Acórdão nº 147/06 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Fevereiro de 2006

Data22 Fevereiro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 147/06

Processo n.º 402/05

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Helena Brito

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. A. requereu em 2 de Março de 2004, junto do Tribunal do Trabalho de Lisboa, exame de revisão de incapacidade decorrente de acidente de trabalho de que fora vítima, nos termos do artigo 145º do Código de Processo do Trabalho (fls. 243).

    Por despacho do juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, indeferiu-se o requerido, pelos seguintes fundamentos (fls. 245):

    “Dispõe, tanto o n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127 de 03-08-1965, como o n.º 2 do art° 25° da Lei n.º 100/97 de 13 de Setembro, que «a revisão só poderá ser requerida dentro dos 10 anos posteriores à data da fixação da pensão (...)».

    A pensão em apreço foi fixada em 04-11-1992, data em que o acordo de fls. 15 e ss foi homologado.

    O requerimento de fls. 243, através do qual o sinistrado pede a realização de exame de revisão, entrou em juízo em 02-03-2004.

    Constata-se, assim, que o prazo de 10 anos se encontra largamente ultrapassado, razão pela qual se indefere o ora requerido.”

  2. Inconformado com este despacho, A. dele interpôs recurso de agravo (fls. 248), tendo nas alegações respectivas (fls. 249 e seguintes) concluído do seguinte modo:

    “1. O ora recorrente é o sinistrado nos presentes autos,

  3. Tendo em atenção a sua diminuição da capacidade de ganho e o facto de se encontrar pior das lesões sofridas, requereu a revisão da sua incapacidade,

  4. Acontece que tal pedido foi indeferido, por se ter considerado que desde a fixação inicial da pensão já haviam passado mais de 10 anos,

  5. Não concordando com tal decisão o ora recorrente apresentou o presente recurso.

  6. O Mmº Juiz a quo parte da presunção errada de que a fixação a que se refere o n.º 2 da Base XXII da Lei 2127 de 3-8-1965 e o n.º 2 do artigo 25° da Lei 100/97 de 13 de Setembro é a primeira, acontece que tal fixação tanto se pode referir à fixação inicial, como à primeira ou ulteriores revisões,

  7. Como aliás é referido no acórdão da Relação de Évora de 24.03.1988 (R. 68/97), Colectânea de Jurisprudência, 1988, 2, 291.

  8. Tendo a sua incapacidade sido revista e alterada pela última vez a 8 de Janeiro de 2003 ainda não decorreram 10 (dez) anos exigidos.

  9. Violou assim o Mmº Juiz a quo o n.º 2 da Base XXII da Lei 2127 de 3-8-1965 e o n.º 2 do artigo 25° da Lei 100/97 de 13 de Setembro.

  10. Nestes termos e nos mais de direito, requer a V. Ex.as. que seja determinada a anulação do despacho ora recorrido, que indefere o pedido de revisão da incapacidade por ser esta a medida que melhor realizará Justiça!”.

    A decisão recorrida foi mantida, por despacho de fls. 271.

    O representante do Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, do seguinte teor (fls. 276):

    “1. O n.º 2 da Base XXII da L 2127 de 03.8.65 e o n.º 2 do art.º 25º da L 100/97, de 13.7, fixam o prazo de 10 anos para o pedido de revisão.

    Imaginemos […] uma situação clínica de maior degeneração.

    Segundo a orientação do Despacho em crise, a protecção estava condicionada na sua adaptabilidade nos primeiros dez anos após a primeira fixação.

    2- O Legislador terá querido esse limite?

    3- Nos termos do n.º 3 do artº 9º do CC, a interpretação citada no Ac. RE de 24.03.88, CJ 1988-2-291 afigura-se a mais correcta.

    4- Seria, aliás e por violação do artº 13º da CRP, inconstitucional o preceito em tal interpretação.”.

  11. Por acórdão de 26 de Janeiro de 2005, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso, pelos seguintes fundamentos (fls. 279 e seguintes):

    “[…]

    Ao requerido incidente de revisão de incapacidade (ou de revisão de pensão) iniciado com o requerimento de fls. 243, e que deu origem ao despacho recorrido é aplicável, ainda, a Lei 2127, de 03 de Agosto de 1965, na medida em que o acidente do autos teria ocorrido em 04 de Março de 1992 e a nova LAT aprovada pela Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, só entrou em vigor em 1 de Outubro de 1999, aquando da aprovação do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04, sendo certo também que a nova LAT e o Decreto-Lei que a regulamentou só são aplicáveis aos acidentes de trabalho que ocorreram após a entrada em vigor destes mesmos diplomas (cfr. al. a) do n.º 1 do artº 41º da Lei n.º 100/97 de 13/09.

    Dispunha o n.º 2 da Base XXII da citada Lei 2127 que:

    A revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão e poderá ser requerida uma vez em cada semestre, nos dois primeiros anos, e uma vez por ano nos anos imediatos.

    .

