Acórdão nº 449/11 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução11 de Outubro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 449/2011

Processo n.º 898/10

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. No Tribunal Judicial de Matosinhos foi proferida sentença, na acção de impugnação de paternidade que A. propôs contra B. e C. a pedir a sua condenação a reconhecerem que o autor não é pai do 2º réu, que decidiu:

    [...] Certo é, no entanto, que o art. 1842º, nº 1, al. a) do Código Civil estabelece um prazo de caducidade para a propositura de uma tal acção: o marido da mãe dispõe de um prazo de três anos, a contar da data do seu conhecimento sobre a não paternidade, para esse efeito.

    No caso em apreço, é manifesto que o autor vem intentar a presente acção de impugnação de paternidade muito depois dos três anos prescritos na referida norma, pois sabia-o já quando casou com a mãe do C., antes do nascimento deste, sabendo-se que esta conta já mais de 19 anos. Mas nem por isso deve considerar-se caducado o direito do autor à propositura desta acção, como se passa a justificar.

    O Acórdão do TC 11.0 23/2006, de 10-01, declarou inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma do n.º 1 do art. 1817.º do CC, nos termos da qual o direito de investigar a paternidade caducava nos dois primeiros anos posteriores à maioridade do investigante. A Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril veio introduzir uma alteração a essa norma, designadamente ampliando para dez anos aquele prazo de dois anos. Porém, como vem assinalando a jurisprudência, a esta nova solução são ainda aplicáveis as razões que fundaram a anterior declaração de inconstitucionalidade: continua a ser materialmente inconstitucional uma norma que estabelece um tal prazo ‘na medida em que é limitador da possibilidade de investigação a todo o tempo, constituindo, o estabelecimento do mesmo e nos tempos que correm, com o novo paradigma do direito fundamental à identidade pessoal e de livre desenvolvimento da personalidade, uma restrição não justificada, desproporcionada e não admissível do direito do filho saber em vida de quem descende.” (Ac. do STJ de 21/9/2010, proc. nº 4/07.2TBEPS.G1.S1; cfr. também Ac. do STJ de 21/9/2010, proc. nº 495/04 – 3TBOR.C. 1 .S. 1, ambos in www.dgsi.pt).

    Os interesses que estão em causa no citado juízo de inconstitucionalidade material, traduzidos na afirmação da verdade biológica, na identidade pessoal e no livre desenvolvimento da personalidade, protegidos pelo art. 26º da Constituição da República Portuguesa, verificam-se não apenas nas situações de investigação da filiação, mas, identicamente, também naquelas em que se pretende excluir uma relação juridicamente estabelecida mas não coincidente com a verdade biológica.

    Veja-se, a este propósito e neste sentido, o Ac. do STJ de 25/3/20 10, proc. nº l44/07.8TBFVN.C1.S1, in www.dgsi.pt:

    I-(...)

    II - Na acção de impugnação de paternidade proposta pelo marido da mãe, o autor defende um direito próprio à verdade biológica, com vista a ilidir a presunção de paternidade atentatória da mesma.

    III- (...)

    IV - Se o filho pode impugnar a paternidade, sem limitação de prazo, também, a impugnação da paternidade pelo presumido progenitor pode ser intentada, sem incorrer em caducidade, sob pena de inaceitável discriminação de um dos elos da relação jurídico-filial.

    V - A impugnação deduzida pelo autor, relativamente à paternidade presumida do réu menor, no que concerne à substância de um casamento que não chegou a durar sete anos e de uma coabitação inferior a quatro, não agride um estado jurídico e social prévio, dotado de uma longevidade e densidade consideráveis, capaz de justificar uma particular censura jurídico-constitucional.

    VI - A norma constante do art. 1842.º, n.º 1, al. a), do CC, na dimensão interpretativa que prevê um prazo limitador da possibilidade do progenitor e marido da mãe propor, a todo o tempo, acção de impugnação da paternidade, desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se que não era pai biológico, é inconstitucional, por violação do direito à tutela judicial efectiva e bem assim como do preceituado pelos arts. 26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da CRP.”

    Tal como anteriormente se referiu, e agora à luz da argumentação superiormente desenvolvida no Acórdão cujo sumário se citou, a que se adere in totum, recusa-se a aplicação do prazo limitador da propositura da acção, pelo marido da mãe – caso do aqui autor – constante do art. 1842, nº 1, al. a) do Código Civil, por ofensa do direito à integridade e à identidade pessoal, garantidos pelos arts. 25º e 26º da CRP.

    Por consequência, recusando-se a aplicação, por inconstitucionalidade material, ao caso em apreço, do disposto no art. 1842º, nº 1, al. a) do C.C., nada impede a procedência desta acção, importando reconhecer razão ao autor, afirmando-se a sua não paternidade em relação a C., havendo de se determinar a correspondente alteração no respectivo assento de nascimento.

    Inútil é, além de inviável a fixação da data provável de concepção do C., que o autor incluiu no seu pedido.

    Por todo o exposto, com fundamento nas normas legais citadas, maxime no art. 1839º, nº 2 do Código Civil, e recusando-se a aplicação, por inconstitucionalidade, do prescrito pelo art. 1 842º, nº 1, al. a) do C. Civil, julgo a presente acção provada e procedente, em razão do que...

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