Acórdão nº 07B477 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução01 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I- AA e BB intentaram, no dia 23 de Março de 2000, contra CC SA, acção declarativa constitutiva, pedindo a declaração de transmissão para a sua titularidade do direito de propriedade sobre a fracção predial ..., piso ..., ....., lote nº ...., situada no complexo Real Forte, Sacavém, com fundamento em incumprimento pela ré - promitente vendedora - de contrato-promessa de compra e venda com ela celebrado no dia 27 de Setembro de 1999, posteriormente objecto de aditamento.

A ré, em contestação, afirmou não ter celebrado o aditamento por escrito, não ter incorrido em mora e estar disponível para celebrar a escritura de compra e venda, e pediu a condenação dos autores a indemnizá-la, com fundamento na litigância da má fé, pelas despesas feitas com a acção, incluindo os honorários dos advogados.

Os autores, na réplica, afirmaram não corresponder à verdade a alegação da ré de não ter reduzido a escrito o identificado aditamento de acordo e pediram a condenação da ré, com fundamento na litigância de má ré, a indemnizá-los das despesas que os obrigaram a realizar, incluindo os honorários dos advogados.

Realizado o julgamento, após a alegação de direito pela ré, foi proferida sentença no dia 15 de Setembro de 2005, por via da qual a ré foi condenada no pedido.

Os autores requereram, no dia 14 de Outubro de 2005, que na sentença fosse corrigido o lapso em termos de ser fixado aos autores prazo não inferior a noventa dias para depositarem 37 400 000$.

A ré, na resposta, invocou a nulidade da sentença por ter sido proferida antes da consignação em depósito e não haver lapso manifesto decorrente da não fixação do prazo.

O tribunal da 1ª instância, por despacho proferido no dia 13 de Dezembro de 2005, indeferiu, por um lado, a pretensão formulada pelos autores, sob o fundamento de do contexto da sentença não resultar que a falta de fixação do prazo seja devida a lapso do juiz e não corresponda à sua vontade real.

E, por outro, indeferiu a pretensão formulada pela ré, invocando os artigos 668º, nº 4 e 744º do Código de Processo Civil, sob o fundamento de a sentença estar em recurso e que, por isso, não era a fase processual em que foi formulado o requerimento a adequada para conhecer daquela questão.

A ré apelou da referida sentença, e a Relação, por acórdão proferido no dia 28 de Setembro de 2006, anulou-a e determinou que o tribunal da 1ª instância tomasse em consideração o disposto no artigo 830º, nº 5, do Código Civil.

Interpuseram os autores recurso de revista, formulando, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - o nº 5 do artigo 830º do Código Civil só é aplicável quando for alegada a exceptio non adimpleti contractus na parte respeitante à falta de pagamento do preço acordado, o que não ocorre no caso; - a consignação em depósito não é pressuposto de apreciação do mérito do pedido de execução específica, porque é meramente acessória deste pedido; - mesmo sendo alegada a exceptio, a consignação em depósito só pode ser ordenada na decisão final, depois de apreciada a pretensão relativa à execução específica e decidida a sua procedência; - A contagem do prazo de realização da consignação em depósito só se inicia após o trânsito em julgado da decisão de procedência da acção; - como a recorrida não deduziu a mencionada excepção, não tinham de requerer a fixação de prazo para a consignação da parte do preço em falta, pelo que, por isso, não pode improceder o seu pedido; - o tribunal não podia, oficiosamente, conceder prazo para a consignação, sob pena de afirmação de um juízo de certeza acerca da improcedência da excepção de cumprimento não invocada; - é inaplicável caso o nº 5 do artigo 830º do Código Civil, porque há dúvida sobre o montante do preço a pagar, o que não impede a sentença declarativa da procedência da execução específica; - a promitente vendedora sempre poderá obter o pagamento do que lhe é devido, seja em execução da própria sentença, seja em nova acção fundada no enriquecimento sem causa; - o acórdão recorrido aplicou erradamente o nº 5 do artigo 830º do Código Civil e, ao anular a sentença, violou os artigos 410º, nºs 1 e 3, 406º, nº 1, 407º, nº 1, 441º, 442º, nº 3, 762º, 777º, nº 1, 804º, 805º, nºs 1 e 2, alínea a), e 830º, nº 1, do Código Civil.

Respondeu a recorrida, em síntese de conclusão: - o artigo 830º, nº 5 do Código Civil, que se refere à susceptibilidade abstracta da invocação da excepção, impede o tribunal de proferir sentença substitutiva da compra e venda sem o pagamento do preço ou o seu depósito; - violaria o artigo 62º da Constituição a interpretação do artigo 830º do Código Civil no sentido de permitir ao tribunal declarar a execução específica sem o pagamento ou consignado em depósito do preço; - a dúvida quanto ao montante do preço é facto impeditivo da declaração da execução específica e não fundamento para que seja declarada sem acautelar o seu pagamento.

