Acórdão nº 06P2032 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "AA" veio, ao abrigo do disposto no artigo 437º e seguintes do Código de Processo Penal, interpor recurso extraordinário com a finalidade de fixação de jurisprudência.

As razões da sua pretensão encontram-se expressas nas conclusões da sua motivação de recurso onde se refere que: I - O arguido foi condenado em prisão efectiva de 4 anos e seis meses de prisão, pelo Acórdão do STJ de 25 de Outubro de 2005, decisão que já transitou em julgado, encontrando-se a decorrer o prazo de trinta dias subsequentes para interposição do recurso de fixação de jurisprudência, por a sua contagem ter estado suspensa a aguardar decisão do Tribunal Constitucional sobre a decisão do STJ de não aceitação de recurso referente a inconstitucionalidade do Acórdão.

II - A decisão recorrida encontra-se em contradição com a contida no Acórdão de 09 de Outubro de 1997. Havendo fundamento para interposição do recurso de fixação de jurisprudência, por se verificar uma oposição entre dois Acórdãos do STJ, sobre a mesma questão de direito, no domínio da mesma legislação, e tendo havido transito em julgado de ambas as decisões em confronto.

III - Os factos pelos quais o arguido vem condenado no presente processo, ao contrário do que se decidiu no douto Acórdão, não consubstanciam um crime de furto, por não se verificarem os elementos objectivos que integram o respectivo tipo, nomeadamente não estarmos em presença do objecto essencial a prática dos factos, nem ter havido actos de subtracção que correspondam ao comportamento tipificado como furto.

IV - A jurisprudência deve ser fixada no sentido de considerar tratar-se de um crime de falsificação de documentos, por ser esse o facto cometido quando o arguido alterou os dados da conta bancária da sociedade da qual era sócio, através da manipulação de dados informáticos, mais concretamente da introdução de factos falsos na respectiva conta, contendo operações de depósito não realizadas de facto.

V - Os actos praticados pelo arguido, embora desenvolvidos para obtenção de benefícios, não afectaram a propriedade do lesado, ou pelo menos não foi através daqueles actos que ficaram provados que foi lesada a propriedade do assistente. Devendo a conduta do arguido ser enquadrada unicamente como crime de falsificação de documentos.

VI - O arguido deve ser absolvido por já ter prescrito o procedimento criminal referente ao crime de falsificação de documentos, por ter decorrido, desde a prática dos factos, um prazo superior ao prazo normal da prescrição acrescido de metade, de acordo com o disposto no art. 121.0 n.º 3 do Código Penal.

VII - A considerar-se que o arguido lesou a propriedade da assistente, foi através de factos que só passaram a estar tipificados a partir de 1995, com a criação do crime de burla informática, p.p. no art. 221 do Código Penal, e que antes não consubstanciavam nenhum tipo legal de crime. Não podendo o arguido ser condenado.

VIII - A considerar-se que o arguido tenha cometido um crime contra a propriedade, só pode ter sido um crime de abuso de confiança, pois aproveitou-se dos montantes pertencentes ao Banco (Empresa-A) e colocados a sua disposição, através do sistema informático a que tinha acesso como funcionário bancário, para concretizar as operações efectuadas nos balcões da Empresa-A, colocando-os em seu proveito numa conta que movimentava na qualidade de sócio da sociedade que era titular da conta. Apropriando-se para si de montantes colocados a sua disposição para outras utilizações. Não tendo utilizado qualquer estratagema ou artifício enganador, mas apenas colocando em seu benefício montantes que estavam a sua mercê por força das funções que desempenhava. Sendo a sua conduta integrada no art. 300 do Código Penal de 1982.

IX - Considerando que o arguido cometeu um crime de abuso de confiança devem os factos ser articulados com os que foram objecto do processo crime que corre u precisamente contra o arguido e que levaria a decisão do STJ, em Acórdão de 22 de Outubro de 2004, no processo 2824/043 por crime de falsificação de documentos e de abuso de confiança. Assim, se deve entender tratar-se de um crime continuado por terem sido cometidos vários tipos de crime, lesando o mesmo bem jurídico, com homogeneidade na actuação e nas circunstâncias, com diminuição da culpa do arguido.

X - O arguido, de acordo com a interpretação perfilhada deve ser condenado numa única pena, que, de acordo com o disposto no art. 79º n.º 1 do Código Penal corresponde a moldura penal mais elevada das várias circunstâncias concretas. Nesta conformidade, deverá ser punido com a pena de prisão de três anos, ficando a pena suspensa por forca das regras do artº 50 do Código Penal.

Pelo ExºMº Sr.Procurador Geral Adjunto foi emitido parecer no sentido de que os acórdãos supostamente em oposição não incidiram sobre a mesma questão de direito Os autos tiveram os vistos legais.

Cumpre decidir.

- Nos termos do artigo 437 do Código de Processo Penal constitui pressuposto de admissibilidade do recurso interposto, e entre outros, a existência de um julgamento contraditório sobre a mesma questão de direito. Por outras palavras dir-se-á que é condição daquela admissibilidade que uma categoria de factos análogos tenha obtido diversa qualificação jurídica em distintas decisões emitidas pelas entidades elencadas no normativo.

Nesta conformidade, e para uma correcta avaliação do quadro factual sobre o qual este Supremo Tribunal é chamado a pronunciar-se, indica-se a matéria de facto constante da decisão recorrida: 1 - O arguido, em 1 de Junho de 1986, e com início nesse mesmo dia, celebrou um contrato de trabalho por tempo indeterminado com a cooperativa Empresa-A de ... (doravante ....), com sede no Largo de...

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