Acórdão nº 634/98 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Novembro de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Messias Bento
Data da Resolução04 de Novembro de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 634/98

Processo n.º 816/97

Conselheiro Messias Bento

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório:

1. A. R. propôs, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, acção contra a EDP-ELECTRICIDADE DE PORTUGAL, SA, pedindo o pagamento integral das quantias provenientes do complemento da pensão de reforma, que ela lhe devia nos termos do Estatuto Unificado do Pessoal.

Na contestação, a Ré invocou a nulidade das disposições constantes do Título I do referido Estatuto Unificado do Pessoal, por violação do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro.

O Juiz, por sentença de 29 de Agosto de 1997, recusou aplicação à referida alínea e) do n.º 1 do artigo 6º do

Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro, e, bem assim, à alínea e) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 887/76, de 29 de Dezembro.

2. É desta sentença (de 29 de Agosto de 1997) que vem o presente recurso, interposto pelo Ministério Público ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da constitucionalidade das normas constantes das mencionadas alínea e) do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro, e alínea e) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 887/76, de 29 de Dezembro.

Neste Tribunal, apenas alegou o Procurador-Geral Adjunto aqui em exercício, tendo formulado as seguintes conclusões:

  1. A norma constante da alínea e) do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 519-C1 - bem como a que constava precedentemente do artigo 4º, n.º 1, alínea e), do Decreto-Lei n.º 887/76 - é inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 56º, nºs 3 e 4, 17º e 18º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

  2. Ainda que assim, porventura, se não entenda - por se considerar que tal norma apenas delimitou negativamente o âmbito "natural" do direito à negociação colectiva, não revestindo natureza restritiva ou limitativa de tal direito fundamental dos trabalhadores - sempre padeceria de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da confiança, a sua interpretação que se traduzisse em facultar às entidades patronais que se obrigaram, em estipulação acessória introduzida numa convenção colectiva, à realização de certos benefícios complementares de previdência no confronto dos seus trabalhadores, a possibilidade de se desvincularem unilateralmente de tal compromisso, de natureza obrigacional e não conexionado com os efeitos das convenções colectivas de trabalho.

  3. Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.

3. Corridos os vistos, cumpre decidir.

II. Fundamentos:

4. A norma sub iudicio:

4.1. O contrato de trabalho - ou seja, o contrato pelo qual "uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta" (cf. artigo 1º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de Novembro de 1969) - está sujeito, não apenas às "normas legais de regulamentação do trabalho", como também às convenções colectivas de trabalho (cf. o artigo 12º do mesmo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho).

Existe, assim, no tocante à regulamentação do contrato individual de trabalho, um domínio aberto à negociação colectiva - é dizer à autonomia da vontade.

É, de resto, a Constituição que, no n.º 3 do artigo 56º, prescreve que "compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei", acrescentando, no n.º 4 do mesmo artigo, que "a lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas".

Pois bem: o Decreto-Lei n.º 164-A/76, de 28 de Fevereiro, era a lei que continha a regulamentação das relações colectivas de trabalho.

O Decreto-Lei n.º 887/76, de 29 de Dezembro - cujo artigo 4º, n.º 1, alínea e), aqui está sub iudicio - veio dar nova redacção a vários artigos daquele diploma legal. Entre os preceitos alterados, conta-se, justamente, o artigo 4º, que tratava - e continuou a tratar - dos limites dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.

Assinalou-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 887/76 que "o regime contido no Decreto-Lei n.º 164-A/76, de 28 de Fevereiro, apareceu claramente orientado pelo propósito de assegurar o máximo de garantia à livre expressão da vontade negocial dos sujeitos colectivos". E acrescentou-se que, com as alterações introduzidas, se pretendiam "criar condições indispensáveis à eficácia e ao equilíbrio dos processos de contratação colectiva" e...

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