II- É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A representante da ré, por um lado, e os autores, por outro, declararam por escrito, no dia 27 de Setembro de 1999: - a primeira prometer vender e os últimos prometer comprar, livre de ónus e encargos, por 38 000 000$, a fracção autónoma B, correspondente ao piso .., .... do lote ..., com três boxes na cave com os nºs -, 23 e 24, da urbanização ...., sita em Sacavém, no lugar da antiga Fábrica......, freguesia de Sacavém, concelho de Loures, descrita na 2ª Conservatória do Registo Predial de Loures sob o nº ....., omissa na matriz, com apresentação do modelo 129 para a sua inscrição em 14 de Agosto de 1998; - serem 6 000 000$ logo pagos a título de sinal e princípio de pagamento e o restante no acto da escritura pública de compra e venda a realizar no prazo máximo de 90 dias, no local, dia e hora a fixar pela primeira, por carta registada com aviso de recepção expedida com a antecedência mínima de quinze dias, logo que tenha em ordem todos os registos relativos à constituição da propriedade horizontal e licenças camarárias legalmente exigíveis; - dever o prédio em que se integra a fracção ser constituído no regime de propriedade horizontal, cabendo à primeira a elaboração do respectivo regulamento do condomínio e aos últimos autorizar a primeira a alterar o estatuto da propriedade horizontal que vier a ser constituído para o prédio, comprometendo-se a outorgar a favor dela, ou de quem ela indicar, o necessário instrumento público, a ser outorgado no acto da escritura pública de compra e venda; - exigibilidade da execução específica do contrato por qualquer dos contraentes, nos termos do artigo 830º do Código Civil.

  1. No dia 29 de Dezembro de 1999, DD, que assina habitualmente como procuradora da ré, e os autores, declararam, por escrito, em aditamento ao instrumento documental mencionado sob 1: - ser o preço da fracção predial de 36 000 000$, terem os últimos entregue a título de sinal e princípio de pagamento à primeira a quantia de 600 000$, dever a quantia de 35 400 000$ ser paga no acto da escritura de compra e venda, a realizar até ao dia 15 de Janeiro de 2000, no local, dia e hora a fixar por ela, por carta registada com aviso de recepção expedida com a antecedência mínima de quinze dias; - obrigar-se a primeira a realizar na box nº 24 as obras de reparação e conservação necessárias a evitar infiltrações, alagamentos ou inundações e a substituir o portão basculante nela colocado por outro igual e novo até à data da escritura de compra e venda.

  2. O documento mencionado sob 2 não contém a parte do acordo referente à box e que justificou a redução do preço da fracção em 2 000 000$.

  3. As boxes nºs. -, 23 e 24 estão identificadas nos desenhos em anexo ao documento mencionado sob 1, do qual fazem parte, e a autorização dos autores à ré para alterar o estatuto da propriedade horizontal, salvaguardando o respeito pela área e composição da fracção predial prometida vender.

  4. Depois de assinado o documento mencionado sob 1, a ré informou os autores de que a box nºs - estava a ser utilizada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
5 sentencias
  • Acórdão nº 2018/19.0T8AVR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-02-27
    • Portugal
    • Tribunal da Relação do Porto
    • 27 February 2023
    ...nº 2641/06.3TBVNG.P1.S1), de 14.09.2010 (processo nº 1449/08.6TBVCT.G1.S1), de 03.02.2009 (processo nº 08A3949) e de 01.03.2007 (processo nº 07B477), acessíveis em [9] Sobre a inadmissibilidade, por via de regra, de sentenças condicionais, vide, inter alia, na doutrina, ISABEL ALEXANDRE, in......
  • Acórdão nº 5278/21.3T8ALM.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-01-11
    • Portugal
    • Tribunal da Relação de Lisboa
    • 11 January 2024
    ...sentido: o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11-02-2004, Pº 109/04-1, rel. VIEIRA E CUNHA; o Acórdão do STJ de 01-03-2007, Pº 07B477, rel. SALVADOR DA COSTA; o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17-12-2008, Pº 731/07.4TBALB.C1, rel. ARTUR DIAS; e o Acórdão do Tribunal......
  • Acórdão nº 2365/08.7 TBABF.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Janeiro de 2015
    • Portugal
    • 15 January 2015
    ...definitivo esse que terá se ser aferido pelas regras do art. 808° do mesmo diploma. Conforme se refere no ac. do STJ de 01.03.2007 (proc° n° 07B477, em que é relator Salvador da Costa, in www.dgsi.pt) , sendo de aplicar, a par do regime legal específico do contrato-promessa, em tanto quanto......
  • Acórdão nº 731/07.4TBALB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2008
    • Portugal
    • 17 December 2008
    ...de 2/12/92, in BMJ, nº 422, pág. 335. [6] Acs. STJ de 16/01/2003 (Proc. 02B4023, relatado pelo Cons. Joaquim de Matos) e de 01/03/2007 (Proc. 07B477, relatado pelo Cons. Salvador da Costa), in www.dgsi.pt/jstj. No texto deste último Acórdão afirma-se: “Não resulta da letra nem do escopo fin......
  • Peça sua avaliação para resultados completos

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT