Acórdão nº 222/08.6SAGRD.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Junho de 2011

Data29 Junho 2011
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: 1.

No processo supra identificado, a assistente AL..., deduziu acusação contra o arguido MS..., fiscal …, residente na Rua …, na Guarda Imputando-lhe a prática, "dos crimes de injúria e ameaça previstos e puníveis nos artigos 181° e 153° do Código Penal", tudo nos termos dos factos constantes da acusação particular de fls. 87 a 89.

Pelos mesmos factos, deduziu ainda um pedido de indemnização civil contra o arguido, peticionando ao tribunal que o condene a pagar-lhe uma compensação, a título de danos morais, no montante de € 1500,00, acrescida dos juros legais (cfr. fls. 89 e 90).

O Ministério Público, arquivando os autos relativamente ao crime de ameaça, a um crime de coacção e a um crime de perturbação da vida privada, não referindo se acompanhava ou não e invocando normas legais referentes à acusação particular, deduziu acusação contra o arguido, imputando-lhe factos que constavam da acusação particular e outros que aí não constavam, concluindo estar em causa um crime de injúria, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30°/2, 181°/1 e 182° do Código Penal.

*** Realizado o julgamento, o tribunal recorrido decidiu julgar a acusação particular e o pedido de indemnização civil parcialmente procedentes e, em consequência: a) condena o arguido MS..., como autor material de cinco crimes de injúria, previstos e punidos pelo artigo 181°/1 do Código Penal, por cada um deles, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros); b)operando o cúmulo jurídico entre tais penas, nos termos do artigo 77°/1 do Código Penal, condena o arguido na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros); c) condena o demandado a pagar à demandante, a título de danos não patrimoniais, a quantia € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), acrescida dos juros de mora vincendos, à taxa legal em vigor, até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado; d) condena o arguido e a assistente nas custas do processo, na parte criminal, incluindo o valor dos encargos a que deram causa, fixando-se a taxa de justiça para o arguido em 3 (três) UC e para a assistente em 2 (duas) UC, acrescidas de 1 % a favor do cofre geral dos tribunais (cfr. artigos 513°/1, 514°/1 do Código de Processo Penal, artigos 74°, 85°/1-b), 82°/1 e 95°/1 do Código das Custas Judiciais e artigo 13° do Decreto-Lei n.º 423/91, de 3/10); e) condena a demandante e o demandado nas custas do pedido de indemnização civil e na proporção do decaimento - cfr. artigos 523° do Código de Processo Penal e 446° do Código de Processo Civil; *** 2.

Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando nas respectivas motivações as seguintes (transcritas) conclusões: “

  1. Deve entender-se que, in casu, se trata de um só acto de vontade, e um só evento; A unidade do interesse lesado, isto é, a unidade do Evento lesivo, consolida a unidade do próprio facto e daí que se entenda que, no caso vertente a conduta do arguido configura a prática de um só crime e não de cinco crimes distintos, por cuja prática foi condenado.

  2. Consequentemente, tendo em conta todo o factualismo considerado provado, deve a douta sentença ser revogada condenando-se o arguido pela prática de um só crime e não pela prática de cinco crimes de injúrias.

  3. Sem prejuízo do que se deixa atrás concluído sempre se deve dizer, quanto à pena aplicada ao arguido, que não teve em conta as circunstâncias previstas na parte final da alínea c) do nº 2 do art° 71° do Cód. Penal.

  4. Como resulta abundantemente da matéria de facto dada como provada, os factos foram motivados devido à situação de ruptura conjugal do arguido e da assistente, (e dados condicionalismos que a determinaram e rodearam), da situação de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais e de todo um clima de conflituosidade que antecedeu os mesmos.

  5. Daí que, deva a medida da pena ser reduzida atendendo a esses motivos que determinaram a conduta do arguido, a qual, aliás, foi inusual pela sua parte já que é uma pessoa pacífica, respeitadora e sem qualquer antecedente criminal.

  6. Acresce que a pena deve ser especialmente atenuada uma vez que o caso em apreço se enquadra no disposto na alínea b) do nº2 do art° 72° do Cód. Penal, para além de que foram as circunstâncias acima descritas (relacionadas com a ruptura conjugal e com as responsabilidades parentais) que os determinaram.

