Acórdão nº 02014/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelABEL ATANÁSIO
Data da Resolução17 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1- RELATÓRIO "A…", com sede na Rua …, …, Covilhã, matriculada na Conservatória do Registo Comercial da Covilhã sob o n° 743, NIPC 500416516, proprietária do Externato de Nossa Senhora dos Remédios", interpõe recurso contencioso de anulação do despacho do Ministro da Educação de 15 de Junho de 2002, que lhe aplicou a pena disciplinar prevista na alínea b) da Portaria n° 207/98, de 28 de Março, que se consubstanciou na multa graduada em 15 (quinze) salários mínimos nacionais, suspensa por 3 (três) anos, ordenando ainda a reposição de verbas recebidas indevidamente.

Apresentou os seguintes fundamentos: "Acerca da prescrição 1. Os factos que vieram a integrar a acusação no processo disciplinar, bem como as suas eventuais repercussões jurídico-disciplinares, encontravam-se suficientemente apurados no relatório elaborado em 16 de Fevereiro de 2001 pelos inspectores da Inspecção-Geral de Educação; II. Tal relatório foi de imediato levado ao conhecimento do Delegado Regional do Centro da Inspecção-Geral de Educação que o transmitiu, em 2 de Março de 2001, à Senhora Inspectora-Geral de Educação.

III. Quer em 27 de Junho de 2001 quando foi ordenada a instauração do processo disciplinar, quer em 20 de Agosto de 2001 quando o processo foi efectivamente instaurado, já haviam decorrido mais de 3 (três) meses sobre o momento em que o dirigente máximo do serviço (Inspectora-Geral da Educação) havia tomado conhecimento das eventuais faltas cometidas.

IV. Pelo que, nos termos do n° 2 do art° 4° da Lei nº 24/84 de 16 de Janeiro, o direito de instaurar o presente procedimento disciplinar havia prescrito.

SEM PRESCINDIR, A AMNISTIA V. Os factos que são imputados à entidade arguida neste processo disciplinar reportam-se a 11 de Novembro de 1998, data em que o "Externato de Nossa Senhora dos Remédios" enviou à DREC os mapas/modelos DREC/EPC n° 1/98; VI. Uma vez que os factos eventualmente integradores de infracção disciplinar, foram praticados até 25 de Março de 1999 e a sanção aplicável não é superior à de suspensão, tais infracções encontram-se amnistiadas ao abrigo da alínea c) do artigo 7° da Lei n° 29/99, de 12 de Maio.

SEM PRESCINDIR O NÃO COMETIMENTO DAS INFRACCÕES DISCIPLINARES VII. A verdade é que o Externato não infringiu quaisquer dos deveres ou obrigações que contratualmente assumiu quando celebrou o Contrato de Associação n° 19/99, designadamente as alíneas a) e c) da cláusula 1, Secção A, do Capítulo I desse contrato, nem os VIII. princípios estabelecidos no ponto 3.1, alíneas a) e f) e nos n°s 3.4 e 4 do Despacho n° 256-A/ME/96; IX. Efectivamente, a entidade proprietária do "EXTERNATO NOSSA SENHORA DOS REMÉDIOS" observou o dever de envio à DREC de todas as informações que estava contratualmente obrigada a enviar, não aplicou indevidamente quaisquer importâncias recebidas para pagamento dos encargos sociais com o Pessoal Docente, nem violou a gratuitidade do ensino, no âmbito do contrato de associação n° 9/99.

X. De qualquer forma, o despacho recorrido está ferido de vício de forma, por falta de fundamentação, na medida em que não se faz referência às normas jurídicas em que se estriba para sustentar a alegada obrigação de restituição, ao Estado, por parte do "EXTERNATO", da importância de €83.822,39 aos funcionários da cantina da importância de €697,57 e aos encarregados de educação do montante de € 164,60.

XI. Despacho esse que embora padeça do vício supra referido, que o fere de nulidade, também nunca poderia encontrar o seu fundamento no art° 65° do Estatuto Disciplinar dos funcionários e Agentes da Administração, aprovado pelo Decreto Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, para fundamentar a obrigação de reposição por parte da recorrente da importância de € 83.822,39, pois que a recorrente não se enquadra no âmbito da incidência pessoal deste diploma, uma vez que não pode ser considerada nem funcionária nem agente da Administração Pública (art 386° do Código Penal), nem o referido Estatuto lhe pode ser aplicável na parte em que prevê a obrigação de restituição de importâncias pecuniárias, uma vez que a relação entre a Administração Educativa e o "EXTERNATO DE NOSSA SENHORA DOS REMÉDIOS "é de índole contratual, não sendo lícita a constituição de obrigações pecuniárias unilateralmente por uma das partes.

