Acórdão nº 07B585 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ROCHA
Data da Resolução15 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA e esposa BB intentaram acção declarativa de condenação contra CC, pedindo que a ré seja condenada a colocar fora de serviço uma máquina que produz um som semelhante a tiros de caçadeira, que tem em funcionamento na sua propriedade, com o intuito de afugentar pássaros e que lhes perturba o direito ao sossego e ao repouso e, ainda, a pagar-lhes a quantia de 4.000.000$00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

A ré contestou, impugnando os danos alegados pelos AA. e acrescentando que a sua vinha já se encontrava em exploração no seu terreno quando os autores adquiriram o seu prédio e que, a ter de remover a máquina em questão, perderá grande parte da exploração de uva, o que poderá levar à perda de toda a vinha que lhe proporciona o sustento. Assim, e em face de tal dano, para além de concluir pela improcedência da acção, deduziu reconvenção, peticionando, para o caso de ter de parar o funcionamento da máquina, o pagamento de indemnização pelos danos resultantes da perda de toda a vinha, a liquidar em execução de sentença.

Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, após o que foi proferida sentença que julgou improcedentes a acção e a reconvenção.

Inconformados, autores e ré recorreram para o Tribunal da Relação de Évora, que, por acórdão de 21.9.2006, manteve a decisão.

Ainda irresignados, os autores pedem revista, concluindo a alegação do recurso pela seguinte forma: O objecto do litígio consubstancia-se em dois pedidos concretos: a condenação da ré a colocar fora de serviço uma máquina e a condenação da mesma ré a pagar-lhes a quantia de 4.000.000$00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; Estando confirmados pelo tribunal "a quo" os pressupostos da obrigação de indemnizar, tinha o tribunal de apreciar o pedido de condenação em concreto; Nem a existência de uma colisão de direitos justifica que esse pedido não tenha sido apreciado, pois não é pelo facto de esta se verificar que deixa de existir obrigação de indemnizar; Ao subscrever o mesmo entendimento do tribunal de 1ª instância, o acórdão agora colocado sob censura violou, claramente, o disposto na lei substantiva, nomeadamente o citado n°1 do art. 483°, do Cód. Civil; Outra questão a apreciar é a que se prende com a existência de dois direitos totalmente distintos, cujo exercício de ambos poderiam colidir entre si, ou seja, por um lado, os direitos dos autores, nomeadamente ao repouso, ao descanso, à saúde e ao bem estar, a um ambiente de vida humano sadio e ecologicamente equilibrado, à tranquilidade da vida familiar e à qualidade de vida, direitos esses que integram os denominados direitos de personalidade e, por outro lado, o direito da ré, traduzido no direito ao trabalho; Tanto os direitos dos autores, como o direito da ré, gozam ambos da tutela constitucional; É por demais evidente, perante todo esse circunstancialismo fáctico, que a tal ofensa dos direitos de personalidade titulados pelos autores, para além de ser uma ofensa real e verdadeira, é muito grave, e quiçá de difícil reparação, pois é manifestamente insuportável de aguentar durante tantos anos a fio uma situação desta natureza ou com cariz semelhante; Daí que todos aqueles direitos que os autores invocam e reclamam sejam protegidos - direitos de personalidade - devam merecer uma maior tutela e protecção, em detrimento do direito invocado pela ré; O Tribunal da Relação, ao confirmar a decisão tomada em lª instância, violou o nºl do art. 70° do Cód. Civil, em consonância com o n°2 do art. 335° do mesmo diploma legal; De igual modo, violou também o previsto no art. 1346° do mesmo diploma legal, pois aos autores/recorrentes assiste-lhes o direito de se oporem à emissão dos ruídos provenientes do prédio propriedade da ré, nomeadamente da máquina que esta aí tem em funcionamento, uma vez que o barulho ensurdecedor que por esta é produzido causa um prejuízo substancial para o uso do imóvel propriedade daqueles, nomeadamente onde pretendem gozar e têm direito a fazê-lo, em pleno e sem qualquer espécie de limitação, os direitos de personalidade que a legislação vigente lhes atribui.

A ré não contra-alegou.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Estão assentes os seguintes factos: Os AA têm inscrito a seu favor, na Conservatória do Registo Predial de Silves, o prédio rústico sob a descrição n° 00008/191084 daquela freguesia e concelho, e inscrito na respectiva matriz sob a secção S a S2 - 0023.

    A R. tem inscrito a seu favor o prédio rústico inscrito na respectiva matriz sob o art. 0020 da secção S a S2.

    Os AA. não residem no prédio...

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