Acórdão nº 293/12 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Joaquim de Sousa Ribeiro
Data da Resolução06 de Junho de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 293/2012

Processo n.º 566/11

  1. Secção

Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, em que são recorrentes A., B. e C. – Associação … e SETAA – Sindicato da Agricultura, Alimentação e Florestas, D. e Outros e recorridos o Ministério Público e o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), foram interpostos dois recursos de constitucionalidade, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).

    O recurso interposto por A., B. e C. – Associação … pretende a apreciação das seguintes questões:

    i) Inconstitucionalidade da norma do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), interpretada no sentido de que a contagem do prazo para a interposição do recurso se inicia, sempre, com o depósito do acórdão ou sentença, na secretaria do tribunal, independentemente da data em que o conteúdo do mesmo vier a ser colocado à disposição dos arguidos (Recorrentes), na sua totalidade, com caráter de estabilidade, em virtude da correção do acórdão ou sentença;

    ii) Inconstitucionalidade da norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretada no sentido de que o prazo para interposição do recurso, em que se impugne a decisão da matéria de facto e as provas produzidas em audiência de julgamento tenham sido gravadas, se conta sempre a partir da data do depósito da sentença na secretaria e não da data da disponibilização das cópias dos suportes magnéticos tempestivamente requeridas pelos arguidos.

    iii) Inconstitucionalidade das normas do artigos 101.º, n.° 3 [e não 100.º, como por manifesto lapso se refere no requerimento de interposição do recurso], 411.º, n.ºs 1 e 4, 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP, interpretadas no sentido de que em recurso em que se impugne a matéria de facto e as provas produzidas em audiência de julgamento tenham sido gravadas, requerida a cópia da gravação da prova produzida em audiência, apenas se suspende o prazo de interposição de recurso em curso, se simultaneamente (no mesmo momento) com o requerimento de solicitação das gravações, for entregue no tribunal o suporte técnico necessário à execução da cópia, mesmo que o tribunal não possua meios técnicos capazes de proceder às pretendidas gravações e só em momento posterior, venha a deferir por despacho judicial o então requerido, ou seja, a realização e fornecimento das pretendidas cópias.

    O recurso interposto por SETAA – Sindicato da Agricultura, Alimentação e Florestas, D. e Outros visa a apreciação das duas primeiras questões acima enunciadas, incluindo no âmbito da segunda delas, também a norma do n.º 5 do artigo 411.º do CPP.

  2. Por despacho de fls. 9753, foram os recorrentes notificados quanto à eventualidade de não conhecimento dos recursos na parte referente à questão supra identificada no ponto ii); e foram as partes notificadas para alegar quanto às questões acima identificadas nos pontos i) e iii).

  3. Os recorrentes SETAA – Sindicato da Agricultura, Alimentação e Florestas, D. e Outros, reclamaram para a conferência do despacho de fls. 9753, nos seguintes termos:

    Os recorrentes não se conformam com o despacho sumário do Exm.º Senhor Juiz Relator na parte em que decide pelo não conhecimento do recurso referente ao ponto 2-a) do requerimento do recorrente SETAA:

    “2. Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade;

    a. Da norma do art.° 411.°, n.ºs 1 e 5 do Cód Proc. Penal quando interpretada, como o foi na decisão recorrida, que ao prazo de 30 dias ali fixado não acresce que a Secção do Tribunal demorou a entregar ao recorrente a cópia das fitas magnéticas.”

    Com o devido respeito, a “dimensão normativa” ali em apreço, constitui no âmbito da decisão recorrida o seu verdadeiro “motivo de decisão”.

    Na verdade, na decisão recorrida diz-se a determinado passo que (4° parágrafo de fls.24):

    “se entende que, requerida cópia da gravação da prova produzida em julgamento, se suspende o prazo de interposição do recurso até ao momento em que tal pretensão seja efetivamente satisfeita”

    E prossegue dizendo mesmo:

    “Só desta forma se garante possibilidade de defesa…”

    “Prima facie”, tal posição seguiria na esteira do que quanto a esta matéria o Tribunal Constitucional tem decidido, designadamente que o prazo de 30 dias de recurso deve suspender-se durante o período de tempo em que o arguido não pode ter acesso às gravações de audiência, desde que pretenda impugnar a matéria de facto e desde que o arguido atue com a diligencia devida.

    Porém, a decisão recorrida “fez diverso do que disse”

    E na contagem do prazo de interposição do recurso não teve em atenção o período em que o mesmo se deveria considerar suspenso e correspondente ao lapso temporal em que o recorrente não teve acesso, por facto que não lhe é manifestamente imputável, às gravações da audiência.

    A atuação do recorrente desenvolveu-se com a diligência devida.

    E não pode ser penalizado pelo facto, aliás reconhecido pela decisão recorrida, de o Tribunal não ter os meios técnicos para a reprodução da cópia da prova produzida em julgamento.

    Temos para nós que é no arco da interpretação e aplicação da referida norma — art.° 411.°, n.° 1 e 4 que estabelece o prazo para interposição do recurso - que gira o núcleo do presente recurso, designadamente conjugado com o circunstancialismo que justifica e impõe a suspensão do aludido prazo.

