Acórdão nº 4401/08.8TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução27 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – No Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais, AA intentou a presente acção declarativa contra: O Instituto de Segurança Social, I.P.

Alegou, em síntese, que: Vivia, como marido e mulher, há mais de dez anos, com BB; Esta era beneficiária da Segurança Social, titular do cartão de pensionista nº 000000000000; Faleceu, no estado de solteira, em 13.12.2007.

Pediu, em conformidade, que: Se declare que vivia em união de facto com a falecida, há mais de dois anos contados da data do decesso; Tem direito às prestações por morte dela, nos termos do artigo 2020.º do Código Civil e demais normas aplicáveis.

Contestou o Instituto de Segurança Social, I.P. aceitando alguns dos factos alegados e dizendo desconhecer outros, que não são pessoais nem deles deve ter conhecimento.

II – A acção prosseguiu e, na altura oportuna, foi proferida sentença que a julgou improcedente por não provada, absolvendo o réu do pedido.

Entendeu, no essencial, o Sr. Juiz que: O autor tinha, nos termos do artigo 2020.º do Código Civil, que alegar e provar que tinha necessidade de alimentos e que não os podia obter de cônjuge seu, descendente, ascendente ou irmãos.

Não o tendo feito, a acção tinha que improceder.

III – Apelou o autor e o Tribunal da Relação de Lisboa: Revogou a sentença; Declarou que o autor vivia, em união de facto, há mais de dois anos com a BB, contados tendo como referência a morte desta; Tendo, por isso, direito às prestações por morte dela, no âmbito dos regimes de segurança social, previstos na Lei, nomeadamente, no Decreto-Lei n.º 322/90, de 18.10.

O entendimento dos Senhores Desembargadores foi vertido no sumário elaborado pela Relatora que é do seguinte teor: “1 - O direito às prestações sociais a favor de quem viveu em união de facto com beneficiário de qualquer regime público de segurança social, depende apenas da demonstração dessa qualidade de beneficiário do membro falecido, do seu estado civil (solteiro, viúvo, divorciado ou separado judicialmente de pessoas e bens) do referido beneficiário e do preenchimento dos requisitos legalmente impostos para a eficácia da união de facto (vivência em condições análogas às dos cônjuges por mais de dois anos), não dependendo da alegação e prova da necessidade de alimentos e da impossibilidade da sua prestação por parte dos familiares do requerente e por parte da herança do falecido.

2 - Estas conclusões impõem-se actualmente face ao quadro jurídico emergente designadamente da Lei nº 23/10, de 30-08, que é uma lei interpretativa; o que quer dizer que retroage os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada.” IV - Pede revista o réu, concluindo as alegações do seguinte modo: 1.ª - O artº 8º do Dec. Lei 322/90 ao remeter para a situação prevista no artº 2020º nº 1 do Código Civil está a equiparar a situação de quem tem direito à pensão de sobrevivência à situação de quem tem direito a alimentos da herança.

  1. - Isto é, a situação que se exige no artº 8º, para ser reconhecido o direito às prestações de Segurança Social é a mesma daquele que tem direito a exigir alimentos da herança, nos termos do artº 2020º nº 1 do C. Civil.

  2. - Na sequência do disposto no artº 8º nº 2 do DL 322/90 foi publicado o Dec. Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, que nos seus artºs 3º e 5º estabeleceu as condições e processo de prova de atribuição das prestações às pessoas que se encontram na situação prevista no nº 1 do artº 8º do DL 322/90 (o mesmo é dizer situação prevista no nº 1 do artº 2020º do C. Civil.).

  3. - Daqui resultando que atribuição das prestações por morte depende: da sentença judicial que reconheça o direito a alimentos da herança ao requerente (nº 1 do artº 3 do Dec. Reg. 1/94 de 18/01), desde que na acção intervenha a Segurança Social (artº 6º da Lei 7/2001), ou do reconhecimento judicial da qualidade de titular das prestações por morte no caso de não ter sentença que lhe reconheça o direito a alimentos por falta ou insuficiência de bens da herança (artº 3º nº 2 do Dec. Reg. 1/94 e artº 6º da Lei 7/2001).

  4. - Isto é, tanto na situação prevista no nº 1 do artº 3º, como na prevista no nº 2 do mesmo artigo do Dec. Regulamentar nº 1/94 será necessário alegar e provar: a) que o “de cujus” era pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens; b) factos demonstrativos ou integrados do conceito união de facto há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges (artº 2020º C. Civil); c) factos demonstrativos da inexistência ou insuficiência de bens da herança (nº 2 do artº 3º do Dec. Reg. Nº 1/94 e artº 6º da Lei nº 7/2001); d) factos demonstrativos de não poder obter alimentos nos termos das alíneas a) a d) do artº 2009º C. Civil; e) factos demonstrativos da necessidade de alimentos e da impossibilidade de ele próprio prover à sua subsistência (sublinhado nosso).

