Acórdão nº 505/03 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Helena Brito
Data da Resolução28 de Outubro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 505/03 Proc. n.º 327/03 1ª Secção

Relatora: Maria Helena Brito

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. Por acórdão de fls. 2372 e seguintes, o Tribunal Colectivo da Comarca do Fundão decidiu condenar o arguido A. como autor material de um crime de falsificação de documentos, previsto e punível pelo artigo 256º, n.º s 1, alínea a), e 3, do Código Penal, na pena de três anos de prisão.

  2. Deste acórdão recorreu A. para o Supremo Tribunal de Justiça (fls. 2410), tendo na motivação respectiva (fls. 2410 e seguintes) concluído do seguinte modo:

    ?1- Os factos dos autos ocorreram há mais de 6 anos, não havendo notícia de o recorrente ter cometido qualquer ilícito após.

    2- A lei prevê para o crime cometido pena alternativa de multa ou prisão, isto é pena de prisão de 6 meses a 5 anos ou pena de multa de 60 a 600 dias.

    3- A mesma lei determina que a primeira tem aplicação preferencial, desde que esta realize, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.

    4- A medida concreta da pena é fixada, nos termos do n° 1 do artigo 71° do CP, ou seja, em função da culpa, tomando-se em conta as exigências de prevenção de futuros crimes e as demais do n° 2 daquele preceito, que deponham a favor ou contra o arguido.

    5- Não tem qualquer sentido sujeitar quem quer que seja a cumprir uma pena de prisão mais de 6 anos sobre o cometimento dos factos, mantendo o arguido bom comportamento.

    6- Só essa situação, por si, justificava a opção pela pena não detentiva.

    7- Se de outra forma se entendesse, face ao previsto no artigo 50° do CP, a pena devia ser declarada suspensa na sua execução, face às circunstâncias específicas do recorrente.

    8- Face à moldura penal abstracta, no que à multa concerne, vistos os critérios supra referidos, adequar-se-ia a multa de 200 dias de multa à taxa diária de 5?.

    9- Face à moldura penal abstracta, no que à prisão concerne, ponderados os critérios supra referidos, adequar-se-ia a pena de 9 meses de prisão.

    10- Por se verificarem os respectivos condicionalismos, a pena de prisão, a ser determinada, deve ser suspensa na sua execução.

    11- A decisão recorrida, ao fixar as penas de modo e medida diferentes, violou os artigos 70°, 71°, eventualmente o 72° e ainda o artigo 50°, todos do CP.

    12- Revogando-se a mesma nos termos sobreditos, far-se-á justiça.?

    Na resposta à motivação do recurso (fls. 2430 e seguintes), o Ministério Público formulou as seguintes conclusões:

    ?1. O arguido falsificou os elementos identificativos de vinte veículos automóveis;

  3. Destes, vendeu nove a pessoas que desconheciam a falsificação;

  4. Em julgamento não confessou os factos e não mostrou arrependimento;

  5. Estes automóveis foram submetidos à inspecção anual obrigatória (após o quarto ano de matriculação) e a falsificação não foi detectada;

  6. Só foi descoberto por delação de um ex-empregado [...];

  7. A falsificação denunciada foi confirmada em exame pericial especializado, confrontado o arguido em julgamento com o perito que elaborou o exame, continuou a negar a evidência da falsificação a que procedeu em cada um dos veículos;

  8. Além destes veículos outros houve que não foi possível examinar devido à morosidade da investigação e ao pedido de aceleração processual apresentado na fase de inquérito;

  9. Mesmo sem prova da falsificação de mais veículos, os vinte falsificados dão uma ideia muito clara que este comportamento não foi episódico ou esporádico, mas sim uma actividade em dose apreciável de grande reiteração, quiçá bastante lucrativa;

  10. O arguido continua a ser o dono da oficina «B.», continua a ter os mesmos meios para continuar a mesma actividade criminosa e a ligeireza nas explicações de procedimentos e a irresponsabilidade demonstrada em julgamento, são sérias indicações de uma personalidade deformada que não se demoverá desta actividade delituosa sem cumprimento efectivo de pena de prisão;

  11. A pena de 3 anos e 3 meses de prisão traduz a culpa do arguido e as exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir e teve em atenção o grau elevado de ilicitude do facto, o dolo intenso e reiterado com que agiu, o modo como agiu e o prejuízo que causou aos adquirentes e à sociedade;

  12. Esta pena, superior a 3 anos de prisão, é impeditiva da suspensão da execução da pena, nos termos do nº 1 do art. 50º do CP;

  13. Mas, mesmo que a mesma fosse inferior, a mera censura do facto e a ameaça da prisão não são, neste caso, suficientes nem adequadas às finalidades da punição, exigindo-se que a ressocialização do arguido passe pelo cumprimento de pena de prisão;

  14. Nenhuma das normas penais apontadas pelo recorrente foram violadas, devendo ser negado integral provimento ao recurso, confirmando-se o douto acórdão recorrido.?

  15. Por acórdão de 30 de Janeiro de 2003 (fls. 2452 e seguintes), o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso do arguido, podendo ler-se no respectivo texto, para o que aqui releva, o seguinte:

    ?[...]

    [...] impugna também o recorrente a medida da pena que lhe foi infligida.

    Pretende ele que, a improceder a opção pela pena de multa, a prisão deve ser fixada em 9 meses de prisão.

    Vejamos, pois, começando por analisar os poderes de cognição deste Tribunal em matéria de medida concreta da pena.

    Mostra-se hoje afastada a concepção da medida da pena concreta, como a «arte de julgar»: um sistema de penas variadas e variáveis, com um acto de individualização judicial da sanção em que à lei cabia, no máximo, o papel de definir a espécie ou espécies de sanções aplicáveis ao facto e os limites dentro dos quais deveria actuar a plena discricionariedade judicial, em cujo processo de individualização interviriam, de resto coeficientes de difícil ou impossível racionalização.

    De acordo com o disposto nos arts.º s 70º a 82º do Código Penal a escolha e a medida da pena, ou seja a determinação das consequências do facto punível, é levada a cabo pelo juiz conforme a sua natureza, gravidade e forma de execução, escolhendo uma das várias possibilidades legalmente previstas, traduzindo-se numa autêntica aplicação do direito. Não só o Código de Processo Penal regulou aquele procedimento, de algum modo autonomizando-o das determinação da culpabilidade (cfr. arts. 369º a 371º), como o nº 3 do art. 71º do Código Penal (e antes dele o nº 3 do art. 72º na versão originária) dispõe que «na...

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