Acórdão nº 331/02 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Julho de 2002

Data10 Julho 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃ0 Nº 331/02

Proc. nº 352/2001

  1. Secção

    Rel.: Consª Maria Fernanda Palma

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

    I

    Relatório

    1. A.. interpôs recurso contencioso da deliberação do Conselho Superior da Magistratura de 2 de Março de 1998 que o graduou em ...º lugar no 7º concurso curricular de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.

    O recurso foi admitido, por acórdão de 3 de Dezembro de 1998, do qual foi interposto, pelo Ministério Público, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Porém, o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 503/99, decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso, uma vez que o juízo de inconstitucionalidade formulado no acórdão então recorrido (acórdão que admitiu o recurso da deliberação do Conselho Superior da Magistratura) constituiu um mero obiter dictum.

    Nas alegações do recurso interposto da deliberação do Conselho Superior da Magistratura apresentadas pelo recorrente foi concluído o seguinte:

  2. Neste meio processual o STJ decide em primeira instância e conhece de matéria de facto (vide nºs 1 a 5 desta peça).

  3. Se interpretadas no sentido de excluir dos poderes de cognição do STJ (neste recurso) a matéria de facto, sob a forma quer de erro quer de omissão nos pressupostos, as normas de lei ordinária citadas nos nºs 3 e 4 desta peça - ou porventura outras - seriam materialmente inconstitucionais por violação quer dos preceitos da CRP97 citados no n° 5 desta peça quer do princípio da igualdade consagrado nos artigos 13° e 266°, n° 2, da CRP97 (vide n° 6 desta peça).

  4. Considera-se provada a matéria de facto exposta nos parágrafos 7.1 a 7.41 do n° 7 desta peça processual.

  5. As posições absolutas e relativas dos concorrentes (na graduação feita pelo CSM) não podem ser alteradas senão na medida em que tal decorra de o CSM ter de atribuir ao ora recorrente um determinado lugar superior na graduação por força da procedência deste recurso contencioso de anulação, ou seja, na medida em que verão o ora recorrente subir na graduação e alguns descerão, por isso, um lugar (vide n° 8 desta peça).

  6. Esta solução é postulada pelo princípio procedimental e constitucional da proporcionalidade e pelo princípio do caso resolvido (por falta de oportuno recurso contencioso) - vide n° 9 desta peça.

  7. No seu intróito a deliberação sob recurso anunciou que tomava em conta a graduação (classificação e ordenação) obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso para cargos judiciários, os antecedentes disciplinares e o currículo universitário de cada concorrente, como - segundo ela aí correctamente afirmou - determina o artigo 52°, n° 1, alíneas b), c) e f) do EMJ85 (vide nºs 10, 12 e 15 desta peça).

  8. Ao abrigo desta norma e da auto-vinculação assim firmada no seu intróito, a deliberação sob recurso salientou, no respectivo texto apreciativo, uma sanção disciplinar sofrida pelo concorrente graduado em 36° lugar (vide n° 13 desta peça).

  9. Não tendo ponderado - como impõem a referida norma e a auto-vinculação assim firmada nesse intróito - os factos expostos nos nºs 7.5 a 7.8, 7.11 e 7.15, a deliberação sob recurso incorreu no correspondente vício de violação de lei (vide nºs 11, 14 e 16 desta peça).

  10. No seu intróito a deliberação sob recurso anunciou que tomava em conta outros factores que abonem a idoneidade dos requerentes para o cargo a prover, nomeadamente as qualidades individuais, a preparação técnica e cultura jurídica, o cuidado posto na investigação da matéria e respectivo enquadramento jurídico, a independência e o bom senso, o apego e dedicação à função e o respeito pelos prazos, o aprumo profissional e moral e bem assim a respectiva imagem na sociedade em que cada um se insere, como - segundo ela aí correctamente afirmou - determina o artigo 52°, n° 1, alínea f), do EMJ85 (vide n° 17 desta peça).

  11. Ao abrigo desta norma e da auto-vinculação assim firmada no seu intróito, a deliberação sob recurso salientou, no respectivo primeiro parágrafo apreciativo (vide nºs 7.3 e 18 a 21 desta peça):

    o Em relação aos concorrentes graduados nos 1°, 2°, 9° a 17°, 19°, 31° a 33°, 34°, 35° e 3° lugares, desde quando eram, respectivamente, juízes auxiliares no STJ, juízes interinos no STJ (os 34° e 35°) ou juiz conselheiro no Tribunal Constitucional (o 3°) - vide n° 18 desta peça;

    o Em relação aos concorrentes graduados nos 24°, 25°, 28°, 30º, 43°, 45°, 47° e 48° lugares, serem ou terem sido presidentes ou vice-presidentes de relação, ou inspectores judiciais (vide n° 19 desta peça);

    o Em relação aos concorrentes graduados nos 1° ao 16°, 18° ao 25°, 30°, 43° e 47° lugares, o facto de eles terem (muito, elevado, grande) prestígio profissional e/ou pessoal (vide n° 20 desta peça);

    o Em relação aos concorrentes graduados nos 1° ao 8° lugares, terem ampla capacidade de trabalho e, em relação ao concorrente graduado no 17° lugar, ter uma grande dedicação ao exercício das funções que desempenha e ser trabalhador incansável e eficiente (vide n° 21 desta peça).

  12. A deliberação sub judice incorreu no correspondente vício de violação de lei ao não ponderar os factos expostos nos nºs 7.19 a 7.24 e 7.33 a 7.36 desta peça, como impõem o artigo 52°, n° 1, alínea f), do EMJ85, a referida autovinculação e os princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade consagrados nos artigos 266°, n° 2, da CRP97, e 5°, n° 1, e 6° do CPA91 (vide n° 22 desta peça).

  13. Se tivesse ponderado, como devia, os factos descritos nos nºs 7.19 a 7.24 e 7.33 a 7.36 desta peça, a deliberação sob recurso teria necessariamente de reconhecer ao ora recorrente um muito elevado prestígio profissional e pessoal e uma grande capacidade de trabalho (em potência e em acto) - vide nºs 23 e 24 desta peça.

  14. É claro o propósito da deliberação sob recurso de agrupar os concorrentes (nos cinco subconjuntos que decidiu formar) de acordo com a adjectivação que escolheu para os trabalhos por eles apresentados, com desprezo dos outros factores (à excepção do da antiguidade, que serviu para graduar os concorrentes dentro de cada subconjunto) que o n° 1 do artigo 52° do EMJ85 manda tomar em conta: entram no 1° os concorrentes cujos trabalhos se consideram de excepcional qualidade; no 2° aqueles cujos trabalhos se consideram de nível muito elevado; no 3° aqueles cujos trabalhos se consideram de nível bastante bom; no 4° aqueles cujos trabalhos se consideram de nível bom; e no 5° os que não apresentaram trabalhos (vide nºs 25 e 26 desta peça).

  15. Ao adoptar e aplicar este critério, a deliberação sob recurso infringiu o n° 1 do artigo 52° do EMJ85 (vício de violação de lei) - vide n° 27 desta peça.

  16. Por força dos artigos 268°, n° 3, da CRP97 (de aplicação directa) e 124° e 125° do CPA91, um acto administrativo que afecte interesses legalmente protegidos deve ter fundamentação expressa, capaz de esclarecer concretamente a motivação do acto (vide nºs 28 a 31 desta peça).

  17. Por isso a genérica invocação do processo individual e do currículo de cada candidato feita no parágrafo transcrito no n° 7.2 desta peça não pode valer como (parcela de) fundamentação do acto (mesmo que esses processos individuais fizessem - e não fizeram - parte dos elementos agregados ao processo administrativo de graduação) - vide n° 32 desta peça.

  18. Na verdade, essa invocação de um processo em bloco (que presumivelmente contém dezenas de documentos com diversos dados - de identificação, de situação perante a Administração e a segurança social, atestados de doença, faltas ao serviço, etc.) não esclarece concretamente a motivação do acto (vide nºs 33 a 35 desta peça).

  19. Estas considerações valem, para a referida invocação genérica do currículo, por paridade ou até maioria de razão, pois aqui nem sequer se sabe qual o suporte material ou documental dos respectivos dados (vide n° 36 desta peça).

  20. Por isso também é mera redundância a alusão, nesse parágrafo, aos trabalhos de cada concorrente, pois já deles se havia feito menção no parágrafo anterior como elemento(s) a ter em consideração (vide nº 37 desta peça).

  21. Assim, a fundamentação (da deliberação sob recurso) em matéria de facto reduz-se ao primeiro parágrafo apreciativo (cf. n° 7.3) - vide nºs 38 e 39 desta peça).

  22. A graduação de juízes para acesso ao STJ implica um juízo sobre se A é melhor juiz que B. Para isso pode a Administração usar dados já assentes por acto administrativo anterior (grau académico, classificação de serviço ou de outro concurso, sanção disciplinar), caso em que não há que demonstrar de novo o iter percorrido para se chegar a essa conclusão. Diferente é a perspectiva se está a apreciar-se em primeira mão uma conduta (actividade) do candidato para a qualificar, a fim de utilizar esse resultado ao lado daqueles outros, como acontece quando na graduação se tem de atender a provas escritas realizadas ou a trabalhos escritos apresentados pelos candidatos para o efeito: nesta hipótese não valerá como fundamentação a simples afirmação de que esta prova é melhor que aquela ou que este trabalho é excelente, estoutro é bom e aquele apenas suficiente (vide nºs 40 a 45 desta peça).

  23. Nem há que invocar a indevidamente chamada discricionariedade técnica. Na verdade, além de ser ilícito e aberrante presumir que os Conselheiros do STJ estejam menos habilitados com os conhecimentos das leges artis para apreciar a qualidade de um aresto judicial do que os membros do CSM, tal expediente assentaria numa violação directa da 2ª parte do n° 3 do artigo 268° da CRP97 e numa interpretação das pertinentes normas da lei ordinária (artigos 124° e 125° do CPA91) que as tomaria inconstitucionais (vide n° 46 e 47 desta peça).

  24. Não valem, pois, como fundamentação as afirmações da deliberação sub judice reproduzidas no precedente n° 7.3.10, conquanto isto não signifique não estar ela suficientemente fundamentada, pois outros factores nela se invocam, aproveitáveis como motivação: nota de licenciatura, classificação no concurso para juiz...

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