Acórdão nº 6584/06.2TBVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução04 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista nº 6584/06.2TBVNG.P1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO “AA Ld.ª”, com sede na Rua ..., …, ..., ..., intentou a presente acção declarativa com processo comum ordinário demandando BB, residente na Rua ..., ...º, Lisboa, CC e mulher DD, residentes na Rua Dr. ..., ......., Braga, EE, residente na Rua Dr. ..., ...-2º …, Porto, FF e mulher GG, residentes na Rua ..., …, …, ..., Maia, HH, residente na Praceta ..., …, 8º, Habitação …, Porto, II e mulher JJ, residentes na Rua ..., …, r/c frente, Vila do Conde, KK, residente na Rua Dr. ..., ...-2º …, Porto, e LL, residente em ..., Lugar ..., Penafiel, pedindo que fosse decretada a resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a autora e os réus, referido no articulado inicial, e condenados os mesmos a indemnizarem-na na quantia de 310.000,00€, correspondente ao dobro das quantias por eles recebidas, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento daquele montante Para o efeito, alega, em síntese, ter celebrado com os réus um contrato-promessa de compra e venda referente ao terreno identificado no art. 1.º da petição inicial, por força do qual prometeram vender-lhe esse terreno pelo preço de 240.000,00€, tendo-lhes a autora entregue a título de sinal e reforços do mesmo a quantia total de 155.000,00€, sendo que o contrato definitivo não chegou a concretizar-se por os réus não lograrem demonstrar junto das autoridades competentes serem titulares do terreno, pois que o mesmo se integrava no domínio público marítimo, o que era do conhecimento dos réus mas que não lhe revelaram antes da celebração do aludido contrato-promessa, razões bastantes a justificar a resolução desse contrato.

Citados, os réus contestaram arguindo a ilegitimidade passiva das rés DD, GG e JJ, por não terem intervindo no aludido contrato-promessa, e impugnaram grande parte da alegação inicial, aduzindo nomeadamente serem donos do mencionado terreno, beneficiando até de presunção registral, que não se integra no domínio público marítimo, sendo que o contrato definitivo só não foi concretizado por a autora se ter recusado a tal, sendo do conhecimento da mesma a existência de condicionantes quanto à potencialidade construtiva do dito terreno, por se inserir em zona de risco, em face de se encontrar abrangido no “Plano de Ordenamento da Orla Costeira”.

Acrescentam que sempre cumpriram as suas obrigações, a autora sempre soube as condições em que se encontrava o imóvel mantendo o propósito de contratar, mas recusa-se a realizar o contrato e pagar o remanescente em dívida tudo isso apontando para um comportamento da sua parte a equivaler a incumprimento do mencionado contrato-promessa, autorizando seja o mesmo resolvido por facto imputável àquela ou, a apurar-se uma situação de simples mora, impondo-se a sua execução específica.

Formularam reconvenção nos termos seguintes: 1. a título principal: a) declaração da resolução do aludido contrato-promessa, por incumprimento culposo imputável à autora; b) condenação da autora a ver reconhecida e declarada perdida a favor dos réus a quantia de 155.000,00€ que lhes foi entregue a título de sinal, princípio de pagamento e seus reforços, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; 2. a título subsidiário: a) condenação da autora a ver decretada sentença que produza os efeitos da sua declaração negocial em falta, relativa ao objecto do contrato-promessa de compra e venda celebrado, operando-se a transmissão para a mesma, por compra e venda, do identificado prédio rústico, mediante o pagamento aos réus do preço remanescente devido, no valor de 85.000,00€; b) condenação da autora a pagar aos réus a quantia de 2.833,33€, a título de juros de mora vencidos sobre aquela quantia de 85.000,00€, bem assim dos vincendos até integral e efectivo pagamento desse preço.

A autora replicou, rejeitando a procedência da matéria de excepção deduzida pelos réus, bem assim tudo o mais a sustentar a reconvenção.

Admitida a reconvenção e proferido despacho saneador, no qual se decidiu pela ilegitimidade passiva das rés DD, GG e JJ com a sua consequente absolvição da instância, condensou-se a matéria de facto, causa de reclamação dos réus parcialmente atendida.

Da decisão de absolvição das rés agravou a autora, recurso admitido com subida diferida Realizada a audiência de discussão e julgamento, e fixada a matéria de facto (fls. 498/502), sem reclamações, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, e a reconvenção parcialmente procedente, nessa medida decidindo: “Declarar a resolução do contrato-promessa de compra e venda versado nos autos, por incumprimento assente em facto culposo imputável à Autora/Reconvinda e, consequentemente, condenar a Autora/Reconvinda a reconhecer o direito dos Réus/Reconvintes a fazerem sua a quantia de 155.000,00€ entregue a título de sinal, princípio e reforço de pagamento; Absolver a Autora/Reconvinda do pedido de condenação em juros à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento”.

