Acórdão nº 80/10.0PTPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Dezembro de 2011

Data14 Dezembro 2011
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 80/10.0PTPRT-A.P1 1ª secção Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO No âmbito do Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que corre termos no 4º Juízo Criminal de Matosinhos, o arguido B… foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. no artº 292º do Cód. penal na pena de 95 dias de multa à taxa diária de € 7,00.

Tendo-se frustrado as tentativas para proceder à notificação pessoal do arguido do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, o Mº Público promoveu que o mesmo fosse notificado “através de via simples, para a morada constante do TIR ou outra que este tenha comunicado aos autos”.

Por despacho proferido a 06.09.2011 foi indeferida aquela promoção.

Inconformado o Mº Público interpôs o presente recurso, extraindo das respectivas motivações as seguintes conclusões: 1. No despacho recorrido, foi recusada a notificação do arguido, por via postal simples, do despacho que determinou a conversão da pena de multa em prisão subsidiária, com fundamento na extinção do TIR, e das obrigações dele decorrentes, após o trânsito em julgado da sentença, conforme prescrito pelo artº 214º nº 1 al. e) do Código de Processo Penal; 2. Não obstante o teor literal desta norma, “uma boa interpretação da lei [é aquela] que, numa perspectiva prático-normativa, utiliza bem a norma como critério de justa decisão do problema concreto” (Castanheira Neves). Não ponderar nas consequências práticas é tornar a interpretação jurídica um mero jogo teórico sem utilidade social, não ponderar nos valores constitucionais é torná-la uma “ordem” sem sentido de justiça material; 3. Nesta perspectiva, dever-se-á defender que a ratio do artº 214º nº 1 al. e) do Código de Processo Penal não é extensível à forma de notificação postal simples prevista no artº 196º nº 2 do Código de Processo Penal, uma vez que: - o TRI é inerente à posição de arguido, a qual não se extingue até ao arquivamento do processo – artº 57º nº 2 do Código de Processo Penal (Souto Moura); - ou essa forma de notificação é comum ao arguido e a outros sujeitos processuais, não tendo qualquer conteúdo coactivo e não fazendo parte, por isso, do TIR enquanto medida de coacção (Ac. do TRP de 06/04/2011, proferido no proc. 53/10.3PBMTS-A.P1); 4. Esta é solução imposta pela “normatividade jurídica vigente”: - se antes da sentença, o TIR é, do ponto de vista dos direitos do arguido, admissível, apesar de poder redundar na condenação ou sofrimento de uma pena mais gravosa, por maioria de razão deve-o ser depois do respectivo trânsito em julgado, especialmente quando se trata de um despacho de aplicação ope legis, que não altera a natureza da pena de multa de cuja sentença condenatória a arguida tem conhecimento pessoal; - está longe de não salvaguardar os direitos de defesa e do contraditório do arguido, uma vez que o “não conhecimento pelo arguido do acto notificado nestas situações é imputável ao próprio arguido” (Ac. do Tribunal Constitucional 17/2010), “sobre o qual impende um dever geral de diligência [Ac. TC 545/2006; 378/2003; 111/2007]” em ordem a conferir funcionalidade aos seus direitos e deveres (Ac. do TRP de 02/03/2011, proferido no proc. 230/07.4GBLMG.P2); - e opera a ponderação mais razoável (artº 18º nº 2 da CRP), entre os direitos de defesa do arguido (artº 32º nº 1 da CRP) e a existência de uma administração de justiça penal eficaz, base da existência de um Estado de Direito (artº 2º da CRP); 5. Outra perspectiva: - tutela apenas a irresponsabilidade dos arguidos, na melhor das hipóteses, ou a fuga consciente à aplicação das penas a que foi condenado, na pior; - e coloca em causa a eficácia da administração da justiça penal, revelada in casu pela impossibilidade de execução de uma mera pena de multa de 40 dias (?) há mais de um ano e meio; 6. A doutrina consagrada no AUJ 6/2010 exige, a latere, a sua aplicação à notificação do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, especialmente porque, do ponto de vista do exercício dos direitos de defesa do arguido, são mais importantes as notificações no âmbito de execução da pena de prisão suspensa, do que as notificações no âmbito da execução da pena de multa; 7. Nestes termos, a decisão recorrida, não procedendo a uma interpretação restritiva do artº 214º nº 1 al. e) do Código de Processo Penal, violou o disposto nos artºs. 57º, nº 2, 196º nº 1 e 204º do Código de Processo Penal.

*Devidamente notificado, o ilustre defensor do arguido não respondeu às motivações de recurso.

*Neste Tribunal da Relação o Sr. Procurador-Geral Adjunto limitou-se a apor o seu visto.

*Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

* *II – FUNDAMENTAÇÃO É o seguinte o teor do despacho recorrido: (transcrição) «A promoção do Ministério Público visa aplicar às formalidades da notificação do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária a mesma tese que fez vencimento no Ac. de Fixação de Jurisprudência nº 6/2010.

Ou seja, entendendo-se que as obrigações resultantes do TIR se mantêm para além do trânsito em julgado da sentença, pretende-se que a notificação do condenado se realize por via postal simples, nos termos do disposto no artº 113º nº 1 al. c) e 196º nº 2 e 3, al. c).

É certo que a situação sobre a qual versou o aludido Acórdão – notificação do...

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