    10º

    Tanto mais quando, como sucede no caso dos autos, sobre o requerimento em que se solicitou a cópia das gravações, incidiu despacho judicial a deferir a pretensão e a ordenar a entrega dos suportes técnicos necessários à gravação, uma vez que se mostravam ultrapassadas as insuficiências decorrentes de o Tribunal não ter os meios técnicos necessários à gravação.

    11º

    Deve, pelo exposto, conhecer-se igualmente do recurso quanto ao já supra mencionado ponto 2-a) do requerimento de interposição, uma vez que o art.° 411.°, n.ºs 1 e 4 do Código de Processo Penal, (na interpretação inconstitucional, por violação da garantia de defesa consignada no art.° 32.° CRP, de que ao prazo de 30 dias ali fixado não acresce o período que a Secção do Tribunal demorou a entregar ao recorrente), se mostra ter sido adotada como “ratio decidendi” da sentença recorrida.

    Termos em que com o mui douto suprimento de V. Exas. se requer seja proferida decisão em CONFERÊNCIA que determine que deve conhecer-se igualmente do objeto do recurso consignado no ponto 2-a) do requerimento de interposição de recurso, ordenando-se em consequência o respetivo prosseguimento. Assim se alcançará a costumada JUSTIÇA

  4. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal Constitucional respondeu a esta reclamação da forma que se segue:

    1.º

    Pelo douto despacho de fls. 9753 foi ordenada a notificação do recorrente para, querendo, se pronunciar sobre a eventualidade de não conhecimento do recurso em relação a uma das questões identificadas no requerimento de interposição.

    2.°

    O recorrente reclamou desta decisão para a conferência.

    3.º

    Não se trata, porém, de uma decisão da qual caiba reclamação, pelo que não iremos apresentar resposta a essa “reclamação”.

    4.º

    Oportunamente, nas contra-alegações, nos pronunciaremos sobre a questão prévia em causa.

  5. Os recorrentes A., B. e C. – Associação …, apresentaram alegações onde concluem o seguinte:

    1- O entendimento levado ao acórdão aqui recorrido é clara e materialmente violador de normas e princípios constitucionais.

    2-Por acórdão de 1/06/2010, os arguidos A. e B., foram condenados, pela prática de um crime de desvio de subsídio, previsto e punido pelo artigo 37.º, n.º 1 e n.° 3, do Decreto-lei n.º 28/94, de 20 de janeiro, conjugado com o artigo 202.º, alínea a), do Código Penal, nas penas de 1 ano e 4 meses de prisão e 100 dias de multa, cada um, à taxa diária de € 8,00. As referidas penas de prisão ficaram suspensas na sua execução, por igual período de tempo, condicionadas à restituição ao IEFP das quantias indevidamente apropriadas, sendo no caso dos arguidos A. e B. de € 23 699,30. A C.- Associação … e os arguidos A. e B. foram condenados a pagar, solidariamente, ao IEFP a quantia de €23 699,30, atualizada de acordo com os índices de inflação publicados anualmente pelo INE, desde a data de cada utilização indevida à data da condenação, a que acrescem juros de mora, à taxa legal prevista para os juros civis, desde a data da condenação até efetivo e integral pagamento, sendo tal quantia devida pelos arguidos A.e B. a título de indemnização.

    3-Em 14/06/2010, os arguidos A. e B., peticionaram a Correção/aclaração do mesmo acórdão, nos termos do disposto no artigo 380.º do CPP. Fundava-se este requerimento, na constatação de que dos “Factos Provados” constavam 463 itens, mas a numeração dos mesmos passava do n.º 422 para o n.º 432, colocando-se aos arguidos a dúvida, legítima, de saber se existiam mais factos dados como provados pelo coletivo, que não constassem, por lapso, do acórdão, revelando-se tal esclarecimento imprescindível para a tomada da decisão de recorrer, ou não, bem como para a elaboração do recurso, designadamente no que concerne à matéria de facto considerada provada, que fundamentou a sua condenação em primeira instância.

    4- O mencionado requerimento de Correção/Aclaração mereceu deferimento em 22/06/2010, tendo o acórdão sido objeto de correção ao abrigo do disposto no artigo 380.º do CPP, conforme decisão de fls. 8992 a 8994. Assim, o Tribunal da primeira instância concluiu pela existência de lapso quanto à matéria de facto dada como provada, determinando a correção da numeração dos pontos da matéria de facto dados como provados, e ainda, oficiosamente, determinou a correção do ponto A.e) do dispositivo do acórdão, por aí não ter sido feita alusão ao período de suspensão da execução das penas de prisão impostas.

    5- Esse despacho de Correção de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
  • Acórdão nº 451/13 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Julho de 2013
    • Portugal
    • [object Object],Tribunal Constitucional (Port
    • 22 Julio 2013
    ...no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, em aplicação da jurisprudência constante dos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 16/2010 e 293/2012. Não obstante isso, os autos prosseguiram os seus termos, em face do efeito meramente devolutivo que foi atribuído ao recurso interposto para o Tri......
1 sentencias
  • Acórdão nº 451/13 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Julho de 2013
    • Portugal
    • 22 Julio 2013
    ...no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, em aplicação da jurisprudência constante dos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 16/2010 e 293/2012. Não obstante isso, os autos prosseguiram os seus termos, em face do efeito meramente devolutivo que foi atribuído ao recurso interposto para o Tri......

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT