Acórdão nº 140/06 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Fevereiro de 2006

Data21 Fevereiro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO 140/2006

Processo nº 601/2005

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 1 de Junho de 2005, que indeferiu a reclamação apresentada nos termos do art. 405º do Código de Processo Penal, pelo mesmo recorrente, contra o despacho do Desembargador Relator, no Tribunal da Relação de Coimbra (RC), que não lhe admitiu o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de acórdão proferido pelo mesmo Tribunal da Relação.

2 – Neste acórdão, a RC decidiu rejeitar o recurso interposto pelo ora recorrente de decisão do tribunal de 1ª instância que o condenara, em cúmulo jurídico, na pena única de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por quatro anos, sob condição de pagamento no mesmo prazo da indemnização arbitrada ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, pela prática de um crime continuado de abuso de confiança contra a segurança sócia, p. e p. pelo art. 107º do Regime Geral das Infracções Tributárias, e de um crime continuado de fraude contra a segurança social, p. e p. pelos art. 103º e 106º, do mesmo Regime, bem como no pagamento da indemnização ao referido ofendido de 145.850,10 Euros, acrescida dos juros legais à taxa que, em cada momento, for devida, por haver considerado que o recorrente não dera adequado cumprimento ao ónus de apresentação de conclusões da motivação feita naquele recurso, não obstante haver sido convidado a “apresentar nova motivação do recurso, suprindo a prolixidade das conclusões que formulara”, pois que tendo-o feito apresentou novamente 214 conclusões.

3 – Desta decisão, o ora recorrente interpôs recurso para o STJ sustentando, entre o mais, que ao caso não interessa, que o acórdão da RC havia efectuado uma interpretação extensiva das disposições conjugadas dos art. 414º, n.º 2, e 420º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), porquanto a “falta de concisão das conclusões não se revela contemplada na letra do art. 414º, n.º 2”, e que essa interpretação extensiva violava o disposto nos art. 18º, n.º 2, e 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

O recurso não foi, todavia, admitido por despacho do Desembargador Relator, com base na fundamentação de que “atendendo à moldura penal objecto correspondente do tipo legal de crimes, tal recurso não é admissível, face ao disposto no art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP”.

4 – Reclamou, então, o recorrente para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do art. 405º do CPP, sustentando, entre o mais, que a decisão da RC, que rejeitou o recurso por prolixidade não pode ser tida como decisão de mérito, mas, antes, como uma decisão que põe termo à causa sem conhecer do mérito da mesma, e que a norma constante do art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP, quando interpretada no sentido da não admissibilidade do recurso para o STJ, nos casos em que o Tribunal de recurso decide não conhecer do mérito do recurso, interposto pelo arguido da decisão condenatória de 1ª instância, que não por manifesta improcedência ou casos previstos nas alíneas do n.º 2 do art. 412º do CPP, rejeitando tal recurso por falta de concisão das conclusões, viola o n.º 1 do art. 32º da CRP, na sua dimensão de garantia a um duplo grau de jurisdição.

5 – A reclamação foi indeferida com base nas seguintes considerações:

“No caso em apreço, está em causa um acórdão da Relação que rejeitou o recurso interposto pelo arguido da decisão final.

Daí, o referido acórdão, ao não conhecer do fundo do recurso, não alterou a decisão da 1ª instância que, em processo respeitante a um concurso de infracções, condenara o arguido pela prática de um crime continuado de abuso de confiança contra a segurança social, p. e p. pelo art. 107º, com referência ao art. 105º, n.º 1, do RGIT, na pena de um ano e seis meses de prisão, e de um crime continuado de fraude contra a segurança social, p. e p. pelo art. 106º, com referência ao art. 103º, do RGIT, na pena de oito meses de prisão. Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 4 anos sob condição de pagamento, em igual período, da indemnização arbitrada ao IGFSS, no montante de € 145.850,10, acrescida de juros legais.

Assim sendo, estando em causa um acórdão da Relação proferido em processo respeitante a um concurso de infracções, face ao disposto no art. 400º, n.º 1, alínea e), 2ª parte do CPP, há apenas de ter "em conta a pena aplicável a cada um dos crimes", como nos refere Germano Marques da Silva, in "Curso de Processo Penal", III, 2ª edição, pág. 325, e os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Janeiro de 2003, de 13 de Fevereiro de 2003, de 16 de Abril de 2003 e de 22 de Maio de 2003 in CJ, Acs. do Supremo Tribunal de Justiça, Ano XXVIII, Tomo I, págs. 162 e ss. e 186 e ss., Tomo II, p. 163 e 88 e 190 e ss., respectivamente.

Ora, a nenhum dos crimes abrangido pelo concurso corresponde pena superior a cinco anos.

Quanto à invocada inconstitucionalidade pelo ora reclamante, cabe dizer que após a revisão levada a efeito pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, na sequência da jurisprudência do Tribunal Constitucional, o direito ao recurso foi expressamente referenciado como uma garantia de defesa do processo criminal, no n.º 1 do art. 32º da CRP.

Todavia, como o T. C. também tem sustentado, a Constituição não impõe que tenha de haver recurso de todos os actos do juiz, como também não exige que se garanta um triplo grau de jurisdição (cf., por todos, os Acórdãos do T.C. de 19-06-90, BMJ, 398, p.152, e de 19-11-96, DR, II Série, de 14-03-97).

No caso dos autos, encontrava-se legalmente assegurado o duplo grau de jurisdição, como resulta do art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP. Se a Relação não conheceu do recurso interposto da decisão final, tal ficou-se a dever ao arguido, por não ter sintetizado capazmente (de 237 para 214) as suas conclusões, após convite para o efeito”.

6 – Inconformado com o decidido, o reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, afirmando pretender “ver apreciada a questão de constitucionalidade da norma constante da aliena e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP, ratio decidendi da decisão recorrida, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o STJ nos casos em que o Tribunal da Relação profere decisão de rejeição do recurso interposto pelo arguido da decisão da 1ª instância, não apreciando o mérito do recurso que lhe foi submetido à apreciação, por falta de concisão das conclusões”.

7 – Alegando neste recurso, o recorrente concluiu o seu discurso do seguinte jeito:

“A. O ora recorrente interpôs recurso para o STJ do Acórdão proferido pela Relação de Coimbra, na parte em que este rejeitou o recurso interposto da decisão final de primeira instância, por falta de concisão de conclusões.

B. Fê-lo por considerar que o fundamento apresentado pela Relação de Coimbra para a rejeição não só não se verificava, como não se encontra previsto na lei processual penal tal fundamento de rejeição, e ainda porque o juízo de subjectividade daquele Tribunal impediu a apreciação do mérito de um recurso penal, que é um direito fundamental da defesa, impedindo o constitucionalmente e internacionalmente consagrado duplo grau de jurisdição.

C. O Tribunal de Relação de Coimbra não admite o recurso, invocando para o efeito o disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP.

D. Perante tal decisão impunha-se reclamar para o presidente do Tribunal recorrido, o que se fez.

E. Aduziu-se a fundamentação, mormente de cariz constitucional, por se considerar que o arguido viu precludido o seu direito constitucionalmente consagrado de recorrer, plasmado no n.º 1 do artigo 32º da CRP.

P. Com efeito, impõe-se ver apreciada a questão da constitucionalidade da norma constante da alínea e) do n.º 1 art. 400º do Código Processo Penal, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça nos...

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