    Esta norma passou a ter integral correspondência no artº 25º da nova LAT.

    A questão a decidir no presente recurso consiste em saber se aquele prazo de 10 nos para se requerer a revisão de incapacidade por acidente de trabalho, previsto no n.º 2 daquela Base, se conta apenas do momento da fixação inicial da pensão ou se este prazo se renova, desde que, em ulterior revisão de incapacidade, venha a ser fixada uma incapacidade diferente da inicial.

    A redacção da norma em questão, em que está inserido o advérbio «só», leva-nos, sem dificuldade de interpretação, a considerar que tal norma não comporta outro sentido que não seja o de se considerar que o prazo de 10 anos nela previsto terá de contar-se apenas do momento da fixação inicial da pensão, sem possibilidade de o mesmo se poder renovar em qualquer outra circunstância. É que o advérbio «só» apresenta-se-nos sempre com um significado restritivo, indicando exclusividade e destaque de um único aspecto ou elemento entre vários possíveis (cfr. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, II Vol., pág. 3431).

    E comportando a norma um único sentido, há que atender ao disposto no n.º 2 do artº 9º do Código Civil que dispõe que o intérprete não pode considerar «o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso».

    E que a intenção do legislador não foi outra senão esta, é reforçado pelo disposto no n.º 3 da mesma Base, que excepciona do limite temporal dos 10 anos, constante do seu número anterior, apenas «os casos de doença profissional de carácter evolutivo, designadamente, pneumoconioses», podendo, no que respeita a estes casos, requerer-se a revisão a todo o tempo.

    Quanto à nova LAT, também esta interpretação não nos deixa dúvidas, pois o n.º 2 do seu artº 25º mantém integralmente a redacção do n.º 2 da Base XXII da Lei 2127 e o seu n.º 3, agora sem quaisquer restrições, excepciona daquele limite temporal dos 10 anos todas as doenças profissionais de carácter evolutivo.

    O legislador da nova LAT não desconhecia a discussão anterior à sua entrada em vigor, mesmo a nível jurisprudencial (cfr. Acórdão da Relação de Évora, de 24/03/88, in CJ – Ano 1988 – Tomo II – pág. 291 citado pelo recorrente nas suas alegações e em que fundamenta a sua posição no recurso), mas quis manter seguramente a orientação que vinha maioritariamente sendo perfilhada pela jurisprudência, e que sempre seguimos, no sentido de que aquele prazo de 10 anos se conta a partir da data da fixação da pensão e não mais pode ser renovado, mesmo nos casos de ulteriores revisões de que tenham resultado alterações no grau de incapacidade (cfr., com interesse, o Acórdão do STJ de 11/05/94, in AC. DOUT. 394-1168 e BMJ 437-356 e o que escreve Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª Edição, pág. 128, onde refere expressamente que «a revisão só pode ser requerida dentro dos primeiros dez anos posteriores à data da fixação da pensão...»).

    Tendo a fixação inicial da pensão ocorrido em 04/11/92, data em que o acordo de fls. 15 foi homologado pelo juiz, e tendo o requerimento de exame de revisão de fls. 243, entrado em juízo em 02/03/2004, já há muito havia decorrido aquele prazo de 10 anos constante do n.º 2 da Base XXII da Lei 2127, pelo que bem se decidiu no despacho recorrido indeferir aquele mesmo requerimento.

    […].”.

  12. Deste acórdão interpôs o Ministério Público recurso para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos (fls. 286):

    “[…]

    Fundamenta tal impugnação por violação das normas contidas nos artºs 59°-1-f) e 13° da Constituição da República Portuguesa na interpretação feita da norma contida no n.º 2 da Base XXII da Lei 2127, de 03 de Agosto de 1965, de resto confirmada pela Relação com o n.º 3 da mesma Base, correspondentes hoje às normas dos n.ºs 2 e 3 do artº 25°, da nova LAT aprovada pela Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.

    Atenta a legitimidade [artº 72°-1-a)], a admissibilidade [artº 70°-1-b)] e o prévio suscitamento no parecer emitido nos termos do artº 87°-3 do CPT (artº 75°-A, n.º 2), todos da Lei do Tribunal Constitucional.”

    Este recurso foi admitido por despacho de fls. 323.

  13. Nas alegações (fls. 326 e seguintes), concluiu assim o representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional:

    “1º - A norma constante do n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2172, ao consagrar um prazo – absolutamente preclusivo – de 10 anos, contados da fixação da pensão, para a revisão da pensão devida ao sinistrado por acidente de trabalho, com fundamento em agravamento superveniente das lesões sofridas, viola o princípio da igualdade e o direito à fixação de justa reparação ao sinistrado, constante dos artigos 13º e 5[9]º, n.º 1, alínea [f]) da Constituição da República Portuguesa.

    1. - Termos em que deverá proceder o presente recurso.”.

    A Companhia de Seguros Fidelidade, SA., ora recorrida, não contra-alegou (fls. 331 e seguinte).

  14. A fls. 336 e seguintes...

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