  5. - Donde para atribuição da pensão de sobrevivência é condição essencial e necessária a obtenção da sentença judicial onde se reconheçam e verifiquem todos aqueles pressupostos.

  6. - Ora no caso sub judice, o douto Tribunal “a quo” remete no seu douto Acórdão para alguma Jurisprudência do nosso Supremo Tribunal de Justiça que surgiu logo a seguir à decisão do TC proferida no Acórdão nº 88/2004, mas que rapidamente foi inflectida e corrigida tanto pelo nosso TC como pelo STJ, como mais adiante melhor explicaremos.

  7. - Jurisprudência essa, hoje, muito minoritária, em face daquela que emana da que vem vertida no Acórdão do Plenário do TC nº 614/2005, de 09.11.2005, que e em síntese, diz que não são inconstitucionais as normas do artº 8º do DL nº 322/90, de 18/10, do Dec. Reg. nº 1/94, de 18/01 e da Lei 7/2001, de 11/05, na parte que fazem depender a atribuição das prestações por morte de um beneficiário da Segurança Social a quem com ele conviva em união de facto, da prova de todos os requisitos previstos no nº 1 do artº 2020º do C Civil.

  8. - Por isso, entendemos, na nossa modesta opinião, que mal esteve o douto Tribunal “a quo” quando diz “de acordo com a corrente jurisprudencial citada (não dominante), entendemos que os requisitos exigíveis ao membro sobrevivo da união de facto, para que possa aceder às prestações sociais decorrentes da morte de um beneficiário de um qualquer regime público de segurança social, reconduzem-se apenas à prova relativa ao seu estado civil e à circunstância de respectivo interessado ter vivido em união de facto, há mais de dois anos, com o falecido”.

  9. - E quando acrescenta “E como argumento adicional importa reter que o art 6º da Lei nº 7/2001, na redacção dada pela Lei 23/10, de 30-08, é uma norma interpretativa, que se integra na norma interpretada; o que quer dizer que retroage os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada”.

  10. - E por fim quando conclui “Vemos, assim, que o que o ora apelante tinha que alegar e provar era que vivera por mais de dois anos em união de facto com a falecia BB, que esta era pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, e que tinha a qualidade de beneficiária da segurança social. Desinteressante para a procedência da acção era a prova da carência de alimentos por parte da A. e a insusceptibilidade de os obter dos parentes ou da herança”.

  11. - Como mal esteve ainda o douto Tribunal “a quo” ao deliberar dar provimento à Apelação, ao revogar a sentença recorrida, ao julgar a acção procedente e ao reconhecer ao Autor o direito à qualidade de titular das prestações por morte da beneficiária BB, a atribuir e a prestar pela Segurança Social.

  12. - Ora, face a tal conclusão obtida pelo Tribunal “a quo” e que acabámos de transcrever, salvo douto e melhor entendimento em contrário, não se compreende o decidido dando a acção como procedente e reconhecendo o direito ao Autor.

  13. - Efectivamente, como é fácil de constatar, no caso sub judice não foi alegado e consequentemente não foi provado, factos integradores desta causa de pedir complexa, que é o reconhecimento da qualidade de titular de prestações de Segurança Social.

  14. - É o que se verifica, nomeadamente, no que concerne à prova da impossibilidade dos familiares constantes das alíneas b), c) e d) do artº 2009º do C. Civil lhe poderem prestar alimentos, bem como a prova da carência ou necessidade de alimentos do Autor e da inexistência ou insuficiência de bens na herança da “de cujus” para lhe poderem suprir as carências alimentícias.

  15. - Ora, com o devido respeito, não concordamos com a conclusão obtida pelo douto Tribunal “a quo”, na qual se prescindiu de factos que no nosso modesto entendimento, são imprescindíveis para a boa decisão da causa.

  16. - Pelo que nos permitimos citar alguns Acórdãos que seguem este nosso entendimento – Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto (adiante designada por Trib da Rel. Porto) de 01.02.2011 (proferido no Proc. nº 11807/08.8TBVNG.P1, 2ª Secção – Apelação 1ª) de 15.03.2011 (proferido no Proc.nº 10027/09.1TBMAI.P1, 2ª Secção - Apelação 1ª), Acórdão do Tribunal da Relação de...

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