Acórdão nº 62/03 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Fevereiro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Artur Maurício
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 62/2003

Proc. nº. 351/02

  1. Secção

Relator: Consº. Artur Maurício

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 – Por decisão do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho (IDICT) – Delegação de Coimbra - de 5.07.2001 o B foi condenado como autor de uma contra-ordenação laboral (artigo 10º do Decreto-Lei nº. 421/83, na redacção dada pelo artigo 14º da Lei nº. 118/99, em conjugação com o Despacho publicado no Diário da República, II Série de 17.11.1992 punível nos termos dos artigos 7º, nº. 4 e 9º, nº. 1, al. d), da Lei nº. 116/99) a pagar uma coima de Esc. 1 500 000$00, considerando a gravidade da infracção e o grau de culpa do arguido.

Inconformado, interpôs recurso para o Tribunal de Trabalho de Coimbra tendo arguido inconstitucionalidades, à semelhança do que fizera na contestação ao auto de notícia lavrado nos autos pelo IDICT.

O Tribunal de Trabalho de Coimbra por sentença de 23.10.2001 manteve a condenação e a coima aplicada pelo IDICT (cfr. fls. 238 a 248).

O acoimado interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo concluído a sua alegação nestes termos:

"1. O artigo 125º do CPA não é aplicável ao caso dos autos pois o direito contraordenacional é um ramo do direito penal – é um direito especial – e não direito administrativo;

2. O Governo foi autorizado a legislar ao abrigo da al. u) do nº1 do artigo 168º da CRP e não da al. d) daquela disposição da Lei Fundamental;

3. Assim, o artigo 125º do CPA, é inconstitucional, por violação do artigo 165º nº1 al. d) da CRP se, e na exacta medida em que, a sua previsão incluir o caso dos autos.

4. A decisão do senhor Delegado do Idict deve ser considerada nula por lhe ser aplicada o artigo 379º do Código Penal por remissão do artigo 41 do Regime Geral das Contra Ordenações, ou serem tais disposições consideradas inconstitucionais por violação dos direitos de defesa do arguido previstos no artigo 32º nº 10 da CRP.

5. É por isso nula ou inexistente a decisão proferida nos autos pelo Senhor Delegado do Idict de Coimbra.

6. À data em que foi proferida a decisão recorrida, bem como actualmente, a competência para aplicação de coimas correspondentes às contra-ordenações laborais é exclusiva do Inspector-Geral do Trabalho, de harmonia com o disposto no artigo 4º nº2, al. c) do D.L. 102/2000 de 2 de Junho.

7. O D.L. 102/2000 de 2 de Junho é material, orgânica e formalmente inconstitucional na parte em que atribui ao Senhor Inspector-geral do Trabalho competência para aplicação de coimas, cfr. artigo 4º, nº2, al.c), e à Inspecção Geral do Trabalho o desenvolvimento da acção sancionatória, cfr. 6º a 13º do citado diploma.

8. Tais inconstitucionalidades advêm do facto da matéria neles vertida integrar regime geral de actos ilícitos de ordenação social e respectivo processo, sendo que por isso teria que ser objecto de Lei da Assembleia da República ou de Decreto Lei do Governo se este para tal estivesse autorizado, conforme resulta da conjugação dos artigos 165º nº1 al. d), e 198º, ambos da CRP..

9. O despacho de delegação de poderes 8616/2001 de 2 de Abril, publicado no Diário da República II Série, de 24 de Abril de 2001 por ter como norma habilitante o artigo 4º nº2 al.c) e nº3 do Decreto Lei 102/2000, é consequentemente inconstitucional, não podendo ter efeito qualquer decisão proferida ao seu abrigo.

10. A falta de registo do fundamento de trabalho suplementar antes de terminada a sua prestação não constitui qualquer contra ordenação porquanto não está tipificada na lei.

11. Considerar que o artigo 10º nº2 do DL 421/83 tipifica a falta de registo de trabalho suplementar antes do seu término como contra ordenação é manifestamente inconstitucional e viola o artigo 165º nº1 al.d) da CRP.

12. O fundamento encontrava-se registado no registo informático do trabalho suplementar, pelo que, ainda que a sua omissão integrasse contra-ordenação, não foi cometida qualquer infracção.

13. A recorrente não podia registar o descanso compensatório gozado pelo trabalhador porquanto o mesmo efectivamente ainda não gozou qualquer descanso compensatório.

14. O registo do descanso compensatório não faria qualquer sentdoi e por não ter existido faria a recorrente incorrer na comissão de crime de falsas declarações.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se o arquivamento dos autos como é de inteira justiça".

A Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra proferiu acórdão em 28.02.2002 em que, remetendo para reiterada e firme jurisprudência ali fixada, negou provimento ao recurso de impugnação, mantendo a decisão recorrida (cfr. fls. 275 a 282 dos autos).

Veio de novo o arguido recorrer, agora para o Tribunal Constitucional, tendo dito no requerimento de interposição de recurso:

"I. Aplicou ao processo contra ordenacional o artigo 125º do Código de Procedimento Administrativo admitindo, por conseguinte, que a decisão administrativa estava devidamente fundamentada.

A interpretação dada àquele preceito, aplicando-o ao processo contraordenacional, inclui na sua previsão matéria contra ordenacional.

Ao incluir tal matéria na previsão daquela disposição torna-se a mesma, e nessa medida, inconstitucional por violação do direito de Defesa concedido ao arguido em processo contra-ordenacional pelo artigo 32º nº. 10 da Constituição da República e por violação da reserva relativa de competência da Assembleia da república consagrada no artigo 165º nº 1 al. d) da Constituição da República.

  1. Não considerou inconstitucional os artigos 4º nº2 al.c) e 6º, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12 e 13º do DL 102/2000, que estabelecem respectivamente a competência do Inspector Geral de Trabalho para aplicar coimas correspondentes às contra-ordenações laborais e actividade sancionatória e inspectiva da Inspecção Geral do Trabalho. Por esse motivo julgou competentes os intervenientes processuais.

    Aquelas normas respeitam ao processo de ilícito de mera ordenação social e por consequência são da competência da Assembleia da República reserva relativa porém constam de um decreto lei sem...

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