Acórdão nº 523/04 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Julho de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução14 de Julho de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 523/04 Processo n.º 101-B/03 3ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. A., ora recusante, requereu, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, a suspensão de eficácia da deliberação do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, em 26 de Outubro de 2001, que negou provimento ao recurso que interpusera da deliberação do Conselho Distrital do Porto da mesma Ordem, em que lhe fora aplicada a pena unitária de dois anos de suspensão, a cumprir logo que lhe fosse levantada a suspensão de inscrição naquela Ordem, provocada pela incompatibilidade resultante do exercício de funções de revisor de contas. O Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, por sentença de 18 de Junho de 2002, julgou caduca a providência requerida.

  2. Inconformado com o assim decidido, recorreu o ora recusante para o Tribunal Central Administrativo, o qual, por acórdão de 20 de Agosto de 2002, negou provimento ao recurso.

  3. De novo inconformado com o decidido e após ter arguido nulidade por falta de fundamentação da condenação em custas, a qual foi desatendida, o ora recusante veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional daquele acórdão, de 20 de Agosto de 2002, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.

  4. Já neste Tribunal, foi o ora recusante convidado pelo então relator, nos termos do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, a completar o requerimento de interposição do recurso, tendo respondido com o requerimento de fls. 228.

  5. Por decisão sumária de fls. 230 dos autos de recurso, foi decidido não tomar conhecimento do recurso, por não estar presente “a totalidade dos requisitos a que deve obedecer o recurso esteado na alínea b)do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82”.

  6. Notificado desta decisão sumária, veio o ora recusante notificar o então relator, “para efeitos do artigo 126º do Código de Processo Civil”, através de um requerimento que tem o seguinte teor:

    “[...] A. O Relator nos presentes autos - só nos trâmites da decisão sumária recém-proferida devidamente identificado - é, consabidamente:

    primo - um dos queixosos na origem do Proc. n.º 1101/3TDLSB do Juízo 1.ºA do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, em que, único denunciado, foi o advogado signatário em tempo constituído arguido; e,

    secundo - bem assim um dos denunciados pelo advogado signatário no quadro do Inquérito-crime n° 24/2000 do Supremo Tribunal de Justiça, autos que, competentemente requerida a abertura da instrução em 17-IX-2001, correm actualmente termos no Proc. n° 2806/2002 da 3ª Secção daquele Supremo Tribunal.

    1. Nesta conformidade, encontra-se o advogado aqui Recorrente, em causa própria objectiva e subjectivamente qualificado para, de harmonia com o disposto na al. c) do n° 1 e no n° 2 do art. 127° do Cód. de Processo Civil, por remissão do n.º 1 do art. 29° da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional. deduzir nos presentes autos o pertinente incidente de suspeição. Todavia.

    2. o comando do n.º 2, por remissão do n.º 3, do art. 128º do mesmo Código prevê expressamente que a parte processual virtualmente lesada -- in casu, duplamente: arguido e participante -- denuncie ao próprio recusando o fundamento da suspeição, em ordem a permitir que seja antes este a pedir escusa no processo. Esta, por conseguinte, a comunicação que, para o efeito preceituado, é aqui formalmente cumprida. [...].”

  7. Na sequência, não tendo o então relator usado, nos termos da segunda parte do n.º 2 do art.º 128º do Código do Processo Civil, da faculdade prevista no artigo 126º do mesmo diploma, o ora recusante veio deduzir um incidente de recusa de juiz.

  8. A fls. 4 do apenso A relativo ao incidente de suspeição, o juiz recusado veio pronunciar-se sobre a dedução do incidente nos seguintes termos:

    “Nos termos do n.º 1 do art.º 129° do Código de Processo Civil, o ora recusado tem a dizer que, efectivamente, no Acórdão n.º 571/2000, tirado por este Tribunal em 13 de Dezembro de 2000 e em que o signatário interveio, foi determinada a extracção de certidão de certas peças processuais e a sua entrega ao Representante do Ministério Público, já que se considerou que as asserções utilizadas numa daquelas peças pelo ora recusante apontavam, indiciariamente, para o cometimento de um ilícito de natureza criminal, pelo qual os Juízes subscritores do aludido aresto desejavam exercitar queixa.

    Sabe o recusado, por ter sido notificado nos termos do n.º 5 do art.º 283º do Código de Processo Penal, que, em 21 de Junho de 2002, o Ministério Público deduziu acusação contra o recusante, desconhecendo qual o ulterior processamento dos autos em que essa acusação foi deduzida. [...]”

  9. Pelo acórdão n.º 279/03, de 28 de Maio de 2003, foi deferido o incidente, com a seguinte fundamentação:

    “[...] Se, contudo, ocorrer alguma das situações previstas no termos do artigo 127º do Código de Processo Civil e a parte que tenha legitimidade para o efeito opuser a suspeição, não há que avaliar se tal situação é ou não apta a fazer perigar a imparcialidade do juiz; a oposição de suspeição ou o pedido de escusa devem, salvo os casos previstos no n.º 3 do citado artigo 127º, ser deferidos, evitando-se, assim, que o juiz seja colocado numa situação em que se possa duvidar da sua imparcialidade, mas não se formulando, de modo algum, qualquer juízo de censura ou suspeita em concreto.