XII. A Portaria n° 207/98, de 28 de Março, que define ilegalmente a "regulamentação específica" relativa à "cominação de sanções, XIII. prevendo ou definindo o tipo de ilícito e a respectiva natureza; graduando as sanções para cada uma das infracções e estabelecendo o regime procedimental a aplicar, não pode ser aplicada por estar reflexamente ferida de inconstitucionalidade material e orgânica. XIV. O Dec.-Lei nº 553/80, de 21 de Novembro (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativa) que não estava "autorizado" pela Lei de Bases (Lei n° 9/79) a legislar sobre esta matéria, está ferido de inconstitucionalidade material e orgânica, na medida em que se pretenda remeter em branco toda a matéria sancionatória tocante às Escolas Particulares e Cooperativas para um acto normativo de natureza regulamentar operando uma espécie de deslegalização de uma matéria que, pela sua natureza, é de reserva legislativa; XV. O Contrato de Associação celebrado entre a Administração Educativa e a "A…" é um Contrato Administrativo, legalmente consagrado, como tal, nos art° 14° e 15º do Dec.-Lei n° 553/80, de 21 de Novembro.

XVI. Este Contrato de Associação é um Contrato Administrativo, com um regime materialmente jurídico-administrativo; XVII. É um Contrato Administrativo também na acepção do artº 9° do ETAF e do art° 178° do CPA.

XVIII. É também um Contrato Bilateral Perfeito.

XIX. O Ministério da Educação, que foi parte deste contrato de Associação, através da Direcção Regional de Educação do Centro, não pode, por mero acto administrativo, impor uma pretensa obrigação contratual fazendo uma interpretação do contrato ou das suas cláusulas, agindo como juiz em causa própria, em desrespeito pelo objecto do contrato e do seu equilíbrio financeiro.

XX. Fazendo-o, como o fez, no caso "sub-judíce", incorre no vício de usurpação de poderes, por violação do princípio da separação de poderes.

XXI. No caso vertente, o Senhor Ministro da Educação não dispunha de poderes de auto-tutela administrativa que lhe permitissem declarar com força executiva, uma situação de incumprimento contratual por parte da contratante "A…", XXII. Não podia o Senhor Ministro da Educação decidir e exigir, mediante acto administrativo, as prestações ou restituições contratuais pretensamente em falta.

XXIII. A pretendida execução forçada de uma prestação contratual como aquela que é imputada à recorrente, só pode ser obtida pela administração Educativa, através dos Tribunais Administrativos, no âmbito do n°2 do art° 55º do ETAF e nas condições previstas no artº 187 do CPA.

XXIV. O despacho de 15 de Junho de 2002 do Senhor Ministro da Educação que impõe à "A…" o dever de restituir ao Estado a importância de € 83.822,39; aos funcionários da cantina o montante de €697,57 e aos encarregados de educação a soma de € 164,60, com recurso ilícito ao procedimento previsto no art° 155° do CPA, enferma de vício de usurpação de poderes e viola designadamente o disposto no art° 178°, 180° e 187° do CPA.

XXV. Constituindo um acto meramente opinativo, na acepção do art° 186° do CPA. XXVI. O acto administrativo praticado, tendente a impor uma determinada obrigação contratual com força executiva, tem subjacente a consideração e aplicação de forma ilícita do Despacho do Ministro da Educação n° 256-A/ME/96, de 11 de Dezembro de 1996, que é ilegal e frontalmente inconstitucional, na medida em que desfigura os contratos de associação, fugindo à indicação do valor da contrapartida ("custo de manutenção e funcionamento por aluno das escolas públicas equivalentes") prevista na lei habilitante (art° 15°, n° 1, do Dec. Lei n° 535/80); instituindo um regime ilegal de fixação administrativa do preço: sujeitando a gestão económica-financeira e pedagógica das escolas particulares a uma "administrativização" que ofende a liberdade de ensino e afecta o XXVII. conteúdo essencial da autonomia das escolas particulares e dos respectivos projectos educativos.

XXVIII. Pelo que também o despacho recorrido se não poderia manter na ordem jurídica. Com a petição, juntou a recorrente um parecer jurídico elaborado pelo docente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Professor Doutor Vieira de Andrade. Veio Sua Excelência o Ministro da Educação apresentar a sua resposta alegando: No que respeita à alegada prescrição do procedimento disciplinar entende que não estava a Administração, em momento anterior à resposta da então arguida à audiência do interessado relativamente à auditoria realizada (final de Abril de 2001), em condições de fazer qualquer juízo de censura disciplinar quanto às irregularidades aí apuradas (princípio do contraditório), pelo que considerou atempada a instauração do procedimento disciplinar em 27.06.01. Entende pois que o processo disciplinar não foi efectivamente instaurado apenas em 20 de Agosto de 2001, mas na referida data de 27 de Junho de 2001, relativamente à qual, não se encontrava ainda esgotado o prazo de três meses após o conhecimento das faltas, que veio a ocorrer apenas em 26 de Abril de 2001.

No que concerne à alegada amnistia das infracções, entendeu que não tem igualmente razão a recorrente pois da peça acusatória que se fundamenta na auditoria realizada, resulta claro que as condutas imputadas foram referenciadas ao ano lectivo de 1998/1999, todas praticadas em data posterior a 25 de Março de 1999.

Contrariamente ao alegado pela recorrente, entende também terem sido violados por parte daquela, os deveres que contratualmente assumiu ao celebrar o "contrato de associação n° 9/99", de que resultaram benefícios financeiros ilegítimos, a saber: - ao cobrar junto dos...

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