Acórdão nº 557/03 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Novembro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução12 de Novembro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 557/03 Proc. n.º 235.03 3ª Secção Relator: Cons. Gil Galvão

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I ? Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que figuram como recorrente o Ministério Público e como recorrido A., foi declarada a utilidade pública da expropriação, com vista à construção da Escola Secundária n.º ---- de B., de uma parcela de terreno, integrada na Reserva Agrícola Nacional, pertencente ao ora recorrido. Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 5 de Dezembro de 2002, foi recusada a aplicação do artigo 24º, n.º 5, do Código das Expropriações, por inconstitucional, tendo a parcela expropriada sido classificada e avaliada como ?solo apto para a construção? e não como ?solo para outros fins?. A decisão assentou, na parte ora relevante, na seguinte fundamentação:

?[...] De todo o modo, tratando-se de terreno integrado na RAN, a consideração de que se trata de solo apto para construção nos termos do art. 24º/1-a) do CE 91, resulta não de confinar com arruamentos ? o requisito bastante do acesso rodoviário determinado pelo nº 2-a) do preceito citado (Osvaldo Gomes, Expropriações por Utilidade Pública, 187; ac.s desta Relação de 20.11.97 e 4.5.98, CJ XXII, 5, 98 e XXIII, 3, 179, respectivamente) - mas de nele ter sido construída uma escola, para o que foi desafectado daquele destino agrícola. Em princípio, os terrenos integrados na RAN estão fora do comércio dos solos para construção, da especulação fundiária. Alude-se ao princípio da vinculação situacional da propriedade do solo, ligado à concreta situação e características intrínsecas de determinados terrenos, que está na origem da sua integração na RAN e na REN - Alves Correia, Plano Urbanístico e Princípio de Igualdade, 517.

A inclusão de um terreno na RAN ou na REN não exclui, definitivamente a potencialidade edificativa, quer porque a lei prevê excepções ao regime proibitivo da construção, quer porque a própria Administração pode alterar as delimitações daquelas reservas, com a consequente expansão do direito de propriedade - Osvaldo Gomes, obra citada, 243, ac.s desta Relação de 12.12.89 e 7.2.91, CJ XIV, 5,205 e XVI, 1, 246, respectivamente.

Aliás, foi, precisamente o que aconteceu, em ordem a poder construir-se a escola.

De qualquer forma, como refere o recorrente e se diz na sentença apelada, a mera exclusão de determinado terreno da RAN para nele se construir, não permite que a sua valorização seja feita escamoteando essa realidade, por isso violar os princípios da justiça e da proporcionalidade, sendo, consequentemente, inconstitucional a interpretação restritiva do art. 24.º/5 do CE 91, no sentido de excluir da definição de solos aptos para construção os incluídos na RAN, mas expropriados, precisamente, para construção.

[...].?

2. O Ministério Público, ?nos termos dos artigos 280º n.º 1, alíneas a) e n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, 70º n.º 1, alínea a) e 72º n.ºs 1, alíneas a) e 3 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro?, interpôs recurso obrigatório desta decisão, através de um requerimento com o seguinte teor:

?[...] I. Com efeito, o acórdão recorrido recusou aplicar a norma do artigo 24 n.º 5 do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei 438/91 de 9.11, com o fundamento que tal norma é inconstitucional, quando interpretada de forma a excluir da classificação de "solo apto para construção" os solos integrados na RAN expropriados com a finalidade de neles edificar para fins diferentes da utilidade publica agrícola.

O acórdão recorrido (implicitamente) considera que aplicar aquele regime se traduziria numa violação dos princípios consagrados nos artigos 13°, 62 n.º 2 e 266 n.º 2 da Constituição (princípios da igualdade, da justa indemnização em caso de expropriação e do dever da Administração de respeitar os princípios da igualdade da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé. [...]?

3. Notificadas as partes para alegarem, concluiu o Ministério Público da seguinte forma as suas alegações:

?Nestes termos e pelo exposto conclui-se:

  1. - É inconstitucional a norma constante do artigo 24°, n° 5, do Código de Expropriações de 1991, quando interpretada em termos de excluir tabelarmente da classificação de "solo apto para construção" os solos integrados na RAN e dela desanexados e expropriados, com a finalidade de neles se edificar uma infra-estrutura urbana (construção de escola secundária), diferente da utilidade pública agrícola, revelando a natureza de tal edificação e a matéria de facto e conclusões das instâncias a existência de uma ?muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa?.

  2. - Na verdade, neste específico circunstancialismo, ocorre uma estreita analogia com a situação versada no Acórdão n° 267/97 , cuja orientação se deverá, consequentemente, seguir.

  3. Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado pela decisão recorrida.?

4. O recorrido, por seu turno, concluiu assim as suas contra-alegações:

?CONCLUSÕES:

I - O presente recurso tem por objecto a fiscalização concreta da constitucionalidade da norma do art.º. 24°., nº.5, do Código das Expropriações, consagrada no Decreto- Lei 438/91 , de 9/11.

II - Atentos os princípios fundamentais, constitucionalmente consagrados nos art.ºs. 13°. e 18° da CRP, da igualdade e proporcionalidade, impõe-se, tal como decidiram as instâncias e este Tribunal no acórdão 267/97 , seja declarada a inconstitucionalidade em concreto da norma do n.º 5 do art.º. 24°. do Código das Expropriações de 1991, enquanto interpretada por forma a excluir da classificação como ?solo apto para construção" os solos integrados na RAN expropriados justamente com a finalidade de neles se edificar para fim diferente da utilidade pública agrícola, designadamente para neles se edificar construção urbana - escola secundária - da qual resulta desde logo, pelas suas características, reconhecida a aptidão e potencialidade edificativa do solo.

III - A restrição do direito real e a transmissão da propriedade ao domínio público conferem o direito ao pagamento de justa indemnização, sendo que a mesma deve respeitar os princípios materiais da igualdade e proporcionalidade.

IV - A correcta proporção entre a privação da propriedade e a indemnização é obtida pela correspondência que entre esta e o valor real e corrente no mercado do bem expropriado.

V - É preponderante na avaliação do valor real do bem expropriado a classificação do solo atento o seu fim, sendo facto público e notório que o solo apto para construção atinge valores consideravelmente superiores ao solo apto para outros fins, nomeadamente agrícolas.

VI - De entre a área expropriada ao Recorrido, parte da mesma (l5.1l3m2) - cujo fim se destinou a implantação da escola Secundária de B., encontrava-se classificada no PDM como área RAN.

VII- Considerando a previsão da norma do nº.5 do artº. 24°. do Cód. das Expropriações dir-se-ia que aquela parcela não poderia ser classificada, para efeitos de determinação do valor da indemnização, como solo apto para construção, uma vez que, por imposição legal, não poderia ser afectada a construção.

VIII - Porém, previamente à declaração de utilidade pública da expropriação, a referida parcela foi desafectada da reserva agrícola, passando a possuir aptidão para edificações urbanas, nomeadamente para construção da Escola Secundária nela já implantada.

IX - Nenhum regulamento ou disposição legal impedia, pois, naquela data que a parcela de terreno em causa fosse utilizada para construção, pelo que não poderia deixar a mesma de classificar-se como solo apto para construção.

X ? A aplicação ao caso concreto da previsão da norma do n.º 5 do art.º. 24º. Do Código das Expropriações, determinaria manifesta desproporção entre o benefício da comunidade pela expropriação do solo e os sacrifícios impostos ao expropriado com a sua privação.

XI ? Neste sentido, conclui este Tribunal ser ?inconstitucional a norma do n.º 5 do artigo 24º do Código das...

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