Acórdão nº 584/00 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Dezembro de 2000

Magistrado ResponsávelCons. Helena Brito
Data da Resolução20 de Dezembro de 2000
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão nº 584/00

Proc. nº 579/99

  1. Secção

Relatora: Maria Helena Brito

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. No Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra, AS interpôs, em 4 de Janeiro de 1993, recurso contencioso de anulação do despacho do Director do Gabinete Coordenador do Ingresso no Ensino Superior, de 23 de Outubro de 1992, que procedeu à anulação da sua colocação no ensino superior, anteriormente efectuada pelo mesmo serviço no âmbito do respectivo concurso.

    Alegou, em síntese, que

    – a recorrente concorreu oportunamente ao Concurso Nacional de Acesso à Matrícula e Inscrição em Estabelecimentos e Cursos do Ensino Superior Público no ano lectivo de 1992-1993, cujo regulamento foi aprovado pela Portaria nº 707/92, de 9 de Julho, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 354/88, de 12 de Outubro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis nºs 140/89, de 28 de Abril, 33/90, de 24 de Janeiro, 276/90, 10 de Setembro, e 379/91, de 9 de Outubro;

    – em 28 de Setembro de 1992, através da lista para o efeito afixada na Delegação Distrital de Aveiro do Gabinete Coordenador do Ingresso no Ensino Superior, tomou conhecimento da sua situação de "colocada" no curso de Arquitectura da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, tendo efectuado a matrícula no referido curso no dia imediato (29 de Setembro de 1992);

    – em 2 de Novembro seguinte, a recorrente foi notificada, por carta registada com aviso de recepção (datada de 30 de Outubro), do despacho do Director do Gabinete Coordenador do Ingresso no Ensino Superior, de 23 de Outubro, que procedia à anulação da colocação da recorrente no curso de Arquitectura da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (por ter sido detectado um erro "no carregamento da classificação que obteve no pré-requisito para acesso ao curso de arquitectura" – 58% e não 85%, como erradamente foi considerado), pelo que a recorrente passaria à situação de "não colocada" no âmbito da 1ª fase do referido concurso;

    – tal declaração de rectificação apenas poderia ter sido proferida até 2 de Outubro de 1992, prazo limite para as matrículas no ensino superior – 1ª fase, ou, no caso da recorrente, até 29 de Setembro de 1992, data em que exerceu o seu direito;

    – nessas circunstâncias, a recorrente imputou ao despacho impugnado o vício de violação de lei, por desconformidade com o "direito fundamental da recorrente a aprender e ter acesso ao ensino superior (arts. 43º, 74º e 76º da Constituição da República Portuguesa, Segunda Revisão)", por ofensa dos artigos 45º e 47º e anexo IV da Portaria nº 707/92, e o vício de incompetência.

    A autoridade recorrida – à data, o Director do Departamento do Ensino Superior – respondeu, dizendo que não ocorreram as ilegalidades arguidas e que foi observado o regime legal então em vigor, constante da Portaria nº 707/92. À sua resposta juntou, designadamente, documentos comprovativos de que, nos termos do artigo 45º do Regulamento aprovado por essa Portaria, o Secretário de Estado do Ensino Superior autorizou a criação de uma vaga adicional no curso de Arquitectura de Design de Moda da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, de modo a permitir a colocação da candidata AS, no âmbito da 2ª fase do concurso, dado que a sua nota de candidatura para esse curso era superior à do último aluno ali colocado (despacho de fls. 32 e 33 e ofício de fls. 34).

    Tendo a recorrente requerido a suspensão da eficácia do acto impugnado, foi essa suspensão ordenada pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra (em 1 de Fevereiro de 1993, fls. 35 v. a 36 v., do apenso).

  2. Por decisão de 28 de Outubro de 1997 (fls. 110 e seguintes), o Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra negou provimento ao recurso, não anulando o acto impugnado, por entender que o mesmo não padecia dos invocados vícios, argumentando, em síntese que:

    – os direitos fundamentais de aprender e de acesso ao ensino não são incondicionais, pois dependem da observância de certos requisitos a verificar, mediante o concurso a que, no caso presente, se candidatou a interessada;

    – improcede o vício de incompetência assacado ao acto, pois o artigo 45º, nº 2, do regulamento aprovado pela Portaria nº 707/92 expressamente atribui competência à autoridade recorrida;

    – a rectificação efectuada pelo despacho impugnado observou as regras constantes da Portaria nº 707/92, não podendo por isso ser considerada ilegal.

