Acórdão nº 264/98 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Março de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Alves Correia
Data da Resolução05 de Março de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 264/98

Procº nº 636/95

Rel. Cons. Alves Correia

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório.

  1. Por Acórdão do Tribunal Colectivo da Comarca da Figueira da Foz de 14 de Maio de 1990, foi J. condenado a uma pena única de 20 anos de prisão, dos quais lhe foram perdoados 30 meses, por um crime de homicídio, um crime de furto qualificado, dois crimes de introdução em casa alheia e um crime de evasão, na forma tentada.

  2. Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, com fundamento, inter alia, na inconstitucionalidade da norma do artigo 665º do Código de Processo Penal de 1929, com a sobreposição interpretativa do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1934, foi-lhe negado provimento, por Acórdão de 16 de Agosto de 1990.

  3. Por Acórdão de 21 de Novembro de 1990, o Supremo Tribunal de Justiça confirmou a antecedente decisão, que lhe fora trazida, em recurso, pelo arguido.

  4. Inconformado, interpôs este novo recurso para o Tribunal Constitucional, invocando a inconstitucionalidade da norma do artigo 665º do Código Penal de 1929, com a sobreposição interpretativa do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1934, na medida em que limita os poderes das Relações, na apreciação da matéria de facto, nos recursos para si interpostos das decisões do tribunal colectivo. Pelo Acordão nº 335/91 ,foi então feita aplicação da jurisprudência firmada pelo Acórdão nº 340/90 (publicado no Diário da República, II Série, de 19 de Março de 1991), que julgou inconstitucional a norma impugnada, na interpretação constante do assento referido.

  5. Remetido o processo ao Supremo Tribunal de Justiça, para este reformar a sua anterior decisão em conformidade com o juízo formulado sobre a questão de constitucionalidade, veio este, por Acórdão de 22 de Janeiro de 1992, a considerar que, embora a decisão do Tribunal Constitucional não julgasse inconstitucional a norma do artigo 665º do Código de Processo Penal de 1929 sem a sobreposição interpretativa do referido assento, também esta seria, por idênticas razões, inconstitucional. Assim, propôs-se criar uma norma adequada ao preenchimento da lacuna resultante da inaplicabilidade - com fundamento em vício de inconstitucionalidade - do referido artigo, estabelecendo a seguinte norma:

    "Artº 665º: (Poderes da Relação)

    1- As Relações conhecerão de facto e de direito nas causas que julgam em primeira instância, nos recursos interpostos das decisões proferidas pelos juízes de 1ª instância, das decisões finais dos tribunais colectivos e das proferidas nos processos em que intervenha o júri, baseando-se para isso, nos dois últimos casos, nos documentos, respostas aos quesitos e ou quaisquer outros elementos constantes dos autos, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum.

    2- As Relações podem anular as decisões do tribunal colectivo, mesmo oficiosamente, quando reputem insuficientes, obscuras ou contraditórias as respostas aos quesitos formulados ou quando considerem indispensável a formulação de outras questões, ou quando haja nova matéria de apreciação da prova.

    3- As Relações podem determinar oficiosamente a renovação da prova para evitar a anulação da decisão do tribunal colectivo.

    4- A decisão que determinar a renovação da prova é definitiva e fixa os termos e a extensão com que a prova produzida em primeira instância pode ser renovada.

    5- Havendo lugar à renovação da prova, intervêm na audiência os juízes do processo, sobre a presidência do relator, observando-se na parte aplicável o disposto nos artºs. 423º e 430º do C.P.P. de 1987".

  6. Dessa decisão, na parte em que recusou a aplicação da norma do artigo 665º do Código de Processo Penal de 1929 (na redacção do Decreto com força de lei nº 20147, de 1 de Agosto de 1931), foi interposto recurso (obrigatório) por parte do Ministério Público para o Tribunal Constitucional, que, no seu Acórdão nº 430/94, lhe negou provimento, seguindo a jurispru- dência estabelecida pelo Acórdão nº 190/94 (publicado no Diário da República, II Série, de 12 de Dezembro de 1995), mas com quatro votos de vencido.

  7. Tendo feito vencimento a tese de que, mesmo sem a sobreposição interpretativa do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1934, o artigo 665º do Código de Processo Penal de 1929 era inconstitucional, como decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, foi o processo remetido por este ao Tribunal da Relação de Coimbra, para a aplicação a ter lugar aí da norma criada pelo Supremo Tribunal de Justiça (transcrita no ponto 5), legislando "dentro do espírito do sistema", como previsto no nº 3 do artigo 10º do Código Civil.

  8. Por Acórdão de 27 de Novembro de 1994, o Tribunal da Relação de Coimbra procedeu à reforma da decisão condenatória, com base na citada norma.

    Aquele aresto, "considerando os documentos, as respostas aos quesitos, que não enfermam de obscuridade, suficiência ou contradição, e os demais elementos constantes do processo, que não implicam erro notório na apreciação da prova, nem preconizam a renovação da mesma", considerou provada a seguinte matéria de facto:

    "No dia 3.4.985, entre as 9.00 horas e as 14h.30m., nos lugares de Seixede e Broeivos, da freguesia de Alhadas, o réu entrou pelas janelas, nas casas de habitação de L. e J., com o intuito de se apoderar de bens e valores, tendo subtraído, na primeira, uma quantidade indeterminada de moedas de colecção, já retiradas da circulação.

    O segundo, J., ao regressar a casa e vendo-a remexida, com a janela aberta, comunicou o facto ao seu sobrinho, de nome J.J.dos S.C., o qual, de motorizada, foi no encalce do réu e, encontrando-o, interpelou-o para devolver o que tinha tirado, tendo aquele negado que tivesse tirado alguma coisa.

    Entretanto, o M. foi avisar o sobrinho, depois da vistoria à casa, de que não tinha dado por falta de nada, mas, quando chegou junto do sobrinho e do réu disse que as sapatilhas usadas por este tinham um formato semelhante às pegadas...

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