Acórdão nº 629/05 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução15 de Novembro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 629/2005 Processo n.º 893/04 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Mário Torres

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

1. Relatório

Por sentença de 11 de Maio de 2001, transitada em julgado em 31 de Maio de 2001, do Tribunal Judicial da Comarca de Ourique, foi concedido provimento à impugnação judicial que A. deduzira contra o despacho da Delegação Distrital de Beja da Direcção-Geral de Viação, de 2 de Maio de 2000 – que lhe aplicara, como autor da contra-ordenação prevista no artigo 27.º, n.º 1, do Código da Estrada, cometida em 19 de Fevereiro de 2000, a coima de 30 000$00 e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias –, mantendo aquelas sanções, mas suspendendo pelo período de 7 meses a execução da medida de inibição de conduzir, suspensão condicionada à prestação de uma caução de boa conduta fixada em 50 000$00.

Posteriormente, por decisão da mesma entidade administrativa, de 25 de Outubro de 2002 – que se tornou definitiva, por falta de impugnação judicial –, foi aplicada ao mesmo infractor (que havia procedido ao pagamento voluntário da coima), como autor de idêntica contra-ordenação, cometida em 5 de Agosto de 2001, a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 60 dias, com execução suspensa pelo período de 365 dias, condicionada à prestação de caução de boa conduta fixada em € 400.

Por despacho do Tribunal Judicial da Comarca de Ourique, de 12 de Julho de 2003, foi, nos termos do artigo 143.º do Código da Estrada, revogada a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução decretada pela sentença de 11 de Maio de 2001 e quebrada a caução prestada, uma vez que o arguido cometera, em 5 de Agosto de 2001, durante o período de suspensão, contra-ordenação da mesma natureza (grave) e tipo (excesso de velocidade).

Contra este despacho de 12 de Julho de 2003, só notificado ao arguido por carta registada expedida em 4 de Março de 2004 (considerando-se a notificação efectivada no subsequente dia 8, pois dia 7 foi Domingo), interpôs o mesmo arguido recurso para o Tribunal da Relação de Évora, sustentando a prescrição da sanção acessória de inibição de condução. Segundo o recorrente, o prazo de prescrição de um ano (artigos 29.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, e 31.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Março), quer se considere iniciado na data do trânsito da primeira decisão judicial (31 de Maio de 2001), quer na data da prática da segunda infracção (5 de Agosto de 2001), quer na data em que se tornou definitiva a decisão administrativa que sancionou a segunda infracção (Dezembro de 2002), sempre se esgotou antes da data daquela notificação (8 de Março de 2004).

O representante do Ministério Público na Comarca de Ourique respondeu à motivação do recurso, sustentando o seu improvimento, por considerar que a contagem do prazo prescricional da sanção acessória de inibição de conduzir apenas se inicia, nos casos em que tenha sido decretada a suspensão da execução dessa sanção, após o trânsito do despacho judicial que venha a revogar a suspensão da execução.

No Tribunal da Relação de Évora, o representante do Ministério Público emitiu parecer, acompanhando a resposta à motivação.

Tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o recorrente veio pronunciar-se, aduzindo que a argumentação expressa na resposta do representante do Ministério Público na 1.ª instância, sufragada pelo representante da mesma magistratura no Tribunal da Relação de Évora, “levada ao extremo, gerará um efeito perverso e juridicamente intolerável”, porquanto:

“5 – A argumentação ali expressa poderá levar, ultima ratio, a que qualquer situação ou decisão condenatória (seja uma pena, uma medida de segurança, uma sanção acessória em processo de contra-ordenação, ou outra abstractamente configurável) que venha a ter uma decisão de suspensão da sua execução, ficará, apenas e só, para efeitos de relevância para início de contagem de prazo prescricional, dependente de um acto de um juiz ou da autoridade que a aplicou, acto que pode (ou não) ocorrer a todo e qualquer tempo, sem dependência ou influência de qualquer outro facto ou acto relevantes para efeitos de contagem de prazos prescricionais, fazendo-se, por tudo, tábua rasa das implicações do decurso do tempo nas relações, actos e factos jurídicos;

