Acórdão nº 159/12 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução28 de Março de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 159/2012

Processo n.º 764/2011

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. Por sentença do 1º juízo criminal do Tribunal Judicial da Maia, A. foi condenado pela prática do crime de desobediência previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 348º, n.º 1, alínea a), e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal e 152º, n.º 3, do Código da Estrada, na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, e 18 meses de probição de conduzir.

    Dessa decisão, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, invocando, além do mais, a inconstitucionalidade das normas dos artigos 152º, n.º 3, do Código da Estrada e 4º, n.ºs 2 e 3, do Regulamento para a Fiscalização da Condução sob a Influência de Álcool, aprovado pela Lei 18/2007, de 17 de maio.

    Por acórdão de 29 de junho de 2011, a Relação confirmou o julgado, formulando um juízo de não inconstitucionalidade quanto às referidas disposições legais, pelo que o arguido veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 152º., nºs 1 e 3, do Código da Estrada e 4º, n.º 1, do Regulamento para a Fiscalização da Condução sob a Influência de Álcool, quando interpretadas no sentido de que a prova do estado de influenciado pelo álcool por análise ao sangue só pode ser feita quando o condutor não conseguir expelir ar suficiente após três tentativas sucessivas, não tendo o condutor direito de logo pedir a análise ao sangue sob pena de cometer um crime de desobediência.

    Tendo prosseguido o recurso, o recorrente apresentou alegações em que formulou as seguintes conclusões:

    A- O recorrente, no decorrer de uma ação de fiscalização do trânsito, foi submetido ao teste de álcool no sangue, através de aparelho qualitativo, vulgo, balão, tendo acusado uma taxa de 1,60 g/l, pelo que foi impedido de continuar a sua condução e conduzido para o posto policial.

    B- Aí, e de imediato, declarou expressamente à autoridade policial que não faria o teste no aparelho Dragger, mas que apenas pretendia fazer a contraprova por meio de análise ao sangue.

    C- No entanto, foi impedido pela autoridade policial de o fazer, com o argumento de que primeiramente se teria de submeter à prova através do aparelho apropriado, e só após três tentativas falhadas de expirar ar em quantidade suficiente é que poderia fazer a solicitada análise ao sangue.

    D- Entendeu erradamente a sentença recorrida que, perante estes factos, existiu uma recusa em se submeter ao teste de pesquisa, para determinação da taxa de álcool, com a intenção de se furtar à ação da justiça e, por isso, incorreu na prática do crime de desobediência p.p. pelo artigo 348º., n° 1, alínea a), do C.P., e como tal condenou o recorrente.

    E- Porém, não resulta dos factos provados que o recorrente se recusou a realizar o exame para determinação da taxa de álcool, mas que, pelo contrário, solicitou e pretendeu ser submetido a tal exame de uma forma mais precisa, segura, fiável e irrefutável - a prova por análise ao sangue, a qual é definitiva, não admitindo sequer contraprova.

    F- A lei estabelece que a deteção e determinação do álcool no sangue é feita, em alternativa, por dois métodos: ou por meio de aparelho aprovado ou por análise ao sangue. Artigo 153º., n° 2, alíneas a) e b) do CE e artigo l, n° 2 do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob a Influenciado Álcool - Lei 18/2007 de 17-05.

    G- São normas estabelecidas em favor e defesa do arguido, no caso o recorrente e que, por isso, não revestem a natureza perentória e preclusiva e cuja rigorosa observância pode ser afastada pelo examinando, e que como muitas outras disposições do Código de Processo Penal, estabelecidas em defesa dos direitos dos arguidos, por isso mesmo, podem ser afastadas ou precludidas por vontade deste.

    H-O Tribunal Constitucional acórdão unificador da jurisprudência n° 485/2011 decidiu declarar com força obrigatória geral:

    “... a inconstitucionalidade da norma constante do art° 153°, n° 6, do Código da Estrada, na redação do Decreto-Lei n°44/2005, de 23 de fevereiro, na parte em que a contraprova respeita ao crime de condução em estado de embriaguez e seja consubstanciada em exame de pesquisa de álcool no ar expirado, por violação do disposto na alínea c) do n° 1 do artigo 165° da Constituição”.

    I - Ora, tendo este Tribunal Constitucional declarado inconstitucional a referida norma, daqui decorre a recusa do arguido em se submeter à contraprova através da pesquisa de álcool no ar expirado é legítima, se pedir a contraprova através de exame de sangue, como sucedeu neste caso, e não pode ser suscetível de fazer incorrer o arguido em qualquer sanção penal, nomeadamente no crime de desobediência previsto e punível pelo artigo 348°, n° 1, a), 69°, n° 1, a), ambos do C. Penal, e art° 152°, n°6 do Código da Estrada e do qual foi condenado, pelo que deverá ser revogado o douto acórdão recorrido e o arguido absolvido do crime de desobediência.

    J - É inconstitucional a interpretação que a sentença faz do disposto nas feridas disposições legais, pois não houve qualquer recusa do recorrente a efetivar o teste para determinação da taxa de álcool, e não poderia, como fez a sentença recorrida, considerar legal e legítima a recusa da autoridade em realizar o exame sanguíneo solicitado pelo recorrente.

    K - Ao decidir e interpretar as disposições legais mencionadas, nomeadamente, o prescrito nos artigos 152, n°3, e 153, n°s 3, 4 e 5, do CE e artigo 1º n°s 2 e 3 e artigo 4° da Lei 18/2007, da forma descrita fez diminuir as garantias de defesa do recorrente e até impossibilitou o recorrente de se defender da prática dos atos que lhe eram imputados, o douto acordão recorrido violou os princípios constitucionais da igualdade de armas, da proporcionalidade, da presunção de inocência, do contraditório e das garantias de defesa, consagrados no artigo 2° da Constituição.

    L - Assim sendo, o douto acórdão recorrido deverá ser revogado e substituído por outro na qual se declare inconstitucional a interpretação do artigo 152º., nºs 1 e 3 do Código da Estrada e do artigo 4° n° 1 do Regulamento para a Fiscalização da Condução sob a Influência do Álcool, estabelecido na Lei 18/2007, feita nesse mesmo acórdão, devendo essa declaração ter o conteúdo seguinte:

    Declaram-se inconstitucionais o artigo 152º n° 1 e n° 3 do Código da Estrada e o artigo 4° n° 1 do Regulamento para a Fiscalização da Condução sob a Influência do Álcool, estabelecido na Lei 18/2007, desde que interpretados no sentido de que, efetuado o teste qualitativo do álcool no sangue, não é permitido ao arguido escolher a modalidade de contraprova que pretenda efetuar.

    E, em consequência, se absolva o arguido do crime por que vem condenado.

    O Exmo Procurador-geral adjunto contra-alegou, concluindo do...

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