Inconformada, apelou a autora, mas sem êxito. No seu acórdão de 5/07/12, a Relação do Porto, por unanimidade, negou provimento ao agravo e julgou improcedente a apelação, nessa medida confirmando as decisões recorridas.

Continuando naturalmente insatisfeita, arguiu a nulidade do acórdão no referente à apreciação do agravo, no que foi desatendida, e interpôs revista para este Supremo Tribunal de Justiça.

Alegando, formula as seguintes conclusões: 1º - Da análise global de toda a prova produzida, pericial, documental e testemunhal supra referenciada resulta à saciedade que o terreno objecto do contrato promessa de compra e venda integra o Domínio Público Marítimo, não constituindo propriedade privada dos apelados; 2º - A distância do terreno à LMPMAVE (Linha de Máxima preia-mar de Águas Vivas Equinociais) é inferior a 50m e para sul do terreno, onde a avenida foi interrompida, existe areal, o que indica que, antes da construção da avenida, o terreno estaria integrado no areal.

  1. - A Comissão de Domínio Público Marítimo em deslocação efectuada ao local constatou que o mesmo está totalmente inserido na área do Domínio Público Marítimo; 4º - O terreno em causa situa-se na Avª …, da freguesia de … e esta não foi desafectada do Domínio Público Marítimo; 5º - O terreno em causa ocupa a margem do mar e está, assim, e até prova em contrário, em área de Domínio Público Marítimo; 6º - Apenas uma faixa de terreno situada a nascente poderá estar fora da margem, o que só poderá ser confirmado recorrendo-se a um processo de delimitação do D.P.M; 7º - Estando o terreno em causa na margem do mar e integrando esta, até prova em contrário, Domínio Público Marítimo, os recorridos não poderiam alienar o que lhes não pertencia, pelo menos até que fosse instaurada por eles a delimitação dessa propriedade com o Domínio Publico Marítimo, o que tentaram mas nunca conseguiram; 8° - Os recorridos para prometerem vender coisa alheia assumiram a obrigação de adquirirem previamente o bem que se dispuseram a vender, o que não fizeram; 9° - Presumindo-se que o terreno em causa, porque se situa na margem do mar, pertence ao Domínio Público Marítimo, não é a recorrente que terá de prová-lo incumbindo aos recorridos a prova do contrário, ou seja de que tal terreno lhes pertence, em conformidade com o disposto no art° 344° do CC; 10° - Presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para formar um facto desconhecido; 11° - Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz; 12° - Existe a favor do Domino Público Marítimo presunção de que o terreno em causa lhe pertence atenta a sua localização; 13° - Os recorridos sabiam que o terreno em causa estava inserido no Domínio Público Marítimo e não lograram nunca provar o direito de propriedade privada sobre tal terreno como lhes competia, em conformidade com o estatuído no DL 469/71, de 5 de Novembro; 14° - O facto de a recorrente não desconhecer a potencialidade exclusivamente rústica do terreno não significa que tenha de outorgar escritura de compra e venda de bem alheio, nada tendo a questão do direito de propriedade a ver com as condicionantes impostas para a construção no sobredito terreno; 15° - A factualidade inserta na resposta ao n° 10° da BI não leva nunca á aquisição por usucapião não só porque a posse não é continuada mas porque sendo o terreno pertença do Domínio Público Marítimo, não pode nunca ser adquirido por usucapião. Arts° 202°, 2 e 1.304°, do CC; 16° - O registo predial não é constitutivo de direitos mas meramente declarativo, não sendo aplicável aqui a presunção do art° 7° do C.R.P que falece ante o estatuído no DL 468/71, de 5 de Novembro, nomeadamente nos artigos 1º, 3° e 8°; 17° - Deverá ser proferida resposta afirmativa à matéria vertida nos n°s 1 e 5 da BI uma vez que o conceito "pertença" e a expressão "Os RR sabiam que o terreno não lhes pertencia", constituem vocábulo de uso corrente e domínio da generalidade de pessoas, integrando matéria de facto e do conhecimento da generalidade das pessoas, pelo que "expurgando, em absoluto, tais palavras (ou mesmo os conceitos de facto que encerram) da redacção do questionário (agora da BI) redundaria num gongorismo processual, particularmente bloqueador da eficiência e celeridade que a lei tem o cuidado de tutelar (arts° 265°, n° 1 e 266°, do CPOC). Uma posição, de todo por todo inaceitável; 18° - Mas, mesmo que assim não fosse - e é - impunha-se a baixa do processo ao Tribunal de 1ª Instância em ordem a ser incluída na B.I. a matéria referida ou seja que o terreno em causa está abrangido pela "LMPMAVE", em conformidade com o disposto no art° 729°, 3°, do CPC; 19° - Sendo válido o contrato promessa de compra e venda de bens alheios, atenta a sua natureza obrigacional, aos recorridos incumbia adquirirem previamente à escritura de compra e venda o terreno para posteriormente...

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