Acórdão nº 3/15.0YFLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução27 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.

AA, Juíza ..., a exercer funções no Tribunal ..., concorrente necessária ao XIV concurso curricular de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, notificada da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 04.11.2014 – publicada, por extracto, no Diário da República, 2.ª Série, de 10.11.2014 –, que procedeu à graduação dos concorrentes e que a graduou em 25.º lugar entre os concorrentes necessários, dela veio interpor recurso, nos termos dos artigos 168.º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

Terminou com estas conclusões: A. O júri procedeu à graduação dos concorrentes necessários nas reuniões de 25 de Junho, 14 de Julho e 22 de Julho de 2014, tendo, nesta última reunião, finalizado a graduação dos concorrentes necessários. Na acta respectiva consta que tal reunião teve como único ponto da ordem de trabalhos o seguinte: “finalizar a graduação dos concorrentes necessários”. E ainda, quanto ao que terá sido o trabalho da reunião, o seguinte: “o júri finalizou a graduação dos concorrentes necessários”.

Quer isto dizer, na aparência das coisas, tal como um homem comum lê o texto da acta, que, nessa sessão, o júri deu por finalizada a graduação dos concorrentes necessários, o que forçosamente terá implicado que – através da atribuição de uma pontuação a cada um deles – os candidatos tenham sido ordenados de acordo com a classificação que lhes foi conferida.

B. Porém, na reunião de 20 de Outubro, o júri terá procedido à “revisão geral do projecto de parecer do júri”, o que terá acontecido quanto a todos “os candidatos que se apresentaram ao XIV Concurso Curricular de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça”, aí se incluindo, pois, os concorrentes necessários, cuja graduação já fora finalizada na reunião de 22 de Julho.

C. Isto significa – como um homem comum retira da leitura das actas – que o júri, depois de ter finalizado a graduação dos concorrentes necessários, procedeu a uma revisão da graduação que tinha efectuado.

D. Ora, assim sendo, é absolutamente indispensável conhecer a graduação que foi finalizada na sessão de 22 de Julho, antes de revista a 20 de Outubro. Acontece que essa graduação não consta da acta da reunião de 22 de Julho de 2014, nem de qualquer anexo à mesma, nem do processo concursal que a Recorrente examinou nas instalações do CSM, após ter pedido acesso ao mesmo, o que lhe foi facultado.

E. Tal omissão gera, desde logo, um vício de forma que consiste na omissão de uma formalidade obrigatória, consubstanciada na circunstância da acta da reunião de 22 de Julho (acta n.º 12) não conter, em violação do disposto no art. 27.º, n.º 1 do C.P.A., a deliberação adoptada quanto à finalização da graduação dos concorrentes necessários, nem essa deliberação constar, a qualquer outro título, do processo concursal, que a Recorrente consultou.

F. Se aconteceu a finalização da graduação dos concorrentes necessários, terá obrigatoriamente de ter havido uma deliberação sobre essa graduação, a qual não se conhece. Se houve finalização da graduação, isto só pode querer dizer que o júri completou a graduação dos concorrentes necessários, ordenando-os de acordo com a pontuação que então lhes foi atribuída, o que significa que, expressa ou tacitamente, aprovou, e por isso deliberou, sobre essa graduação finalizada.

G. Mas tal omissão não gera apenas um vício de forma.

Ela própria consubstancia a violação do princípio da imparcialidade, consagrado no art. 266.º da CRP e no art. 6.º do C.P.A..

H. É que a omissão da formalidade em apreço, por um lado, põe em crise a confiança dos interessados na Administração, a quem é escamoteado um elemento fundamental para compreender a alteração de uma graduação concursal que já estava efectuada, por outro lado, impede uma correcta e adequada ponderação dos interesses co-envolvidos no procedimento, obviando designadamente que o CSM tenha podido ponderar de forma exaustiva os interesses atingidos pela sua deliberação (bem como os interessados no concurso).

I. Os vícios supra identificados geram a anulabilidade dos actos recorridos.

J. Por cautela, vem arguir-se a inconstitucionalidade do eventual entendimento normativo que venha a ser adoptado quanto ao art. 27.º, n.º 1 do C.P.A., devidamente conjugado com o art. 52.º do E.M.J., no sentido de que a acta de uma reunião do júri de um concurso de avaliação curricular para acesso ao STJ, onde se procedeu à finalização da graduação dos concorrentes necessários, não tenha obrigatoriamente de incluir os termos em que essa finalização teve lugar, por violação do direito a um processo equitativo, tal como previsto no art. 20.º, n.º 4 da C.R.P., bem como do princípio da imparcialidade, tal como previsto no art. 266.º, n.º 2 da C.R.P..

--x-- K. O Senhor Juiz Conselheiro ..., Vice-Presidente do CSM e membro do júri do concurso em pauta, requereu, a 27 de Novembro de 2013, ao abrigo do art. 48.º, n.º 1, d) do C.P.A., que lhe fosse concedida escusa, e consequente dispensa de intervenção, na qualidade de relator dos processos referentes aos Senhores Juízes Desembargadores BB e CC, atendendo à profunda amizade e intimidade no convívio com esses dois concorrentes, dispensa essa que lhe foi deferida, por despacho de 03/12/2013 do Senhor Presidente do CSM.

L. Tal circunstância só foi do conhecimento da Recorrente após a deliberação do CSM ora impugnada.

M. Não se põe obviamente em causa a honorabilidade nem do Senhor Juiz Conselheiro, nem dos Senhores Juízes Desembargadores acima referidos, todos distintíssimos magistrados, que a Recorrente muito respeita.

N. Porém, se o Senhor Juiz Conselheiro ... se considerou impedido de ser o relator dos pareceres preliminares relativos a tais concorrentes, não se compreende que a situação invocada não fosse ela própria também motivo de impedimento para elaborar o parecer final do júri e o votar.

O. Ora, como consta da acta do CSM de 28 de Outubro de 2014, não só o Senhor Vice-Presidente do CSM foi o autor do parecer final do júri, como o votou, tal como os restantes membros do júri. Idem, para as deliberações do CSM de 28 de Outubro e de 4 de Novembro, ora objecto de impugnação.

P. Não se pode estar impedido de ser o relator do parecer preliminar relativo a alguns dos candidatos e não se estar impedido de ser o relator do parecer final do júri, que gradua esses mesmos candidatos (um dos quais foi graduado em 2º lugar e outro em 13º lugar), ademais votando-o.

Q. Tendo o Senhor Juiz Conselheiro Vice-Presidente do CSM participado em tais actos, quando se encontrava impedido de o fazer, pelos motivos por ele próprio invocados nos termos já referidos, mostra-se violado o princípio da imparcialidade, na sua vertente negativa, razão pela qual as deliberações recorridas são anuláveis, nos termos dos arts. 48.º, n.º 1, d) e 51.º, n.º 1 do C.P.A..

R. Por cautela, vem arguir-se a inconstitucionalidade do art. 48º, n.º 1, d) do C.P.A., devidamente conjugado com o art. 52.º do E.M.J., caso eventualmente venha a ser adoptado o entendimento normativo no sentido de que, num concurso de acesso ao STJ, a situação de grande intimidade entre um titular do júri e do CSM e de pessoas com interesse directo no procedimento, tendo sido julgada como causa de impedimento da sua participação na qualidade de relator do parecer preliminar de candidatos, não o seja quanto à sua participação na qualidade de relator do parecer final, bem como quanto à sua participação na votação do parecer do júri e na subsequente deliberação do CSM, por violação do princípio da imparcialidade, tal como se encontra previsto no art. 266.º, n.º 2 da C.R.P..

--x-- S. Quanto ao critério relativo às “anteriores classificações de serviço”, o aviso do concurso previa uma ponderação entre 50 e 70 pontos.

Nos concursos anteriores ao XIII Concurso Curricular, em regra, tal ponderação foi efectuada tendo em conta a última ou as duas últimas classificações de serviço.

No XIII Concurso Curricular – o primeiro que se realizou após a alteração introduzida ao regime do concurso por força da Lei n.º 26/2008, de 27 de Junho, que alterou regras fundamentais até então vigentes, designadamente quanto à composição do júri –, foi deliberado pelo CSM – como consta da acta da sessão de 18 de Outubro de 2011 (Acta n.º 22/2011) – adoptar, como critério, só considerar uma (a última) classificação de serviço: “Foi considerado, relativamente aos concorrentes necessários e voluntários, que a obtenção das notações de serviço, independentemente do número das mesmas, deveria ser pontuada de molde a corresponder a 65 pontos a nota de Bom com distinção e 70 pontos a nota de Muito Bom.”.

T. O principal argumento, a favor da consideração apenas da última classificação de serviço, decorre da circunstância de, por força do estatuído no art. 37.º do E.M.J., as classificações de serviço deverem sempre considerar o resultado das inspecções anteriores, as quais também se reflectem na última notação obtida, assim se respeitando o comando do art. 52.º, n.º 1, a) do E.M.J..

U. Todavia, neste concurso, o júri deliberou – e, sobre essa matéria, houve também uma deliberação, por maioria, do CSM – que se deviam considerar as três últimas classificações de serviço.

Mas só deliberou nesse sentido aquando da aprovação do parecer final que submeteu ao CSM, já que nas actas das suas reuniões não consta qualquer referência – pelo menos a Recorrente, que as consultou, disso não tem qualquer memória – a tal critério.

V. A Recorrente – cuja última classificação de serviço fora de “muito bom”, tendo a penúltima sido de “bom com distinção” – foi gravemente prejudicada por este novo critério adoptado neste concurso – ficando a 10 pontos de vários outros concorrentes –, o qual diverge do que vinha sendo prática nos anteriores concursos, com o que contavam todos os candidatos.

W. Pelo exposto, a adopção do critério que levou à ponderação de 3 classificações de serviço em vez da última (ou mesmo 2 classificações de serviço, o que...

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