Acórdão nº 2679/06-1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Março de 2007

Data06 Março 2007

Acordam, em audiência, os Juizes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório: A. …, devidamente identificado nos autos, impugnou judicialmente a decisão do Governo Civil de …., proferida em 16 de Janeiro de 2006, que lhe impôs a sanção acessória de inibição de conduzir, pelo período de 120 dias, pela prática da contra-ordenação prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Regulamentar n.º 22-A/98, de 1 de Outubro, alterado pelo Decreto-Regulamentar n.º 41/2002, de 20 de Agosto, sancionável nos termos dos artigos 76.º, alínea a), do mesmo diploma e 138.º e 146.º, alínea l), do Código da Estrada.

Por despacho 15 de Setembro de 2006 (cfr. fls. 35/39), o 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de … julgou o recurso de impugnação totalmente improcedente e, em consequência, manteve, nos seus precisos termos, a decisão administrativa recorrida.

*Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: «1.ª - O despacho recorrido enferma de violação da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente do seu artigo 204.º, ao basear tal despacho numa norma inconstitucional; 2.ª - O artigo 141.º do Código da Estrada, foi introduzido pelo Decreto-Lei 44/2005, de 23 de Fevereiro, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro; 3.ª - Salvo melhor interpretação, não existe na Lei de autorização legislativa qualquer referência que permita ao Governo afastar a aplicação da suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir às contra-ordenações muito graves; 4.ª - Esta é uma matéria que faz parte da competência relativa da Assembleia da República, em matéria legislativa, pelo que só se pode concluir pela inconstitucionalidade orgânica da norma; 5.ª - Deveria, assim, o Tribunal a quo ter-se abstido de aplicar tal diferenciação entre contra-ordenações graves e muito graves, e deferido a pretensão do Recorrente, decidindo-se pela suspensão da pena acessória da inibição de conduzir, por preencher os requisitos legais para tanto, decretando qual a condição, singular ou cumulativa, de que fazia depender tal suspensão».

A final, manifesta-se o recorrente no sentido da procedência do recurso, em tais termos que, por força da revogação do despacho recorrido, seja ordenada a baixa dos autos ao Tribunal a quo, para que neste seja determinado qual o período temporal, e qual ou quais as condições, de que vai depender a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir que àquele foi imposta.

*O Magistrado do Ministério Público concluiu a resposta que apresentou à motivação do recurso, aduzindo não se verificar «o apontado vício de inconstitucionalidade orgânica, relativamente à não previsão da suspensão da sanção de inibição de conduzir, por não integrar essa não previsão matéria reservada ao Parlamento».

*Nesta Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto, louvando-se na resposta do M.º Público em 1.ª Instância, emitiu douto parecer no sentido da total improcedência do recurso.

*Cumprido o disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal, o recorrente não apresentou resposta.

*Efectuado o exame preliminar, colhidos os vistos legais e realizada a audiência de julgamento, cumpre agora apreciar e decidir.

***II.

Fundamentação: 1. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso: A interposição e regime de recurso, para o Tribunal de Relação, de decisões proferidas em 1.ª Instância, em processo de contra-ordenação, deve observar as regras específicas referidas nos arts. 73.º a 75.º do DL 433/82, de 27-10, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 244/95, de 14-09 e pela Lei n.º 109/2001, de 24-12 (Regime Jurídico das Contra-Ordenações), seguindo, em tudo o mais, a tramitação do recurso em processo penal (art. 74.º, n.º 4), em função do princípio da subsidiariedade genericamente enunciada no art. 41.º, n.º 1 do citado diploma.

Em recursos interpostos de decisões do Tribunal de 1.ª Instância, no âmbito de processos de contra-ordenação, o Tribunal da Relação apenas conhece, em regra, da matéria de direito, sem prejuízo de poder "alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação temática aos termos e ao sentido da decisão recorrida", "anulá-la e devolver o processo ao tribunal recorrido" (cfr. art. 75.º, n.ºs 1 e 2, ainda do mesmo corpo normativo).

Por outro lado, conforme jurisprudência constante e pacífica, são as conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação que delimitam o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso.

No caso dos autos, a única questão que está submetida à apreciação do Tribunal da Relação consiste em saber se o artigo 141.º do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, padece de inconstitucionalidade orgânica, ao estabelecer, no âmbito da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir, uma diferenciação de tratamento entre as contra-ordenações graves e as contra-ordenações muito graves que extrapola a competência legislativa que ao Governo foi atribuída pela Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro.

*2. No despacho recorrido, foram dados como provados os seguintes factos: 1. No dia 27/08/2005, pelas 11h00m, no local …, o recorrente, quando conduzia o veículo ligeiro de passageiros, com matrícula …, desrespeitou a obrigação de parar imposta pela luz vermelha de regulação de trânsito (semáforo).

  1. Ao assim actuar, procedeu o recorrente sem o cuidado que podia, devia, estava obrigado e era capaz.

  2. Em consequência do facto referido em 1), a Direcção Geral de Viação do Distrito de ..

    (é patente o lapso quanto à entidade decisória) aplicou ao recorrente a sanção acessória de inibição de conduzir, pelo período de 120 dias.

  3. Do Registo Individual de Condutor do recorrente consta averbada a prática de uma contra-ordenação grave, em 17/01/2003, que determinou a aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias, suspensa pelo período de 180 dias.

    *3.

    O tribunal a quo procedeu à subsunção legal da materialidade fáctica supra exposta do seguinte modo: «1. Ao recorrente encontra-se imputada a prática da contra-ordenação prevista e punida no artigo 69.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Regulamentar n.º 22-A/98, de 1 de Outubro, alterado pelo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT