Acórdão nº 314/06 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Helena Brito
Data da Resolução17 de Maio de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 314/2006

Processo n.º 828/05

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Helena Brito

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. O magistrado do Ministério Público junto do 1º Juízo Cível do Tribunal de Menores e Família e de Comarca de Portimão reclamou, nos termos do artigo 865º, n.º 2, do Código de Processo Civil, por apenso a uns autos em que era exequente o Banco A., S.A. e executados “B., Lda.” e outros, certos créditos por dívidas à Fazenda Pública, referentes a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e a custas em processo de execução fiscal (fls. 2 e seguintes).

    Por sentença de 27 de Novembro de 2001 do juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão (fls. 17 e seguintes), foi graduado, em primeiro lugar, o crédito referente às custas da execução e, seguidamente, o crédito referente a IVA.

  2. A fls. 26 e seguintes, veio o Banco C., S.A. – Sociedade Aberta reclamar o seu crédito, referente a um empréstimo que concedera à sociedade executada, garantido por penhor mercantil constituído sobre o “direito ao trespasse e arrendamento do seu [da executada] estabelecimento de papelaria […], como universalidade, nele compreendendo as posições de arrendatária do local onde funciona, licenças, alvarás, instalações e ainda utensílios, mobiliário e máquinas […]”.

    Por sentença de 15 de Abril de 2004 do juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão (fls. 60 e seguintes), foi graduado este crédito à frente do crédito exequendo.

  3. Por despacho de fls. 69, foi ordenada a notificação ao Ministério Público da reclamação apresentada pelo Banco C., S.A. – Sociedade Aberta e da sentença que verificou e graduou o crédito que este Banco reclamara (supra, 2.) e, bem assim, a notificação ao Banco C. da reclamação apresentada pelo Ministério Público e da sentença que verificou e graduou o crédito por este reclamado (supra, 1.), para dizerem o que tivessem por conveniente.

    Não houve, porém, qualquer impugnação.

  4. Em 18 de Março de 2005, o juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão proferiu sentença do seguinte teor (fls. 80 e seguintes):

    “[…]

  5. Graduação: Os créditos resultantes do Imposto sobre o Valor Acrescentado, como imposto indirecto que é (pois incide sobre actos ou factos isolados, não sendo uma obrigação que se renova automaticamente […]), gozam de privilégio creditório mobiliário geral, nos termos do artigo 736º, n.º 1 do Código Civil.

    Ora, os privilégios mobiliários, de acordo com o artigo 735º do Código Civil, efectivam-se sobre todo e qualquer bem móvel penhorado na execução. Ou seja, trata-se de garantia que apenas incide quando na execução se penhorem bens móveis, o que ocorreu.

    Os privilégios mobiliários gerais atribuem ao credor a faculdade de ser pago com preferência a outros quando sejam penhorados bens móveis do devedor (cfr. art. 733º e 735º Código Civil) e incluem-se no conceito lato de garantia real que o legislador utiliza para efeitos de graduação de créditos.

    O crédito reclamado pelo «Banco C.» goza da preferência resultante do penhor mercantil (que incide, como já se decidiu nos autos, sobre todo o estabelecimento, enquanto unidade jurídica).

    […]

    Ora, de acordo com o preceituado nestas disposições legais [artigos 666º, n.º 1, e 749º, n.º 1, do Código Civil], facilmente se conclui que, no confronto do direito de crédito garantido por privilégio mobiliário geral (como é o caso do IVA) e o direito de crédito garantido por penhor assume este último a prevalência na ordem de graduação, ainda que o primeiro seja de constituição anterior […].

    Esta não é, contudo, uma solução jurisprudencialmente pacífica […].

    No primeiro dos arestos citados (em cujo processo está em apreciação a graduação de um crédito garantido por penhor e um crédito de IVA, tal qual sucede nestes autos) pode ler-se que, uma vez que o artigo 10º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 103/80 conferiu aos créditos da Segurança Social prevalência sobre o penhor, estabeleceu um regime específico em oposição ao regime geral da graduação, pelo que, mesmo nos casos em que concorram apenas créditos do Estado por imposto e créditos garantidos por penhor, deve graduar-se aquele em primeiro lugar.

    Compreende-se a preocupação subjacente à solução apontada por tal aresto: a de obtenção de uma interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8º, n.º 3, parte final, do Código Civil).

    Contudo, e com todo o respeito, que é muito por aquela opinião, não a sufragamos.

    A situação em apreço é análoga àquela que se colocava na relação com o crédito da Segurança Social e aquele que se encontrava garantido por hipoteca (anote-se que o penhor apenas pode incidir sobre créditos ou direitos não susceptíveis de hipoteca). O regime especial atribuía prevalência na graduação aos créditos garantidos por privilégio imobiliário geral em relação a créditos garantidos por hipoteca.

    Este entendimento veio, porém, a ser declarado inconstitucional (veja-se Acórdãos do TC, 362/2002 e 363/2002, publicados no DR, de 16.10.2002). Na esteira de...

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