevenção especial [motivadas quer pela tenacidade que o agente colocou na execução do seu projecto atentatório da dignidade, da saúde e da integridade física e, por fim, da vida da vítima, quer pela insuficiente consciencialização do desvalor das suas graves condutas criminosas e da sua postura egocêntrica e de desvalorização e de desresponsabilização pessoal], nem a compatibilidade dessa libertação com a defesa da ordem e da paz social [tal era e é o alarme social sempre gerado pelos tipos de crime em causa, pela sua elevada danosidade, sendo no caso ainda mais acentuadamente concretizado, pela sequência dos acontecimentos: a um grave crime de violência doméstica, realizado por actos caracterizados por uma invulgar violência física e psíquica, sucede-se, a culminar uma escalada dessa violência, o crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com a vítima a sobreviver apenas pela grande resistência que conseguiu oferecer e pela assistência que lhe veio a ser prestada].

    6 - A decisão recorrida não atenta, por isso, contra qualquer preceito legal. Bem pelo contrário, faz correcta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 61°, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal.

    Nestes termos e pelo mais que, Vossas Excelências, Senhores Juízes Desembargadores, por certo e com sabedoria, não deixarão de suprir, julgando improcedente o recurso interposto, será feita Justiça.” 4. Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, a fls. 111 e 112, sufragando a posição evidenciada pelo Ministério Público de 1ª instância, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

  2. No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal, não foi apresentada resposta.

  3. Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

    1. FUNDAMENTAÇÃO Constitui jurisprudência constante e pacífica que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (arts 403º e 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

    No caso vertente, vistas as conclusões do recurso, as questões suscitadas são as seguintes: a) nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação; b) existência ou não de fundamentos para a concessão da liberdade condicional Vejamos a decisão recorrida que passaremos a transcrever, na sua quase totalidade: “1- RELATÓRIO Foram instaurados os presentes autos com vista à eventual concessão de liberdade condicional ao condenado A…, já identificado nos autos.

    O condenado encontra-se em reclusão no Estabelecimento Prisional da Guarda.

    O processo seguiu a sua normal tramitação e mostra-se devidamente instruído, mais tendo sido observadas todas as legais formalidades.

    Foram juntos aos autos os relatórios exigidos pelo artigo 173° do CEP.

    Nos termos do disposto no artigo 177° do CEP o Ministério Público, após a realização de Conselho Técnico, emitiu parecer desfavorável à concessão de liberdade condicional ao condenado (fls. 100 e 101).

    O Conselho Técnico, reunido em 2013.05.02, prestou os necessários esclarecimentos, mais tendo sido emitido parecer maioritariamente favorável (votos favoráveis dos serviços de vigilância e segurança, educação e ensino e reinserção social) à concessão da liberdade condicional ao condenado.

    Ouvido o recluso, em Auto de Declarações, o mesmo autorizou a sua colocação em liberdade condicional.

    * O tribunal é competente.

    O processo é o próprio.

    Não há nulidades, questões prévias ou incidentais de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

    2 - OS FACTOS E O DIREITO O instituto da liberdade condicional assume “um carácter de última fase de execução da pena a que o delinquente foi condenado e, assim, a natureza jurídica — que ainda hoje continua a ser-lhe predominantemente assinalada — de um incidente (ou de uma medida) de execução da pena privativa de liberdade. O agente, uma vez cumprida parte da pena de prisão a que foi condenado (pelo menos metade em certos casos, dois terços noutros casos) vê recair sobre ele um juízo de prognose favorável sobre o seu comportamento futuro em liberdade, eventualmente condicionado pelo cumprimento de determinadas condições — substancialmente análogas aos deveres e regras de conduta que vimos fazerem parte das penas de substituição da suspensão da execução da prisão e do regime de prova — que lhe são aplicadas. Foi, desta forma, uma finalidade específica de prevenção especial positiva ou de socialização que conformou a intenção político-criminal básica da liberdade condicional desde o seu surgimento.

    A aplicação da liberdade condicional assenta em vários pressupostos, de natureza formal e material.

    São pressupostos de natureza formal de tal instituto os seguintes: a) O consentimento do condenado (artigo 61°, n.º 1, do Código Penal (CP); b) O cumprimento de, pelo menos, seis meses da pena de prisão ou da soma das penas de prisão que se encontram a ser executadas (artigos 61°, nº 2 e 63°, nº 2, do CP); e) O cumprimento de 1/2, 2/3 ou 5/6 (em penas superiores a 6 anos) da pena de prisão ou da soma das penas de prisão que se encontram a ser executadas (artigos 61°. n°s 2, 3 e 4 e 63°, n° 2, do CP).

    A liberdade condicional quando referida a 1/2 ou a 2/3 da pena (liberdade condicional facultativa) consiste num poder-dever do tribunal vinculado à verificação de todos os pressupostos formais e materiais estipulados na lei, sendo que estes últimos são em número diferente consoante estejamos perante o final do primeiro ou do segundo dos supra referidos períodos de execução da pena de prisão.

    São pressupostos de natureza material da aplicação de tal instituto a 1/2 da pena: a) O supra referido juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado quando colocado em liberdade (als. a) e b), do artigo 61.º, do CP), o qual...

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