Acórdão nº 408/09.6GAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelJORGE DIAS
Data da Resolução20 de Dezembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

26 No processo supra identificado foi proferida sentença que julgou procedente a acusação deduzida pelo Magistrado do Mº Pº contra o arguido: A...

, residente na …, Montemor-o-Velho Sendo decidido: 1) Condenar o arguido como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292, n.º 1, do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa à razão diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia total de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros).

2) Condená-lo, ainda, na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 4 (quatro) meses, nos termos do artigo 69, n.º 1, alínea a), do Código Penal.

***Inconformado, da sentença interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões na motivação do mesmo: 1.o tribunal a quo não poderia ter julgado como provado que "no dia 10- 04-2009, cerca das 22:00 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula … , na Rua … , Montemor-o-Velho", "e enquanto conduzia, era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,67 g/l".

  1. Por um lado, porque o arguido (como ele próprio confessou) apenas ingeriu bebidas alcoólicas cerca de 30 minutos antes do acidente.

  2. Por outro lado, porque a colheita de sangue do arguido donde resultou uma TAS de 1,67 g/l apenas foi efectuada pelas 00:35 minutos do dia 11/04/2009, isto é, cerca de 02:30 horas após o despiste.

  3. Nunca se poderá considerar como provado que 2 horas e meia antes, o arguido conduzia o seu veículo automóvel em estado de embriaguez, com uma taxa de álcool no sangue de 1,67 g/l.

  4. Como refere o AC. Rel. Porto de 09/12/2009 (proc. 1421/08. 6PTPRT .P1) "O crime previsto no art. 292 n° 1 do C Penal é de perigo abstracto, exigindo a verificação, no momento da sua prática, de todos os elementos objectivos do tipo" 6. In Casu a ilicitude (consubstanciada na taxa de álcool no sangue), não foi verificada na altura da prática do facto, mas apenas cerca de duas horas e meia depois, não sendo legalmente possível extrapolar o resultado obtido para aquela hora.

  5. O Tribunal não julgou correctamente os factos alegados na contestação do arguido (ao não os ter considerado como provados e relevantes para a decisão da causa), nomeadamente os que referem que os agentes da GNR não mostraram ao arguido o resultado do teste qualitativo efectuado no CHC, nem o informaram de tal resultado; o arguido não foi informado do objectivo da colheita de sangue que lhe foi efectuada, nem foi pedida ao arguido autorização para lhe tirarem sangue para verificação da TAS e o arguido se apresentava perfeitamente consciente e orientado.

  6. Deveriam ter sido julgados como provados pelo tribunal a quo, os factos acima referidos que se encontravam alegado na contestação do arguido.

  7. O tribunal a quo considerou incorrectamente como provado que o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula … , na Rua … , Montemor-o-Velho", "e enquanto conduzia, era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,67 g/l".

  8. A prova da ilicitude do facto foi recolhida, não na altura da prática do facto, mas cerca de 2 horas e meia depois, o que equivale a dizer que o resultado do teste de sangue efectuado ao arguido não pode ser valorado e utilizado como meio para provar que este conduzia, no dia, hora e local indicados na sentença, com taxa de álcool no sangue de 1,67 g/l.

  9. É inválida a prova do álcool deveria o arguido ter sido absolvido do crime de que vinha acusado.

  10. Os Agentes da GN R não cumpriram o disposto nos arts. 153 nºs 2, 3 e 8 e 156 nºs 1 e 2, todos do C Estrada.

  11. Nem dos depoimentos prestados, nem de qualquer documento junto aos autos consta que o arguido deu o seu consentimento (expresso e esclarecido) para que lhe fosse recolhido sangue para verificar a TAS, pois desse consentimento esclarecido dependia a legalidade do meio de prova por ser acto violador da integridade física, como decorre do disposto no artigo 126, nº 1 do Código de Processo Penal e 32, n° 8 da CRP.

  12. O conjunto normativo dos artigos 152, nº 2, 153, nº 8 e 156, n° 2 do Código da Estrada que permite a colheita de sangue para determinação da taxa de álcool sem possibilitar ao condutor a sua recusa esclarecida sem consequências penais está ferido de inconstitucionalidade orgânica.

  13. A prova assim recolhida é nula, não podendo considerar-se como provado que o arguido conduzia o seu veículo automóvel sob o efeito do álcool.

  14. O que deverá levar à sua absolvição.

  15. Caso assim se não entenda, atendendo ao facto de o arguido ser primário, ser guarda prisional em Aveiro e necessitar da carta de condução para se deslocar para o trabalho, entende-se que os 4 meses d inibição de conduzir são excessivos, devendo ser-lhe aplicada inibição de conduzir pelo período de 2 meses.

  16. Com a decisão preferida foi violado o disposto nos arts. 292, nº 1 do C Penal, arts. 152 nº 2, 153, nº 8 e 156 nº 2 do C Estrada e sofre dos vícios constantes do art. 410, n° 2, alíneas a) e c) do C. P. Penal.

    Deverá o recurso merecer provimento e, em consequência, ser a sentença proferida revogada e substituída por outra que absolva o arguido do crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

    Caso ainda assim se não entenda deve a pena acessória de inibição de conduzir ser reduzida de 4 para 2 meses.

    Responde o Magistrado do Mº Pº, concluindo: 1- Da análise da douta sentença recorrida resulta que a Mm.ª Juiz a quo analisou a documentação junta, considerou a prova produzida, tudo sopesou no âmbito da livre apreciação da prova (artigo 127 do Código de Processo Penal) e acabou por decidir quanto à matéria de facto.

    2- Da leitura da motivação da decisão sobre a matéria de facto decorre que o tribunal fundou a sua convicção, quanto aos pontos específicos da matéria de facto ora em apreço, essencialmente, nas declarações do próprio arguido e nos depoimentos das testemunhas … e … , e ainda nas regras de experiência comum e do normal acontecer.

    3- A fundamentação da decisão ora em recurso relativa à matéria de facto respeitou os princípios da livre apreciação, da oralidade e da imediação na produção da prova.

    4- E só estes princípios permitem o indispensável contacto vivo e imediato não só com o arguido e com as testemunhas, recolhendo a impressão deixada pela sua personalidade, mas também permitem avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas por cada um destes participantes processuais.

    5- Assim, por respeito a tais princípios, deve o Venerando Tribunal da Relação, no presente caso, manter a douta decisão recorrida relativa à matéria d facto, já que esta se mostra fundamentada na sua livre convicção e é uma das possíveis soluções (diremos, para nós, a única) segundo as regras da experiência comum.

    6- Acresce que, não se infere no presente caso que, no processo de valoração e decisão, no âmbito da livre apreciação, tenha a Mm.ª Juiz a quo actuado contra a lei ou de modo desconforme aos ditames da razão, da lógica e da experiência comum, pelo que deverá ser mantida a decisão quanto à matéria de facto.

    7- Por outro lado temos que, não se encontra legalmente estabelecido um período de tempo máximo para recolha da prova da condução sobre a influência do álcool, decorrido o qual a prova da TAS teria de ser considerada como inválida.

    8- A este respeito dispõe o artigo 5.° da Lei n.º 18/2007, diploma que estabelece o Regulamento da Fiscalização da Condução sobre a Influência do Álcool ou das Substâncias Psicotrópicas, nos seus n.ºs 1 e 2 que "[a] colheita de sangue é efectuada, no mais curto prazo possível, após o acto de fiscalização ou a ocorrência do acidente. Posteriormente, a amostra de sangue é enviada à delegação do Instituto Nacional de Medicina Legal da área respectiva, pelo estabelecimento que procedeu à colheita." 9- Ora, no presente caso, o recorrente, após ter sido interveniente em acidente de viação, foi de imediato transportado para o Centro Hospitalar de Coimbra. Aliás, quando compareceu no local do acidente o senhor Militar da G.N.R. que elaborou o auto de ocorrência, o recorrente já se encontrava dentro da ambulância, pronto a ser transportado para o Hospital. De imediato foi contactado o Posto da G.N.R. mais próximo do Hospital para onde foi transportado o recorrente, tendo então sido enviados dois militares daquela força policial para procederem ao exame para pesquisa de álcool. Aí chegados, estes procederam à fiscalização para pesquisa de álcool no sangue do recorrente assim que isso lhes foi possível, tendo em conta que este se encontrava a receber tratamento médico.

    10- Não vislumbramos, assim, qualquer irregularidade no procedimento dos senhores Militares da G R que pudesse conduzir à invalidade da prova por si recolhida.

    11- Alega ainda o recorrente que o procedimento dos agentes da G.N.R., ao solicitarem a colheita de sangue para prova efectiva da TAS após ter sido efectuado teste ao ar expirado que deu resultado positivo, "viola claramente o disposto nos artigos 153, n.ºs 2, 3 e 8, e 156, n.ºs 1 e 2, do Código da Estrada. Entende aquele que os agentes da G.N.R. deveriam, não só tê-lo notificado do resultado do teste qualitativo, como também informá-lo das sanções legais dela decorrentes e de que poderia requerer contraprova. No entanto, mais uma vez o recorrente carece inteiramente de razão.

    12- Com efeito, o recorrente pressupõe como verdadeiros factos, e dos mesmos constrói a sua teoria, que não foram dados como provados na douta sentença ora em recurso.

    13- Na verdade, foi dado como não provado que "os agentes da GNR não mostraram ao arguido o resultado do teste qualitativo efectuado no CHC, nem o informaram de tal resultado", que "o arguido não foi informado do objectivo da colheita de sangue que lhe foi efectuada, nem foi pedida ao arguido autorização para lhe tirarem sangue para verificação da TAS".

    14- Ora, logo por aqui cai pela base a argumentação do recorrente uma vez que a mesma se encontra alicerçada em factos dados como não provados...

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