    [...]

    Está, deste modo, suficientemente provado (declarações transcritas supra) estar em curso (ou ter estado, nos três anos antecedentes), pelo menos, um processo crime relativo à queixa apresentada contra o recusante na sequência do acórdão 571/2000 deste Tribunal Constitucional, verificando-se, consequentemente, o fundamento de suspeição previsto na alínea c) do n.º1 e no n.º 2 do artigo 127º do Código de Processo Civil, sem que se mostre preenchida a previsão do n.º3 do mesmo artigo. [...]”

  10. Transitada em julgado esta decisão e notificado da conta de custas relativa à decisão sumária, entretanto igualmente transitada em julgado, veio o ora recusante de novo aos autos, em 11 de Julho de 2003, apresentar “Reclamação ao abrigo do art. 60º do Código das Custas Judiciais”, invocando o seguinte:

    “I. Da ilegalidade da remessa dos autos à conta

    1. Nos termos, conjugadamente, dos artigos 50.º e 51.º do Código supramencionado (que também a Secretaria desse Alto Tribunal deve observar), são remetidos à conta apenas os processos:

      (i) que impliquem o pagamento de custas, por trânsito em julgado da decisão final;

      (ii) que se encontrem suspensos, se tal for judicialmente determinado;

      (iii) que estejam parados há mais de 3 meses por falta das partes. Ora,

    2. como é bom de ver, nenhuma destas situações ocorre in casu. Começando pela ordem inversa:

      1. nos autos em questão foi proferida uma decisão colegial em Maio último, pelo que, obviamente, não se encontram os mesmos parados há 3 meses;

      ii) pelo menos desde a prolação do acórdão supramencionado, não foi nesses autos decretada -- que o Recorrente saiba -- a suspensão da instância; e,

      iii) o processo em causa não só não implica o pagamento de custas, como nem sequer foi nele proferida decisão final. Apreciar-se-á em pormenor, de seguida, este duplo aspecto do caso.

    3. Ao "deferir o presente incidente de suspeição" (sic), tem o Acórdão de 28-V-2003 nos pendentes autos o irrecusável mérito de atestar, implícita mas inequivocamente, que a decisão “sumária" do ex-Relator constitui um acto judicial a non domino, demais a mais vertida num quadro .jurisdicional de aferição de valores supralegais: constitucionais e eurocomunitários, perfeitamente concordantes, em sede da garantia fundamental ao processo judicial equitativo (tendo aliás sido nesse aresto expressamente declarada ”prejudicada a decisão quanto à questão pré-judicial” adrede suscitada pelo R.). Vale isto por afirmar que tal despacho, porquanto violando ostensivamente os comandos do art. 203.º, in fine, e, sobretudo, do art. 204.º da Constituição vigente, constitui -- em virtude do preceituado no n.° 3 do art. 3.º outrossim da Lei Fundamental pátria -- um acto judicial nulo ipso jure.

    4. Nessa exacta medida., o decisão unipessoal em questão é do conhecimento oficioso por qualquer tribunal -- desde logo, necessariamente, no Alto Tribunal da causa --, podendo ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado (art. 286º, ex vi do 295º, do Código Civil). Consequentemente,

    5. deveria in casu ter sido oficialmente designado novo Relator no processo, e desse acto notificadas as partes na acção. O Recorrente, pela sua parte, não foi disso notificado: é esse Alto Tribunal, portanto, que se encontra em mora.

      1. Da inconstitucionalidade da tributação em custas do processo

    6. Da certidão da conta notificada flui claramente que as custas aí contadas decorrem da aplicação no caso do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7/X, diploma “legal” esse cujos preceitos de natureza tributária são, consabidamente, "materialmente inconstitucionais, aliás por duas ordens' de razões: i) por violação do principio fundamental (de raiz eurocomunitária) da gratuitidade do processo judicial; e ii) por violação do princípio fundamental do Estado de direito democrático, sobretudo do inerente subprincípio da reserva de lei", conforme o Recorrente demonstra, justamente, nas suas alegações de recurso no Proc. n.º 26/2002 também dessa 3.ª Secção do Tribunal Constitucional. Consequentemente,

    7. também -- recte: muito principalmente -- por isso nenhum pagamento de custas existe, validamente, pendente no presente processo.

      Termos por que REQUER seja, como deve ser, sucessivamente declarada nestes autos a nulidade de pleno direito:

      1. da decisão sumária proferida pelo ex-Relator;

      2. do acto administrativo de remessa do processo à conta;

      3. da notificação da conta efectuada pela Secretaria,

      a fim de ser outrossim devidamente notificada ao Recorrente, logo que oportuno, a designação de novo Relator, em ordem ao prosseguimento do recurso de que se trata.

  11. Notificado para...

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