    Concedendo-se provimento ao presente recurso far-se-á, como sempre, JUSTIÇA ”*** 3.1 O Magistrado do Ministério Público veio oferecer a sua resposta, de fls. 409/411, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada.

    “1. Razões de prevenção - geral e especial - impõem, no que respeita à conduta ilícita em questão, a preferência pela moldura abstracta da pena de prisão.

    1. Considerando os factos apurados, a culpa (dolo directo) do arguido e referidas exigências de prevenção geral e especial, compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação das penas concretas em valor acima do mínimo legal.

    2. Afigurando-se-nos justa, adequada e proporcional a pena de 20 meses de prisão, aplicada ao arguido, tanto no que respeita à sua natureza, bem como quanto ao seu quantum.

      Porém, Vossas Excelências farão, como sempre Justiça!” *** 3.2. Por sua vez, veio a assistente oferecer a sua resposta, de fls. 417/427, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões: “1° A douta sentença não merece qualquer censura.

      1. As condutas praticadas pelo Recorrente não têm qualquer elemento de conexão que permita a sua unificação.

      2. O Recorrente cometeu várias vezes o mesmo tipo de crime, porquanto quis ofender e enxovalhar a assistente em cada uma das vezes que a insultou e vexou, proferindo as afirmações/expressões acima descritas.

      3. O Recorrente de todas as vezes que injuriou a assistente agiu com dolo e culpa, estando plenamente consciente que estava a ofende-la na sua honra e consideração.

      4. As palavras injuriosas proferidas pelo Recorrente em momentos / dias diferentes, constituem crimes autónomos e não um ou mais crimes continuados de injúrias.

        Acresce que, 6° O Recorrente não demonstrou em sede de julgamento, nem dos factos dados como provados resulta, que a sua conduta foi determinada/motivada devido à situação de ruptura conjugal entre o arguido e a assistente e muito menos a uma situação de incumprimento das responsabilidades parentais.

      5. O Recorrente é que é uma pessoa conflituosa e nada, nem nenhuma circunstância relacionada com o divórcio do arguido e da assistente ou, eventualmente, com uma situação de incumprimento das responsabilidades parentais, como alega o Recorrente, justificam ou atenuam o seu comportamento para com aquela ou diminuem de forma acentuada a ilicitude dos facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

      6. A atenuação especial da pena só pode ter lugar em casos extraordinários ou excepcionais, isto é, quando é de concluir que a adequação à culpa e ás necessidades de prevenção geral e especial não é possível dentro da moldura penal abstracta escolhida pelo legislador para o tipo respectivo. Fora destes casos, é dentro da moldura normal que aquela adequação pode e deve ser procurada. (ac. STJ de 10 de Novembro de 1999, proc. 823/99-3ª., AASTJ, nº 35,74).

      7. Os factos supra descritos e que constam da acusação atingiram a assistente na sua honra e consideração, o comportamento do arguido foi premeditado, com intenção de chocar a sensibilidade da assistente.

      8. A utilização pelo arguido daqueles vocábulos verbais, exprimem uma acção volitiva e têm subjacente e inculcada a vontade inequívoca do arguido de ofender e maltratar a assistente.

      9. Não estão, preenchidos os requisitos do artigo 720 do Código Penal, pelo que o arguido não pode beneficiar de uma atenuação especial da pena.

      10. Deve pois, negar-se provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra, por ser legal e justa, a douta sentença recorrida.

        Assim se fará Justiça “ *** 4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, no douto parecer que emitiu (fls. 440/443), pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

        Notificado, nos termos e para os efeitos consignados no artº 417.º, n.º 2, do C. P. Penal, o arguido nada disse.

        Foram colhidos os vistos legais.

        Procedeu-se à conferência, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir.

        *** II. Fundamentação.

    3. Delimitação dos poderes cognitivos do tribunal ad quem e objecto do recurso: É hoje entendimento pacífico que as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

      Por isso, temos, como Questões a decidir: - Apreciar se face aos factos dados como provados, estamos perante um crime continuado ou de cinco crimes de injúrias.

      - Da medida da pena.

      - Se é de aplicar ao caso a atenuação especial da pena p. e p. pelo artº 72, nº 2 al. b) do C.P.

      *2.

      Na sentença recorrida foram dados como provados, não provados, com base na indicada motivação, os...

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