Acórdão nº 06A3914 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução05 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "Empresa-A", intentou acção, com processo ordinário, contra AA, pedindo a sua condenação a ver perdidos para a Autora a quantia de 34 400 000$00 entregue a titulo de sinal ou, subsidiariamente, a modificação do preço de venda, de 38 000 000$00 para 42 943 000$00.

O Réu contestou e deduziu pedido reconvencional de reconhecimento do seu crédito de 7 371 000$00, a execução especifica do contrato prometido e a substituição de materiais usados nos acabamentos da fracção ou, subsidiariamente, a condenação da autora a pagar-lhe a diferença de custo desses materiais.

Posteriormente, a Autora ampliou o pedido para condenação do Réu a pagar-lhe 69000,00 euros pela ocupação da fracção, 1500,00 euros mensais a esse título e 7156,36 euros de despesas de condomínio, seguros e contribuições.

No Tribunal de Circulo de Cascais o Réu foi absolvido do pedido e declarada a execução específica do contrato promessa. A Autora foi absolvida dos demais pedidos reconvencionais.

Apelaram a Autora e o Réu.

A Relação de Lisboa confirmou a sentença recorrida.

Pedem agora revista.

Conclui a Autora: - Face à prova produzida o Réu demonstrou e expressou inequivocamente a vontade de não celebrar o contrato prometido se não ocorressem determinados eventos como a diminuição do preço e a reparação de deficiências da fracção; - Não ocorreu qualquer impossibilidade temporária de cumprimento pelo Réu; - Houve, sim, recusa, o que tornou desnecessária a interpelação e a fixação de outro prazo; - A tradição só se operava com o pagamento da última prestação a coincidir com a escritura; - Só que, independentemente de não ter ocorrido a escritura prometida, o Réu apropriou-se da dita fracção, com a por si operada mudança de fechadura da fracção ocorrida em Março de 2001, à revelia e com a oposição da autora recorrente; - Passando a partir do dito dia 31 de Março de 2001 a A. a estar impedida do seu normal e legitimo acesso à fracção dos autos; - Passou o recorrido a comportar-se, a actuar e a agir como se proprietário da fracção fosse, independentemente de não ter titulo ou qualquer razão contratual para o fazer, dela usufruindo, titulando em seu nome, com base no contrato promessa celebrado, os contratos de água e luz, e nela recebendo amigos, correspondência e dormindo, em suma, na mesma tendo instalada a sua residência habitual, o que resulta do articulado de ampliação o pedido e da contestação ao mesmo.

- Não se pode aceitar a pretensa licitude do comportamento com a dita mudança de fechadura, no pressuposto que tal actuação que visou garantir a disponibilidade que lhe havia sido autorizada, devendo ao invés considerar-se na disponibilidade da recorrente vedar o acesso do recorrido à fracção, designadamente considerando-se a demais factualidade.

- Por outro lado, é agora manifesto que, ao contrário do referido pelo recorrido, a mudança das fechaduras, não teve como desiderato possibilitar que o mesmo levasse a cabo trabalhos que entendia serem da responsabilidade da Apelante - cf. artigos 55º a 59º da sua contestação - tese que como vimos foi acolhida aquando da decisão pelo tribunal, mas em perfeita contradição com a responsabilidade da realização das obras, que eram dele Recorrido e às quais era a Recorrente estranha.

- Nada justificava a acção directa, para a mudança de fechadura, nem o recorrido em momento algum a alegou, sendo a mudança de fechadura e a subsequente ocupação do imóvel consubstanciando manifestamente comportamentos ilícitos de que emerge a responsabilidade civil.

- Não questionou o recorrido o valor dos pedidos efectuados em sede de ampliação, não tendo impugnado a quantificação e especificação dos mesmos, se escusando ao pagamento face ao que entendia ser da responsabilidade da apelante face ao por si invocado (pretenso) incumprimento contratual desta.

