Acórdão nº 07448/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Outubro de 2008

Data02 Outubro 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_02

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO António ...

, agente da Polícia de Segurança Pública, a desempenhar funções na 34ª Esquadra da 2ª Divisão do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, veio interpor o presente RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO do despacho do Senhor Ministro da Administração Interna, datado de 20 de Maio de 2003, que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão, sustentando para o efeito que o mesmo enferma dos vícios de violação de lei, de usurpação de poder e de desvio de poder, consubstanciados na violação dos artigos 9º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e f), 13º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e e), 16º, nº 1 e nº 2, alínea f), 47º, nº 1 e nº 2, alínea a), 49º, nº 1, alínea c), 52º, nº 1, alíneas b) e h), 53º, nº 1, alínea c) e nº 3, 66º, 79º, nº 2 e 87º, nºs 1, 2 e 3, todos da Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro [RDPSP], do artigo 32º do Código Penal, dos artigos 61º, nº 1, alíneas a), b), e), f) e g) e 124º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal, dos artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 31º, nº 1, 58º, nº 1 e 71º, nºs 1 e 2, todos do Código de Procedimento Administrativo, e ainda os artigos 32º, nºs 1, 3, 5 e 7, 111º, 202º, nºs 1 e 2, 266º, nºs 1 e 2, e 269º, nº 3, todos da Constituição da República Portuguesa.

A entidade recorrida respondeu, sustentando que o acto recorrido não padece dos vícios que lhe são imputados, pelo que, em seu entender, o recurso não merece provimento.

Ordenado o cumprimento do disposto no artigo 67º do RSTA, veio o recorrente apresentar alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: "1 - A análise critica e objectiva da prova produzida não permite fundamentar um juízo de censura sobre o recorrente uma vez que não ficou indiciada a prática de qualquer infracção disciplinar por parte do mesmo; 2 - Estamos perante um vicio de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, uma vez que uma análise critica e imparcial de toda a prova produzida torna claro que não se encontram provados os factos dados como assentes no relatório final e acolhidos na íntegra pelo despacho recorrido, ficando claro que a prova produzida pela defesa não foi devidamente valorada, antes sendo reduzida a um mero formalismo, tendo sido violado o artigo 124º, nº 1 do Código de Processo Penal, entre outros, com directo desrespeito pelo princípio do contraditório e pelo fundamental princípio da justiça, não sendo sequer permitido ao arguido pronunciar-se sobre a totalidade da prova produzida; 3 - O recorrente foi condenado ao arrepio de toda a prova produzida, sendo brutalmente punido sem que tivesse desrespeitado quaisquer dos deveres a que estava adstrito enquanto agente da PSP e numa situação em que actuou perfeitamente enquadrado pelo instituto da legitima defesa tal como está previsto na lei portuguesa; 4 - Sendo que o arguido não foi notificado para se pronunciar após terem sido ouvidas as testemunhas por si arroladas, não tendo tido oportunidade para tecer quaisquer considerações sobre as mesmas, fundamentais como são para o andamento do processo, nem foi notificado do relatório final antes do despacho recorrido o acolher na integra, tendo assim sido prejudicado na sua garantia de defesa, tal como está previsto no artigo 61º, nº 1, alíneas a), b), e), f) e g) do Código de Processo Penal, aplicável em virtude do artigo 66º do RDPSP, e artigos 32º, nºs 1, 3, 5, e 7, 266º, nºs 1 e 2 e 269º, nº 3, todos da Constituição da República Portuguesa, também por isso enfermando o acto do vicio de violação de lei; 5 - Sendo que outra situação ilegal ocorreu em virtude de após concluída a investigação o instrutor ter demorado mais de dez dias a deduzir a acusação, pelo que foi violado o artigo 79º, nº 2 do RDPSP, tendo também sido excedidos os prazos estipulados nos artigos 58º, nº 1 e 71º, nºs 1 e 2 do Código de Procedimento Administrativo, até no que respeita ao prazo de conclusão do procedimento disciplinar, também por isso enfermando o acto do vicio de violação de lei; 6 - Tendo o prazo sido igualmente excedido no que respeita à elaboração do relatório final do instrutor após findar a instrução do processo, tendo passado mais de 5 dias, não tendo a entidade a quem cumpria a decisão prorrogado tal prazo, motivo pelo qual foi violado o artigo 87º, nºs 1, 2 e 3 do RDPSP, também por isso enfermando o acto do vicio de violação de lei; 7 - Mais, o acto recorrido enferma de vício de usurpação de poder uma vez que nem a IGAI nem Sua Excelência o Ministro da Administração Interna têm competência ou legitimidade para julgar o recorrente pela prática de qualquer ilícito criminal, tendo-o feito ao tomar decisão final sobre factos que ainda estão em investigação nos órgãos criminais competentes, não havendo ainda conclusões, tendo-se assim antecipado e feito substituir aos competentes Tribunais; 8 - E a verdade é que se o competente Tribunal Criminal vier a apurar que o arguido agiu enquadrado numa situação de legitima defesa, de imediato cairá toda a fundamentação utilizada no processo disciplinar e na qual se baseou o despacho recorrido para a sua condenação; 9 - Sendo que o acto recorrido enferma ainda do vício de desvio de poder uma vez que o fim real visado pela decisão recorrida só pode ter sido o de sossegar os ânimos exaltados pela comunicação social, a qual ultimamente tem feito uma cobertura sistemática de todas as ocorrências com agentes da PSP e tem feito passar a ideia de que os mesmos nunca são punidos pela administração, procurando-se assim acalmar os ânimos ao punir brutalmente um agente que mais não fez que defender a sua integridade física, sendo certo que o fim que a lei visou ao conferir à administração o poder em causa foi outro, prendendo-se com razões de segurança, disciplina dos agentes e realização da justiça; 10 - O despacho recorrido violou pois as normas dos artigos 9º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e f), 13º, nº 1 e nº 2, alíneas a) e e), 16º, nº 1 e nº 2, alínea f), 47º, nº 1 e nº 2, alínea a), 49º, nº 1, alínea c), 52º, nº 1, alíneas b) e h), 53º, nº 1, alínea c) e nº 3, 66º, 79º, nº 2 e 87º, nºs 1, 2 e 3, todos da Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro [RDPSP], do artigo 32º do Código Penal, dos artigos 61º, nº 1, alíneas a), b), e), f) e g) e 124º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal, dos artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 31º, nº 1, 58º, nº 1 e 71º, nºs 1 e 2, todos do Código de Procedimento Administrativo, normas que interpretou no sentido de poder e dever punir o recorrente quando as deveria ter interpretado no sentido de mandar arquivar os autos uma vez que a matéria em causa é de natureza puramente criminal e somente poderá ser apreciada pelo órgão criminal competente, além de que toda a prova produzida o foi no sentido de ilibar o recorrente de qualquer responsabilidade disciplinar uma vez que o seu comportamento não violou o disposto em qualquer dos preceitos indicados.

11 - Mais violou o despacho recorrido os artigos 32º, nºs 1, 3, 5 e 7, 111º, 202º, nºs 1 e 2, 266º, nºs 1 e 2, e 269º, nº 3, todos da Constituição da República Portuguesa, pelos mesmos motivos".

Por seu turno, também a entidade recorrida alegou, concluindo nos seguintes termos: "A. Os factos que determinaram a aplicação da pena disciplinar ao recorrente resultaram da correcta análise e ponderação da factualidade constante dos autos e de todas as circunstâncias em que aquela se verificou; B. Não se verifica o alegado vício de violação de lei por erros dos pressupostos de facto; C. O exercício do poder disciplinar não interfere com exercício do poder judicial pelo que não se verifica o alegado vício de usurpação de poder; D. O exercício do poder disciplinar, exercido nos termos da lei, não merece censura, pelo que o acto recorrido não está inquinado do vício de desvio de poder; E. A concreta medida da pena resultou da ponderação dos critérios constantes do artigo 43º do RDPSP; F. O recorrente violou os deveres referidos no acto recorrido, não tendo sido violadas as normas elencadas pelo recorrente e constantes dos artigos 9º, 13º e 16º do RDPSP; G. As normas previstas no CPP apenas têm aplicação no processo disciplinar nos casos de falta ou omissão de norma do RD/PSP, o que não se verifica relativamente às matérias alegadas pelo recorrente, pelo que não foram violadas quaisquer normas do CPP; H. Não se verifica a violação do artigo 32º do Código Penal porquanto a factualidade considerada provada afasta a possibilidade de o recorrente ter agido em legítima defesa; I. O uso indevido de arma de fogo, nas circunstâncias apuradas no processo disciplinar, justifica a aplicação da pena referida no acto recorrido; J. Não foram violadas as normas constantes dos artigos 47º, nº 1 e nº 2, alínea a) e do artigo 49º, nº 1, alínea c), todas do RD/PSP; K. Não foram violadas as normas constantes dos artigos 52º, nº 1, alíneas b) e h) e 53º, nº 1, alínea c) e nº 3, todos do RDPSP; L. Não foram violadas as normas contidas nos artigos 79º, nº 2 e 87º, nºs 1, 2 e 3, do RD/PSP; M. Não foram violadas as normas constantes dos artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 31º, 58º e 71º, referidas pelo recorrente, todas do CPA; N. Não foi violada qualquer das normas constitucionais invocadas pelo recorrente nomeadamente, as contidas nos artigos 32º, nºs 1, 3, 5 e 7, 111º, 202º, nºs 1 e 2, 266º, nºs 1 e 2 e 269º, nº 3, todas da Lei Fundamental".

E, finalmente, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, no qual sustenta que o recurso não merece provimento [cfr. fls. 125/130 dos autos].

Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento.

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a decisão, consideram-se assentes os seguintes factos: i.

    Na sequência de despacho do Ministro da Administração Interna, datado de 26-11-2001, foi instaurado processo de averiguações, destinado a apurar as circunstâncias em que, na manhã do dia 24-11-2001, o recorrente efectuara disparos com a arma de serviço que lhe estava distribuída, e que teriam atingido dois cidadãos...

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