Acórdão nº 197/14.2TTBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2020
Magistrado Responsável | MOIS |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO Apelante: J… (sinistrado).
Apelada: J… (réu).
Tribunal Judicial da Comarca de Beja, Juízo do Trabalho.
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O sinistrado veio, em 22.11.2018, requerer exame de revisão da incapacidade, em virtude de ter ocorrido agravamento das lesões sofridas em consequência do acidente de trabalho dos autos.
O tribunal recorrido admitiu o incidente e ordenou várias diligências, entre as quais exame por perita médico legal.
Realizada as diligências, verifica-se que a perita médico legal emitiu laudo no sentido de que se mantém a IPATH anteriormente fixada, tendo-se agravado a IPP de 50% para 57,25%.
Resulta ainda dos elementos clínicos juntos aos autos, nomeadamente relatório médico legal e parecer de ortopedia, que o sinistrado esteve com incapacidade temporária absoluta para o trabalho, nos períodos de tempo seguintes: 21.01.2008 a 01.02.2008; 07.12.2008 a 20.12.2008; e 15.01.2012 a 31.01.2012, em que esteve internado no Serviço de Ortopedia, devido a osteomielite crónica agudizada como sequela de fratura dos ossos da perna esquerda. Foi também seguido em consulta externa nos anos de 2008, 2009, 2012, 2014, 2015 e 2016.
Após estas diligências, foi proferida a decisão seguinte: “J…, com o patrocínio do Ministério Público, veio requerer, a fls. 186 e seguintes, a revisão da incapacidade que lhe foi atribuída na sequência do acidente de trabalho objeto destes autos, alegando, para tanto, que se agravaram as respetivas sequelas.
Foi realizado exame médico-legal no qual se concluiu manter a IPATH do sinistrado com agravamento da incapacidade funcional residual para 57%.
Cumpre decidir (art. 145.º n.º 6, do Código de Processo do Trabalho), considerando a seguinte factualidade com relevo para a causa.
- Na sequência do acidente objeto destes autos, ocorrido a 03.06.1994, por despacho homologatório de acordo judicial em auto de conciliação, proferido a 20.12.1995 no âmbito deste processo, foi atribuída ao sinistrado, uma Incapacidade Absoluta para o seu Trabalho Habitual (IPATH), com coeficiente de desvalorização de 50% de IPP, desde 27.11.1995 e, considerando o rendimento anual do sinistrado no valor de 1.219.400$00 (6.082,34€), foi o empregador condenado a pagar, entre outras prestações, uma pensão anual e vitalícia no montante de 641.853$00 (€3.201,55) - fls. 54 a 55 dos autos principais.
- Com data de 15.03.1999 o empregador requereu a revisão da incapacidade do sinistrado por entender que o mesmo havia sofrido uma melhoria das sequelas do acidente (fls. 259 dos autos principais), tendo sido proferida decisão com data de 09.07.1999, a indeferir o incidente, mantendo o grau de incapacidade do sinistrado.
- Por requerimento datado de 22.11.2018 o sinistrado deduziu o presente incidente de revisão da incapacidade alegando agravamento das lesões (fls. 2 do presente apenso).
- O sinistrado mantêm situação de IPATH com agravamento da incapacidade funcional residual para 57% (exame médico-legal de fls. 46 a 49).
Antes de mais cumprirá referir que, tendo o acidente ocorrido em 1994, ao caso aplica-se a Lei n.º 2127 de 03.08.1965, entretanto revogada pela Lei 100/97, de 13.09, a qual foi também revogada pela Lei n.º 98/2009 de 04.09, sendo de assinalar que conforme previsão expressa destas, as mesmas apenas são aplicáveis aos acidentes de trabalho ocorridos após a entrada em vigor das mesmas (artigo 41º da Lei 100/97 e artigos 187º, nº1 e 188º da Lei 98/2009).
Ora dispõe a Base XXII (referente à revisão das pensões) da Lei 2127, no seu n.º 2, que a revisão só pode ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão (previsão que se manteve inalterada no n.º 2 do artigo 25º da Lei 100/97, não tendo paralelo na atual Lei dos Acidentes de Trabalho aprovada pela Lei 98/2009 – artigo 70º - que deixou de prever qualquer prazo para o requerimento de revisão da incapacidade).
Estamos perante um caso de caducidade do direito a deduzir o pedido de revisão.
A caducidade é uma exceção perentória de conhecimento oficioso extintiva do direito do sinistrado à revisão da incapacidade, e apenas é impedida pela prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo, neste caso, a dedução do incidente de revisão – cfr. artigos 298º, n.º 2, 331º, n.º 1 e 333º, n.º 1, todos do Código Civil e artigo 576º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
A questão da inconstitucionalidade das normas que limitam temporalmente a possibilidade de ser requerida a revisão da incapacidade e das normas de aplicação dos referidos diplomas no tempo, tem sido largamente tratada pela jurisprudência dos nossos tribunais.
Veja-se sobre esta matéria o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 11.10.2018, que pela sua pertinência de transcreve quase por completo: «A questão da inconstitucionalidade, ou não, da norma que limita temporalmente a possibilidade de ser requerida a revisão da incapacidade, fixando o prazo de dez anos, é transversal às Leis 2127 e 100/97, assentando em idênticos fundamentos, em concreto, na invocação da violação dos princípios da igualdade e da justa reparação dos acidentes de trabalho. No essencial, sustentava-se a fixação do prazo de dez anos impedia a reparação da incapacidade nas situações de agravamento superveniente ocorridas após o termo do mesmo, quando em contraponto permitia a revisão da incapacidade dentro desse prazo.
Com a inovação da Lei 98/2009, ou seja, o desaparecimento do prazo para pedir revisão da incapacidade, surgiu uma nova questão, qual seja, a invocação da sua aplicação retroativa, permitindo a revisão da incapacidade sem dependência de prazo em processos emergentes de acidentes ocorridos antes da sua vigência, pese embora esta preveja expressamente a sua aplicação apenas a acidentes ocorridos após a sua entrada em vigor. Por um lado, argumenta-se com a violação do princípio da igualdade, em razão dos sinistrados vítimas de acidentes de trabalho abrangidos pela nova LAT não estarem sujeitos a para requerer a revisão da incapacidade; por outro, faz-se apelo ao n.º2, do art.º 12.º, do CC.
O Tribunal Constitucional tem reiterado sucessivamente o entendimento de que a fixação de um limite temporal para requerer a revisão da incapacidade, nomeadamente, o prazo de dez anos, não viola a Constituição. Afirma-se que o princípio constitucional da justa reparação dos acidentes de trabalho, consagrado no art.º 59.º n.º1, al. f), não exige que a lei ordinária consagre uma possibilidade ilimitada de revisão da incapacidade e refere-se que aquele prazo é suficiente, pois o seu decurso sem alteração da incapacidade permite estabelecer uma presunção de consolidação e de estabilização das lesões.
Houve arestos a declarar a inconstitucionalidade, mas sem que tal signifique divergência no entendimento. As situações é que eram diferentes, melhor precisando, no decurso dos dez anos ocorreram revisões intercalares da incapacidade, em consequência devendo considerar-se elidida a presunção de consolidação e estabilização da situação clínica.
(…) Sobre esta questão e, realça-se, no mesmo sentido, pronunciou-se também o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 136/2014 [DIÁRIO DA REPUBLICA - 2.ª SERIE, Nº 54, de 18.03.2014], no qual foi reiterado o entendimento de “não julgar inconstitucional o n.º 2 da base XXII da Lei n.º 2127, de 3 de agosto de 1965, na parte em que estatui que a revisão só poderá ser requerida dentro dos 10 anos posteriores à data da fixação da pensão (na interpretação seguida pelo Tribunal Constitucional)”. No que ao ponto interessa, lê-se na fundamentação, para além do mais, o seguinte: -«(…) c) O princípio da igualdade na sucessão de leis no tempo 10 - Esta opção de diferenciação do regime legal aplicável na revisão da pensão por acidentes de trabalho consoante estes tenham ocorrido antes ou depois de 1 de janeiro de 2010 poderia colocar a questão de constitucionalidade atinente à aplicação do princípio da igualdade na sucessão de regimes jurídicos. Na apreciação dessa questão, o Tribunal Constitucional tem reiterado o entendimento de que o princípio da igualdade não opera diacronicamente, pelo que não será em regra aplicável a fenómenos de sucessão de leis no tempo (vide entre outros, os Acórdãos n.os 43/88, 309/93, 99/2004, 188/2009, 3/2010, 260/2010 e 398/2011, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt, tal como os restantes Acórdãos do Tribunal Constitucional citados de ora em diante; vide ainda, a Decisão Sumária n.º 265/2013, disponível no mesmo sítio, que não julgou inconstitucional o n.º 2 da Base XXII da Lei 2127, de 3 de agosto de 1965, na interpretação de que o direito à revisão da pensão com fundamento em agravamento das lesões caduca se tiverem passado dez anos, contados da última revisão, não obstante o disposto na Lei 98/2009).
11 - Afirmar que o princípio da igualdade não opera diacronicamente, significa que a mera sucessão de leis no tempo não afeta, só por si, aquele princípio. Com efeito, "apesar de uma...
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