  3. Não se conformando com a decisão, AS interpôs recurso jurisdicional para o Supremo Tribunal Administrativo.

    Nas suas alegações, a recorrente imputou à decisão recorrida a violação da Constituição da República Portuguesa, concluindo do seguinte modo:

    "[...]

    19) A decisão ora em crise viola os pilares do respeito pela segurança das relações jurídico-administrativas, do respeito pelos direitos adquiridos, da manutenção da boa fé das decisões da Administração, do respeito pela boa fé do interessado e, muito particularmente, o direito fundamental da recorrente a aprender e ter acesso ao ensino superior mediante a garantia de igualdade de oportunidades, impondo à recorrente um sacrifício desproporcionado, arbitrário, gratuito e desmotivado dos seus direitos fundamentais, em clara violação dos arts. 13º, 43º, 74º, 76º e 266º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, segunda revisão, e art. 2º do Protocolo nº 1 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, acarretando tal violação da lei fundamental a inexistência jurídica da decisão ora recorrida (ou a sua nulidade, acaso assim se entenda), bem assim, a violação do dispositivo conjugado dos artigos da lei ordinária supra citados e, muito particularmente, os arts. 45º, 47º e Anexo IV do Regulamento anexo à Portaria nº 707/92, de 9 de Julho, que sempre acarretam a anulação da sentença recorrida, que aqui se pede."

    O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 26 de Maio de 1999 (fls. 176 e seguintes), negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida, com os seguintes fundamentos:

    "[...] o preceito [o artigo 45º da Portaria nº 707/92, de 9 de Julho] não alude a qualquer prazo limite para a prolação do referido despacho de rectificação, pelo que, na dúvida, se deve entender que o prazo de que dispõem as autoridades competentes para o produzir está unicamente sujeito à regra geral de revogação dos actos administrativos ilegais, conforme se julgou já neste Tribunal, em caso idêntico [...].

    Aliás, os termos em que a referida norma se apresenta redigida levam a concluir, ao permitir-se expressamente que a rectificação possa ser accionada por iniciativa do candidato, ou por iniciativa de um estabelecimento de ensino superior, da Direcção-Geral do Ensino Superior ou do GCIES, que a decisão rectificativa possa ocorrer em data posterior a 2 de Outubro, atento o número das entidades envolvidas e as tarefas que lhes incumbem no processo de concurso.

    Para além disso, a data limite para a emissão de decisão sobre as reclamações relativas à 1ª fase do concurso é, nos termos do nº 21 do anexo IV ao Regulamento, a de 2 de Novembro, posterior, portanto, à data do despacho em causa, que é de 23 de Outubro.

    Assim, mesmo que, numa tese mais favorável à Recorrente, se entenda que a data dentro da qual é lícito à Administração reparar os erros por ela cometidos na colocação dos candidatos ao ensino superior é aquela que foi fixada para os casos de reclamações apresentadas, não oferece dúvida de que o despacho foi emitido atempadamente.

    Aliás, a rectificação do erro não pode determinar, por força do nº 1 do aludido art. 45, qualquer prejuízo do candidato em termos de colocação, visto que o preceito impõe que este seja colocado no curso e estabelecimento em que teria sido colocado na ausência de erro, mesmo que para esse fim seja necessário criar vaga adicional.

    Por isso, não poderá dizer-se, como sustenta a Recorrente, que ocorra uma flagrante violação dos seus direitos fundamentais por não poder então candidatar-se às 2ª e 3ª fases ou a estabelecimento de ensino particular ou cooperativo.

    É que, efectivamente, a Recorrente não se candidatou a qualquer uma dessas fases ou estabelecimentos de ensino e não pode afirmar que, nestas circunstâncias, não teria sido admitida a sua candidatura, já que a preocupação do legislador nesta matéria é a de não provocar qualquer prejuízo na colocação dos...

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