6 – Ora, tal entendimento, para além do mais, viola, em nossa opinião, as garantias penais e os direitos dos cidadãos e arguidos alvo de tais sanções, que estejam nessa situação;

7 – Criando, dessa forma, uma sorte de imprescritibilidade das penas, medidas de segurança e sanções parapenais ou de cariz e natureza idêntica e similar, frontalmente violadora da lei e dos princípios constitucionais a este respeito consagrados;

8 – A ser sufragado este entendimento, a interpretação assim efectuada das normas em causa seria, ademais, para além de desconforme à lei, violadora da Constituição e dos seus princípios, mormente dos artigos 30.º, n.º 1, e 32.º da CRP, o que se invoca, também aqui, para os devidos e legais efeitos.”

O Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 13 de Julho de 2004, negou provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:

“A matéria de facto a ter em conta para decidir tal questão [a da prescrição da sanção acessória de inibição de conduzir] é já referida no n.º 1 deste acórdão e, assim, limitamo-nos agora a destacar o seguinte:

– Pelo cometimento de uma contra-ordenação grave praticada em 19 de Fevereiro de 2000, o ora recorrente foi condenado, em 11 de Maio de 2001, por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Ourique transitada em julgado em 31 de Maio de 2001, na sanção acessória de 30 dias de inibição de conduzir, suspensa na sua execução pelo período de 7 meses;

– Tendo ele praticado nova contra-ordenação grave em 5 de Agosto de 2001, pagou a respectiva coima e foi condenado, em 25 de Outubro de 2002, e como reincidente, na sanção acessória de 60 dias de inibição de conduzir, suspensa na sua execução pelo período de 365 dias;

– Face a esta nova condenação, foi revogada aquela primeira suspensão por douto despacho de 12 de Julho de 2003, notificado ao arguido por carta de 4 de Março de 2004.

No entender do arguido, sendo o prazo prescricional da sanção acessória de um ano, aquando da prolação do despacho sob recurso (12 de Julho de 2003), a sanção acessória respectiva já se encontrava prescrita.

Mas a razão não está do lado do recorrente.

Vejamos porquê:

A prescrição das coimas encontra-se estabelecida no artigo 29.º da Lei Quadro das Contra-Ordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro), onde, sob a epígrafe «Prescrição da coima», se dispõe:

«1. As coimas prescrevem nos prazos seguintes:

a) Três anos, no caso de uma coima superior ao montante máximo previsto no n.º 1 do artigo 17.º;

b) Um ano, nos restantes casos.

2. O prazo conta-se a partir do carácter definitivo ou do trânsito em julgado da decisão condenatória.»

E, encimado pela epígrafe «Suspensão da prescrição da coima», prescreve-se no artigo 30.º do mesmo Decreto-Lei:

«A prescrição da coima suspende-se durante o tempo em que:

a) Por força da lei a execução não pode começar ou não pode continuar a ter lugar;

b) A execução foi interrompida;

c) Foram concedidas facilidades de pagamento.»

Quanto à «Interrupção da prescrição da coima», prescreve-se no artigo 30.º-A do mesmo Decreto-Lei:

«1. A prescrição da coima interrompe-se com a sua execução.

2. A prescrição da coima ocorre quando, desde o seu início e ressalvado o tempo da suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade.»

E, no que tange à «Prescrição das sanções acessórias», preceitua-se no artigo 31.º do referido Decreto-Lei que «Aplica-se às sanções acessórias o regime previsto nos artigos anteriores para a prescrição da coima».

Refira-se ainda que, quanto à aplicação do direito subsidiário, dispõe-se no artigo 32.º, ainda do referido Decreto-Lei n.º 433/82, que «Em tudo o que não for contrário à presente lei aplicar-se-ão subsidiariamente, no que respeita à fixação do regime substantivo das contra-ordenações, as normas do Código Penal».

E anote-se, finalmente, que, de acordo com o artigo 57.º do Código Penal:

«1. A pena é declarada extinta se, decorrido o período da sua suspensão, não houver motivos que possam conduzir à sua revogação.

2. Se, findo o período da suspensão, se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação ou incidente por...

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