- Não pode o recorrido deixar de ser condenado a pagar à recorrente todas as despesas concretizadas, descriminadas e avaliadas aquando da ampliação do pedido, para a qual se remete na integra, que sempre até hoje foram suportados por esta, desde Março de 2001 a Janeiro de 2005, as quais se cifraram em 7.150,36 euros, acrescidas do valor de 69.000 euros reclamada aquando da ampliação do pedido, a título de ocupação, face à utilidade económica da mesma, a que há a acrescer a quantia mensal de 1500 euros, a computar até à entrega efectiva da fracção à ora recorrente livre de pessoas e bens ou ao trânsito em julgado da decisão.

- A decisão recorrida violou os artigos 804º e 483º do Código Civil.

O réu recorrente concluiu as suas alegações: - É absolutamente incongruente a resposta dada ao nº 69 da Base Instrutória com a natureza das deficiências julgadas provadas nos pontos 4º, 5º, 7º a 10º, 16º, 24º, 29º a 31º, 53º a 55º.

- São deficiências que não se reportam, nem podiam ter origem na alteração à lista de acabamentos proposta pelo réu e aceite pela autora; - Como pode uma alteração à lista de acabamentos de uma fracção autónoma em construção gerar manchas de humidade no tecto junto à janela, manchas de humidade no chão e paredes do hall de entrada, manchas de humidade na parede da sala, rodapé e aduelas das portas inchados e torcidos, manchas de humidade na soleira da porta da varanda, deficiências na colocação e isolamento de janelas...

- Danos como os que acabam de se referir só podem ser provocados por deficiências na estrutura do prédio e não por simples alterações à lista de acabamentos.

- Dada a natureza dos danos, a resposta dada pelo tribunal ao ponto nº69 da BI, onde se pode ler "As deficiências aqui dadas como provadas ocorreram ou foram provocadas pela realização de obras onde ocorreram as alterações referidas em U) e discriminadas na carta mencionada em V)", não poderia deixar de ser diferente.

- Alterações de pavimentação, revestimento, alterações das portas e janelas e pintura das mesmas, alterações na instalação eléctrica geral (cf. alínea V) da matéria assente) não são - mesmo em abstracto - aptas a provocar infiltrações, humidades...

- A decisão assumida pelo tribunal de 1ª instância e confirmada pelo tribunal da Relação é incoerente. Os padrões de normalidade e de lógica que estão subjacentes ao princípio da verdade material - que há-de sempre nortear qualquer decisão sobre a matéria de facto - imporiam decisão oposta.

- Se danos houve que, em tese, poderiam ser provocados pelas alterações à lista de acabamentos levadas a cabo por iniciativa do Réu, aqui recorrente, outros houve que só podem ter tido origem em defeitos estruturais de que a obra sempre padeceria independentemente das referidas alterações.

- O princípio da livre apreciação das provas e da imediação (no que respeita ao juiz de julgamento) hão-de ter sempre como limite o princípio da busca da verdade material. Se a decisão revela a incongruência que acaba de ser apontada, este último há-de necessariamente prevalecer.

- Assim, e nos termos e para os efeitos do artigo 729º do CPC, deve ser ordenada a alteração da matéria de facto de modo a tornar coerentes as premissas de que o tribunal partiu para firmar a sua convicção com a própria decisão agora confirmada pelo tribunal da Relação, alterando-se o que vem mencionado na decisão sobre a matéria de facto quanto ao ponto nº 69 da BI.

- Tendo em consideração a factualidade que efectivamente resultou demonstrada da audiência de discussão e julgamento e que, resolvida a incoerência acima mencionada, o tribunal há-de reconhecer, conclui-se claramente que o acórdão deveria ter declarado, em primeiro lugar, a existência de um contrato de empreitada uno celebrado entre a ora recorrida e o empreiteiro por esta contratado.

- As obras levadas a cabo a pedido do ora recorrente não foram mais do que as alterações que qualquer pessoa que compra um apartamento em construção pode implementar se, para tanto, obtiver o acordo do construtor.

- Tais alterações não operam modificações ao nível dos sujeitos contratuais da empreitada.

- A não comparência do réu/reconvinte à escritura de compra e venda nas datas designadas pela autora/reconvinda foi claramente motivada pelos relevantes defeitos que a obra tinha e que impediam que o...

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